O brilho dos resultados trimestrais da Petrobras, divulgados na noite de quinta-feira, foi ofuscado nesta sexta-feira pelos temores de que a companhia venha a ser convocada pelo governo a dar uma contribuição, ainda que artificial, para o controle da inflação, no momento em que o câmbio segue pressionado pela desconfiança sobre a condução da política fiscal, os preços do petróleo se mantêm em recuperação, superado o pior momento da pandemia, e o aumento de 1,5 ponto porcentual na Selic, na quarta-feira, parece ter sido insuficiente para convencer o mercado.
Assim, após ter se decolado do pessimismo de quinta-feira com a expectativa positiva para o balanço, as ações de Petrobras (ON -6,49%, PN -5,90%) acentuaram as perdas ao longo da tarde, inclinando o Ibovespa mais para baixo na sessão (-2,09% no fechamento), na semana (-2,63%) e no mês (-6,74%), vindo de queda de 6,57% em setembro e prolongando a série negativa iniciada em julho, a mais extensa desde os quatro recuos seguidos entre novembro de 2013 e fevereiro de 2014: a queda acumulada então foi de 13,20%, chegando agora, no intervalo julho-outubro, a 18,37%, ressalvada a grande diferença de pontuação entre aquela época e a atual.
Nesta sexta-feira, o giro financeiro foi a R$ 37,3 bilhões e, na semana, as perdas do Ibovespa alongam a trajetória declinante retomada pelo tombo de 7,28% do intervalo anterior, que havia sido o pior desde março de 2020. Aos 103.500,71 pontos no encerramento desta sexta-feira, entre mínima de 103.429,77 e máxima de 105.954,35 pontos, saindo de abertura aos 105.706,66 pontos, o Ibovespa chega assim ao menor nível de fechamento desde 12 de novembro, então aos 102.507,01 pontos. Em 2021, a perda acumulada atinge agora 13,04%
No balanço julho-setembro, Petrobras trouxe "resultado muito forte, margens robustas, desalavancagem e distribuição de dividendos de quase 10% em um trimestre", observa Romero Oliveira, head de renda variável da Valor Investimentos. "Por outro lado, a declaração do presidente (Bolsonaro), no sentido de interferir na política de preços da empresa, assustou o mercado, elevando a percepção de risco", acrescenta. "Com preço do petróleo em patamares elevados, e dólar nesses níveis, o mercado fica receoso quanto a medidas em viés populista, tendo em vista a queda de popularidade do presidente e a aproximação do período eleitoral. O mercado está precificando o aumento de possibilidade de alguma intervenção na empresa, o que resulta nesse movimento de venda, de saída do papel."
"Jair Bolsonaro afirmou que busca uma maneira de mudar a lei para conter os reajustes dos combustíveis. O presidente também reclamou dos ganhos da estatal, pouco antes da empresa divulgar (ontem) receita recorde de R$ 121,59 bilhões no terceiro trimestre, avanço de 72% na comparação anual. Anunciou pagamento adicional de R$ 31,8 bilhões em dividendos e quer usar 60% do fluxo de caixa (livre) para dividendos em 2022", observa em nota a equipe de análise da Terra Investimentos, destacando também as referências de Bolsonaro ao "papel social" da empresa, que "não pode apresentar lucro tão alto".
O desempenho do Ibovespa na sessão foi condicionado também pelo de outra gigante das commodities, Vale (ON -2,84%), que trouxe resultados trimestrais abaixo do esperado, impactados pela correção do minério de ferro, cujo preço vem sendo afetado por ingerências do governo chinês sobre a produção local de aço. O setor de siderurgia como um todo esteve entre os maiores perdedores do dia, com Usiminas PNA em baixa de 7,54% e CSN ON, de 5,24%, no encerramento desta sexta-feira.
Na ponta negativa do Ibovespa, destaque para Alpargatas (-10,56%), Banco Inter (PN -9,14%, Unit -10,15%) e Locaweb (-8,50%). No lado oposto, as produtoras e exportadoras de proteína animal, beneficiadas pelo dólar forte: Minerva (+7,15%), Marfrig (+5,33%) e JBS (+4,19%). Entre os grandes bancos, as perdas nesta sexta-feira chegaram a 2,88% (Bradesco PN).