Israel passou a considerar nesta segunda-feira, 19, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva persona non grata até que ele se desculpe pelas declarações comparando as ações do Exército israelense na Faixa de Gaza ao Holocausto.
A decisão foi informada ao embaixador do Brasil em Tel-Aviv, Frederico Meyer, no Museu do Holocausto, onde ele recebeu também uma aula sobre o genocídio cometido pelos nazistas contra 6 milhões de judeus. Sem sinal de distensão em Brasília, o governo brasileiro chamou Meyer de volta ao País. O assessor para assuntos internacionais do presidente Lula e ex-chanceler, Celso Amorim, disse que não houve erro nenhum na fala do presidente.
O Ministério das Relações Exteriores afirmou, em nota, que, "diante da gravidade das declarações" de Israel considerando Lula persona non grata, o ministro Mauro Vieira também decidiu convocar o embaixador israelense no Brasil, Daniel Zonshine, para explicações. Eles se encontraram ontem, no Rio.
A decisão de retirar o embaixador brasileiro foi a forma de Brasília expressar insatisfação sobre a maneira com que autoridades israelenses responderam a Lula. A medida diplomática significa que a Embaixada do Brasil em Tel-Aviv continua funcionando, mas sob o comando do encarregado de negócios, o diplomata mais graduado. O sinal é de claro agravamento do impasse, mas não de uma ruptura. Meyer deve ficar no Brasil por dez dias.
O presidente quer se reunir pessoalmente com ele, mas não vai removê-lo do posto, ao menos por enquanto. A decisão foi tomada após uma série de conversas entre Lula e alguns ministros e conselheiros mais próximos. No Alvorada, ele avaliou a crise diplomática com o ministro Paulo Pimenta (Comunicação Social) e Amorim, entre outros. Vieira também participou das conversas por telefone.
<b> Armadilha </b>
Para o Brasil, o embaixador brasileiro foi colocado no que integrantes do governo consideraram uma espécie de "armadilha". Ele não fala nem compreende hebraico, e ficou exposto diante das câmeras, sem poder esboçar reação, enquanto ao seu lado o chanceler israelense, Israel Katz, declarava à imprensa que Lula passava a ser considerado persona non grata no país, uma expressão que, na diplomacia, significa que um representante estrangeiro não é mais bem-vindo em missões oficiais.
O Itamaraty já estava incomodado com o método da reprimenda escolhido pela chancelaria israelense. Em vez de uma reunião mais reservada na sede do Ministério das Relações Exteriores, como costuma ser o padrão diplomático, o governo Netanyahu marcou o encontro no Yad Vashem, um memorial do Holocausto. Diplomatas consideraram que o representante brasileiro foi "humilhado" com a situação.
No memorial, o embaixador brasileiro ouviu as queixas dos israelenses, voltou a manifestar as preocupações do governo brasileiro, mas não fez comentários a respeito das falas de Lula. Ele não repassou nenhum recado de mea culpa, o que já indicava a indisposição de Lula de pedir desculpas.
"A comparação do presidente Lula entre a justa guerra de Israel contra o Hamas e as ações de Hitler e dos nazistas, que mataram 6 milhões de judeus e um sério ataque antissemita que desrespeita a memória daqueles que morreram no Holocausto. Não vamos perdoar e nem esquecer, em nome dos cidadãos de Israel, eu informei o presidente Lula que ele não é bem-vindo em Israel até que ele se desculpe e retrate suas palavras", escreveu depois o chanceler israelense, Israel Katz, na rede social X.
Questionado sobre a possibilidade de se desculpar, Amorim foi enfático ao dizer que o governo não se retratará. "Existe zero possibilidade de o presidente Lula pedir desculpas. Ele não fez nada errado. Só citou fatos históricos", disse o ex-chanceler ao <b>Estadão</b>, acrescentando que "nenhum povo tem o monopólio do sofrimento".
A primeira-dama Janja da Silva foi às redes sociais defender Lula, em mais um indício de que não haveria recuo do governo. "A fala se referiu ao governo genocida e não ao povo judeu. Sejamos honestos nas análises", disse ela.
<b>Declaração</b>
A guerra no enclave palestino começou no dia 7 de outubro, quando terroristas do Hamas invadiram o território israelense, mataram 1,2 mil pessoas e sequestraram 240. A ação é considerada o pior ataque contra judeus desde o Holocausto e o mais duro ataque terrorista da história de Israel.
Em resposta, Israel iniciou uma operação em Gaza, com bombardeios aéreos e invasão terrestre, que já deixou mais de 28 mil mortos, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas.
A declaração de Lula foi dada durante uma entrevista coletiva em Adis Abeba, capital da Etiópia, onde o presidente estava em visita oficial.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>