O número de focos de incêndios no Pantanal cresceu quase 900% nos primeiros cinco meses do ano, ante o mesmo período de 2023. Já foram 899 queimadas, ante 90 registros entre janeiro e maio do ano passado, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Os dados consideram territórios de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Especialistas temem que se repita o cenário de 2020, quando ao menos 26% do bioma – área equivalente a 4 milhões de hectares – foram devastados por grandes queimadas. O número ainda é inferior aos cinco primeiros meses daquele ano (2.128).
A região está em alerta desde o fim do ano passado, devido ao baixo volume de chuvas. Além disso, a previsão é de temperatura acima da normal na região, o que agrava o risco.
Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva disse trabalhar com a possibilidade de "recursos extraordinários" para contratar brigadistas, mas não detalhou o plano para conter o avanço das chamas. No ano passado, a gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi criticada por patinar no combate às queimadas na Amazônia, embora o presidente tenha declarado o meio ambiente como prioridade de seu governo.
Em março, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu 90 dias de prazo à União para a apresentar um plano de prevenção e combate a incêndios no Pantanal e na Amazônia, com apresentação de metas, monitoramento e estatísticas.
Nesta quarta-feira, o governo federal assinou um pacto com Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Acre, Amazonas e Pará que prevê planejamento e ações colaborativas integradas de prevenção e combate aos incêndios nos dois biomas.
Sobre a onda atual de queimadas, os governos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul afirmam ter espalhado base, contratado equipes extras e locado aviões para ajudar na força-tarefa.
Nesta quarta-feira, 5, em Mato Grosso do Sul, bombeiros e brigadistas entravam no 4º dia de combate a um incêndio que irrompeu no fim de semana na região do Canal do Tamengo, à margem do Rio Paraguai, em Corumbá. Conforme os militares, as chamas já consumiram 2,3 mil hectares de vegetação. O trabalho é dificultado pela dificuldade de acesso, pelo tipo de vegetação.
Segundo o Serviço Geológico do Brasil (SGB), que desde 1994 opera um sistema de alerta hidrológico no Rio Paraguai, o principal curso dágua pantaneiro, no período chuvoso de 2023/24 tem sido registrado déficit de 300 milímetros de precipitação no bioma. Isso indica que houve apenas 60% das chuvas esperadas para o período, que se iniciou em outubro de 2023.
"Tal condição tem potencial de provocar estiagem bastante severa este ano, tendo o segundo semestre de 2024 como seu período mais intenso", avalia o SGB.
Em 14 de maio, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) publicou resolução considerando a bacia do Rio Paraguai em escassez hídrica. A declaração é válida até 31 de outubro e pode ser prorrogada. Mato Grosso do Sul e Mato Grosso também declaram emergência no bioma.
"Na previsão para junho, julho e agosto, há a probabilidade de temperatura acima da faixa normal para regiões como o Pantanal, indicando aumento do risco de fogo", diz Fabiano Morelli, do Programa Queimadas do Inpe. A combinação das mudanças climáticas com o El Niño – que termina para dar lugar ao fenômeno La Niña – tem agravado os problemas ambientais no País.
"Esta condição tem sido verificada em todos os biomas brasileiros e a variação da quantidade de focos oscila conforme a sazonalidade das estações do ano", acrescenta Pedro Lagden, também do Inpe. Para o Pantanal, o problema piora porque o bioma ainda se recupera de grandes incêndios recentes.
Além da seca, o bioma tem uma queimada subterrâneo em curso, o chamado incêndio em "turfa". A turfa é um material orgânico decorrente da decomposição da vegetação. Quando esse material pega fogo, vai consumindo a vegetação por baixo da terra e é de complexo controle.
<b>Pacto quer evitar crise de desabastecimento</b>
"Estamos trabalhando com a possibilidade de termos recursos extraordinários, meios extraordinários e ações legais também extraordinárias para contratação de brigadistas", disse Marina Silva nesta quarta. A ministra não deu, porém, previsão de quantos agentes extras seriam enviados à região.
Para não repetir a crise que houve na Amazônia em 2023, quando a estiagem dos rios impediu a navegação e deixou regiões desabastecidas de alimentos e remédios, o novo pacto da União com os Estados quer criar estratégias preventivas.
"Tivemos de fazer uma operação de guerra para levar cestas básicas no ano passado. Esse ano é fundamental esse preparo. Uma hora a gente tem de agir na seca; e outra na cheia", disse Marina. A catástrofe que devastou o Rio Grande do Sul também expõe a necessidade de planos preventivos e de respostas a desastres e eventos climáticos extremos.
Questionado pela reportagem, o ministério não deu mais detalhes sobre o plano de ação no Pantanal.
Em Mato Grosso do Sul, 95% do território enfrenta seca de moderada a severa. Nos parques estaduais e em propriedades rurais mais sujeitas a incêndios florestais, os bombeiros orientam o manejo do excesso de biomassa com o uso do fogo, ou seja, destruir a palhada com pequenas queimadas para evitar um incêndio maior.
O governo estadual instalou 13 bases avançadas do Corpo de Bombeiros em áreas de difícil acesso. A medida permite conter os focos ainda no início, evitando que se alastrem. Os locais estão equipados com veículos, barcos, moto-gerador, equipamentos de combate a incêndio e estrutura, como utensílios de cozinha e suprimentos para que as equipes permaneçam nos postos na temporada de incêndios.
A previsão é de que as bases só sejam desmontadas em setembro. "É uma logística que nos permite atuar efetivamente na prevenção e dar resposta rápida em caso de incêndio", diz o tenente-coronel Leonardo Congro, que preside o Comitê de Combate ao Fogo do MS.
Em Mato Grosso, o governo informou ter investido R$ 30,9 milhões nas ações de prevenção e combate a incêndios florestais, incluindo a locação de quatro aviões e a contratação de 150 brigadistas para apoiar ações do Corpo de Bombeiros.
O período de proibição do uso de fogo para atividades agrícolas no Pantanal, que terminaria em 30 de novembro, foi estendido para 31 de dezembro. Decreto governamental permite a queima controlada de biomassa em áreas críticas, sob supervisão dos bombeiros.