Com o IPCA-15 referente a julho em deflação de 0,07% – retração maior do que se antecipava para o mês, o que reforçou a expectativa por corte de meio ponto porcentual na Selic, na reunião do Copom na próxima semana -, o Ibovespa mostrou fôlego, desde a manhã, para emendar o quarto ganho diário e retomar os 122 mil pontos, no maior nível de fechamento em quase dois anos.
Hoje, oscilou dos 121.343,58 aos 123.009,90 pontos, e encerrou em alta de 0,55%, aos 122.007,77 pontos, máxima de fechamento desde 11 de agosto de 2021 (122.056,34). O giro foi de R$ 24,6 bilhões na sessão. No mês, o Ibovespa avança 3,32% e, na semana, ganha 1,49%. No ano, sobe 11,18%.
Apesar do desempenho ainda negativo das ações de grandes bancos nesta terça-feira – à exceção, hoje, de Itaú (PN +0,21%) -, o forte avanço das ações de commodities, em especial do setor metálico, com Vale (ON +3,09%) à frente mais uma vez, colocou o Ibovespa no campo positivo desde a abertura. Como ontem, as ações do setor financeiro foram pressionadas pelo sinal do governo de que pode colocar fim à distribuição, pelas instituições financeiras, de JCP (juros sobre capital próprio) a partir de 2024.
Em meio às discussões do governo sobre possível fim dos juros sobre capital próprio na reforma dos tributos sobre a renda, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) observou hoje que a medida, sem contrapartida, aumentaria o custo de crédito e os juros ao consumidor. "A hipótese de simplesmente retirar o JCP ou instituir a tributação sobre os dividendos distribuídos aos acionistas, sem nenhuma outra medida em contrapartida, se traduziria em significativa elevação da carga tributária sobre as empresas e seus acionistas em todos os setores da economia", afirmou a Febraban em nota.
Na ponta do Ibovespa na sessão, além de nomes do setor metálico como CSN (+5,90%), e Gerdau (PN +3,50%), destaque também para empresas associadas ao ciclo doméstico, expostas a juros, como as do segmento de construção (Eztec +6,21%, Cyrela +3,75%) e as do consumo (Alpargatas +3,65%, Carrefour Brasil +3,14%). No lado oposto nesta terça-feira, Gol (-3,06%), Minerva (-2,71%), Prio (-2,62%), Weg (-2,50%), Cogna (-2,27%) e BRF (-2,21%). Na sessão, o índice de consumo (ICON) subiu 0,12%, enquanto o ganho no de materiais básicos (IMAT) chegou a 2,27%.
"Tivemos, na sessão, a convergência de dois fatores que explicam essa recuperação do Ibovespa, que até a última quinta-feira estava de lado no mês: sinais de que o Politburo, órgão central do governo chinês, vai tomar iniciativas para estimular a economia do país, em especial o setor imobiliário, o que ajuda diretamente o desempenho de Vale, uma ação na B3 que tinha ficado muito para trás; e a reação dos juros à possibilidade de um corte maior do que se antecipava para a Selic na semana que vem, o que contribui para as ações de setores como os de varejo, consumo e construção", diz Naio Ino, gestor de renda variável da Western Asset.
"O arrefecimento da inflação no Brasil, com o IPCA-15 no negativo em julho, mantém o País na trilha de ser um dos primeiros a baixar juros. A curva de juros futuros voltou a fechar, e a Bolsa a subir, mesmo com o dólar em leve alta hoje, véspera do Fed, o que resulta em montagem natural de posição para esta aguardada alta da taxa de juros por lá", diz Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos.
Em outro desdobramento favorável ao apetite por risco na sessão, o Boletim Focus – cuja divulgação foi adiada de ontem para a manhã de hoje – trouxe nova redução nas expectativas de inflação, com destaque para "horizontes mais longos, 2025-26, que se encontram em 3,50%, mais próximas à meta", aponta em nota Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research.
Além do Fed como ponto alto da agenda, Naio Ino, da Western Asset, ressalta que a temporada de resultados trimestrais ganha tração nesta semana, aqui e no exterior, com destaque para nomes como Santander Brasil, amanhã antes da abertura, e Vale, na quinta-feira – em Nova York, a atenção permanece concentrada nos números das grandes empresas de tecnologia.
"Julho costuma ser um mês mais acomodado inclusive em fluxo, com menos notícias políticas, no recesso do Congresso, e também as férias no Hemisfério Norte, de forma que a temporada de resultados, dependendo do que trouxer, deve ser bem importante para dar direção aos negócios, caso, conforme se espera, o Federal Reserve venha amanhã dentro do consenso, com um aumento de 25 pontos-base na taxa de juros, já precificado pelo mercado para esta reunião", acrescenta o gestor, que aguarda outra alta além da desta quarta-feira para os Fed funds, que atingiriam então "platô" antes de se iniciarem, mais adiante, os cortes de juros nos EUA.
"A grande dúvida é qual será a postura do Federal Reserve na reunião de setembro", observa em nota Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos. "Na última decisão, o Fed sinalizou que a intenção do comitê Fomc era elevar os juros ainda duas vezes, mas isso dependeria da atividade econômica, que têm dado sinais divergentes. Por um lado, a inflação nos EUA está em ritmo de desaceleração, conforme mostrou o CPI de junho – tanto o índice cheio quanto o núcleo dos preços ao consumidor. Por outro, há indicadores de atividade fortes, sendo o PIB americano o principal, além de dados do setor imobiliário e PMIs", acrescenta.
Para Eduardo Cavalheiro, fundador e gestor da Rio Verde Investimentos, enquanto se espera por definições como a dos juros americanos e também da Selic, prevalece na B3 uma "troca de fichas, sem dinheiro novo", com volume financeiro em geral ainda enfraquecido, tendendo à faixa de R$ 20 bilhões por sessão.