Variedades

Imperatriz Leopoldina inspira concerto

A historiografia nem sempre fez jus à figura da Imperatriz Leopoldina. “O que aprendemos sobre ela é muito pouco, na verdade. Sabemos, claro, que ela foi a esposa de D. Pedro I, que teve uma história triste de vida, foi uma mulher traída. Mas e além disso?” Quem pergunta é a atriz Carol Castro, que acaba de viver a imperatriz sobre o palco no espetáculo Cartas Leopoldinas, que recupera não apenas a narrativa em primeira pessoa sobre a personagem histórica, como a relaciona com a produção musical do Brasil do início do século 19.

O espetáculo estreou no dia 5, na Sala Cecília Meireles, e volta ao palco ainda este mês, quando será apresentado em cidades como Paraty, durante a Festa Literária Internacional (Flip). E faz parte da sétima edição do Musica Brasilis, projeto idealizado pela cravista Rosana Lanzelotte, que tem como tema Viagens Entre Mundos.

“A cada ano, nós tentamos pensar em uma programação que dialogue com episódios ou datas importantes”, ela explica. “Em 2016, completam-se os 200 anos da vinda da Missão Francesa, que trouxe ao Brasil importantes artistas. Foi em 1816 também que D. Pedro I e Leopoldina se casaram. Ao longo do ano, também celebramos os 180 anos de Carlos Gomes, autor que levou a temática brasileira à ópera italiana, e dois aniversários importantes: os 80 anos dos compositores Jocy de Oliveira e Raul do Valle, que, em suas obras, também fazem dialogar a cultura de diferentes épocas por meio do olhar contemporâneo.”

Foi assim que nasceram os espetáculos Missão Francesa – 200 Anos, Cartas Leopoldinas e O Selvagem da Ópera, além da edição e publicação de partituras de Jocy e Valle no portal do projeto, que, mais do que promover apresentações, torna disponível a música que integra os concertos realizados.

Ao longo do ano, os três espetáculos serão mostrados em diversas cidades, como Aracaju, Belém, Campinas ou Vitória. “É um acervo em contínua expansão, que faz do Musica Brasilis um ponto de encontro para artistas e pesquisadores.” Segundo Rosana, o projeto também está desenvolvendo uma iniciativa ambiciosa, alinhada à programação cultural da Olimpíada do Rio: uma linha do tempo da história da música no Brasil.

Leopoldina

Cartas Leopoldinas é simbólico do formato criado pelo projeto, adaptado também a outros espetáculos. A figura da Imperatriz Leopoldina serve como ponto de partida para um olhar sobre a época em que ela viveu. E também sobre a arte do período.

No programa, apresentado, além de Rosana, pelo cravista Jacques Ogg, o flautista Ricardo Kanji, o violoncelista Alberto Kanji e o violinista Felipe Prazeres, estão obras de Leopold Kozeluch, compositor que foi professor de música de Leopoldina na Áustria; de Sigismund Neukomm, que se mudou para o Brasil na mesma época que ela; e do próprio D. Pedro I. As peças são intercaladas pela leitura de cartas enviadas por Leopoldina, encarnada por Carol Castro. “A mediação através do texto é um elemento que ajuda a contar a história da música e do período, dá ao programa uma lógica mais coerente”, explica ainda Rosana.

“O que me fascinou foi perceber, por meio das cartas, a força dessa mulher, ignorada pela nossa historiografia, alguém que ficou à margem injustamente. São textos que revelam dimensões diferentes de Leopoldina. Eles nos mostram, por exemplo, uma visão sobre a arte e a política que estavam a anos-luz do que acontecia aqui. A certa altura, por exemplo, ela pede para que amigos lhe mandem livros, sabendo que é preciso estar ciente do que de mais novo está se pensando em determinadas áreas, um conhecimento que ela sente que será importante, antevendo mudanças políticas na corte”, diz a atriz.

“Há também uma intuição muito forte, um sexto sentido profundamente feminino”, completa. “É preciso reconhecer que Leopoldina foi uma figura fundamental para a independência, foi muito mais do que uma mulher traída, como a história a relembra muitas vezes. E é por isso que quisemos centrar o espetáculo nesse aspecto, utilizando cartas que vão de 1816 a 1822”, explica Rosana.

A relação entre teatro e música não é exatamente nova para Carol Castro, que já atuou no musical Nine. Mas ela conta que o trabalho mais próximo, sobre o palco, com os músicos em Cartas Leopoldinas foi diferente.

“No teatro, há uma criação conjunta desde a primeira roda de leitura de um texto. Na música clássica, ficou claro para mim que há, antes de mais nada, um trabalho individual de cada um dos artistas, sozinho com seu instrumento. E só depois tudo se encaixa. Para mim, isso foi uma descoberta, me dar conta de que tudo pode acontecer, de que novas ideias podem surgir no calor da hora, momentos antes do espetáculo”, afirma.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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