Ismael Ivo parece dançar enquanto fala. Desde a infância, gosta de ver o movimento do mundo. Em mais de três décadas na Europa, o bailarino e coreógrafo paulistano se dedicou a investigar e entender a humanidade por meio da arte. Nesta quarta, 1.º, Ivo retorna à sua terra natal para assumir a direção do Balé da Cidade de São Paulo. Entre muitos desejos, quer abrir as portas da companhia e do Teatro Municipal à população, fomentar uma dança “do futuro”, levar apresentações a diferentes espaços e dialogar não só com quem faz arte, mas também com quem a recebe. Isso é o que chama de “laboratório vivo”.
“Estou menos interessado em comprar repertório e mais em fazer processos abertos, com formação de público”, diz. “Não é que o Balé da Cidade vai se tornar um órgão experimental. As pessoas com quem estou conversando, nacional e internacionalmente, são de alta qualidade. Para os bailarinos, quero aproveitar o potencial e o talento que têm e ampliá-los, dar outras experiências físicas.”
O convite para dirigir o Balé da Cidade surgiu em dezembro. Enquanto passava o fim de ano com a família no Brasil, Ivo foi procurado pelo secretário municipal de Cultura, André Sturm. Coincidentemente, em outubro, um bailarino da companhia havia pedido permissão para incluí-lo em uma lista de possíveis nomes para assumir o grupo. “Para que eu pudesse trabalhar com a dança feita no Brasil faltavam um momento e uma posição.”
A jornada internacional de Ivo começou quando o coreógrafo norte-americano Alvin Ailey (1931-1989) o viu dançar em Salvador e o chamou para ir a Nova York. Era 1983. No ano seguinte, o paulistano criou em Viena o ImPulsTanz, hoje um dos mais importantes festivais de dança contemporânea do mundo. Pouco depois, Ivo se estabeleceu na Alemanha, onde dirigiu a companhia do Teatro de Weimar. Foi ainda o diretor artístico que por mais tempo esteve à frente do setor de dança da Bienal de Veneza (2005 a 2012).
Não é à toa que entre seus amigos pessoais estão o coreógrafo norte-americano William Forsythe, o belga Wim Vandekeybus, Marcia Haydée e a artista sérvia Marina Abramovic, já mencionada como possível colaboradora da companhia. Por causa dessa trajetória, há expectativa de que ainda mais portas sejam abertas para o Balé da Cidade.
Mais do que projeção internacional, porém, Ivo deseja aproximar a companhia da população, em especial de jovens e de quem vive longe do centro expandido. “Quero que a companhia participe intensamente dos teatros da periferia. Pensamos em levar pequenos formatos de produção e ocupar esses espaços”, diz o diretor, que menciona a possibilidade de apresentações em bibliotecas.
Outra proposta é levar adolescentes para dentro do Balé da Cidade e do teatro para assistir a ensaios e processos de criação, conhecer bastidores, para entender o que é a dança e para “confeccionar experiências” para toda a família. “Criar um tipo de cultura sem medo de dialogar com as pessoas. Quero levar o Balé da Cidade a criar uma nova identidade. Mas não posso resolver já todos os problemas. Vamos descobrir caminhos novos, prezando pela qualidade e criatividade. Acho que isso é cultura contemporânea”, diz. “Quem serão os próximos Lia Rodrigues, Rodrigo Pederneiras, Henrique Rodovalho, Deborah Colker? Temos de alimentar a próxima geração, que vai levar a dança para o futuro.”
Nascido na Vila Ema, zona leste da capital, em uma família humilde, Ivo afirma que tem obsessão em aprender e que não tem medo de errar. “Às vezes, precisamos escutar o outro e discordar também. É saudável.” Não teme que a companhia tenha resistência a mudanças. Mas acredita que, se ela ocorrer, será natural. “Ninguém precisa ver tudo do mesmo ângulo.”
Os bailarinos retornam ao trabalho no dia 6, com novas atividades, como ioga, meditação e aula de balé. No fim do ano passado, eles foram contratados por meio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Até então, atuavam com contratos temporários. Segundo o Teatro Municipal, a data de reestreia da companhia e o programa serão divulgados nas próximas semanas.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.