Estadão

Ibovespa cai 2,08%, abaixo dos 105 mil pts, com política fiscal no radar

Já em baixa firme desde a abertura dos negócios, o Ibovespa degringolou na reta final do pregão e emendou sucessivas mínimas, chegando até a perder momentaneamente a linha dos 104 mil pontos, em meio a declarações de autoridades do governo Lula, em especial do secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo. Não bastasse a indefinição em torno do novo arcabouço fiscal e sinais de que o governo deseja sanar o rombo das contas públicas via incremento das receitas, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, disse que pretende rever a reforma da Previdência, pretextando que o sistema não seria deficitário.

Segundo analistas, avolumam-se sinais de que o governo se inclina à heterodoxia, com a ala política do Planalto, respaldada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, abafando qualquer tentativa de esfriar os ânimos empreendida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ainda ecoa no mercado a decisão de prorrogar em 60 dias a desoneração dos combustíveis (prazo que pode ser ampliado segundo debates dentro do governo), em oposição ao defendido por Haddad, e declarações que revelam a clara intenção de mudar a política de preços da Petrobras.

Embora não tenha amargado queda da magnitude da observada ontem, quando fechou em baixa de 3,06%, o Ibovespa sofreu novo tombo, encerrando a sessão com recuo de 2,08%, aos 104.165,74 pontos, com mínima aos 103.852,27 pontos registrada na última hora de negócios. Trata-se de um desempenho bem inferior aos de seus pares em Nova York, onde as quedas foram menores que 1%. Assim, o principal índice da B3 já acumula perda de 5,07% nos dois primeiros pregões de 2023.

Com o retorno das Bolsas em Nova York após o feriado de fim de ano, o volume negociado, que ontem foi de apenas R$ 15,5 bilhões, hoje saltou para R$ 25,8 bilhões. Na carteira teórica do Ibovespa, apenas cinco ações fecharam no campo positivo. Entre as blue chips, observou-se um comportamento similar ao de ontem, com as ações da Vale tentando se livrar da maré negativa, embora tenham sucumbido no fim do dia (-0,18%) enquanto bancos e Petrobras afundavam. Papéis do Bradesco caíram mais de 4%. Banco do Brasil ON, a despeito do temor de ingerência das estatais, perdeu bem menos (-1,86%). A PN da Petrobras recuou 2,53%, e a ON, 1,41%. A cotação do petróleo tipo Brent para março, referência para a petroleira brasileira, fechou em baixa de 4,43%, a US$ 82,10 o barril.

"O Ibovespa desabou ontem e deu continuidade ao movimento de queda hoje. Existe uma grande aversão ao risco em razão do quadro fiscal, com os DIs subindo em todos os vértices e o dólar escalando", afirma Wagner Varejão, especialista da Valor Investimentos, ressaltando que o tom do discurso de posse de Lula ainda influencia a formação de preços dos ativos domésticos.

Em entrevista a GloboNews, Galípolo disse que arcabouço fiscal é termo melhor que âncora e deu ênfase à reforma do sistema tributário brasileiro, que é "caótico" e "tributa de maneira igual os desiguais". Ele também afirmou que não acha factível uma regra fiscal que limite o crescimento de gastos por meio de gatilhos automáticos, como do nível da dívida pública, algo defendido pelo ex-ministro da Economia Paulo Guedes. Em relação à política de preços da Petrobras, o secretário-executivo da Fazenda afirmou que a pasta não tem modelo para reajuste de combustíveis e que as decisões serão tomadas pela nova diretoria da empresa.

Segundo apuração do Broadcast, Haddad recebeu de secretários da pasta avaliação de que é possível fazer um ajuste fiscal de até R$ 223,08 bilhões em 2023, equivalente a 2,08% do Produto Interno Bruto (PIB). As simulações apresentadas a Haddad, às quais o Broadcast teve acesso, incluem medidas de reversão de desonerações, busca por receitas extraordinárias e uma menor parte em cortes de gastos.

"Há preocupação com o risco fiscal, já que ninguém sabe o que vai substituir teto de gastos, e com a possibilidade mudança de política de preços da Petrobras, que sugere possível intervencionismo do governo nas estatais", afirma a economista-chefe da B. Side Investimentos, Helena Veronese, ressaltando que a desoneração dos combustíveis por mais de 60 dias ainda reverbera no mercado. "Não dá para abrir mão de receita, especialmente com aumento de gastos públicos neste começo de governo. E especula-se que a desoneração possa ser maior que 60 dias."

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