O economista-chefe do Itaú Unibanco, Mario Mesquita, disse que os sinais de uma desaceleração relevante da atividade global à frente são um elemento preocupante para a economia brasileira. Ele participa da edição do segundo trimestre do Macro em Pauta, organizado pelo banco nesta terça-feira.
"O que se avizinha para a economia global é uma recessão, ou desaceleração, típica do pós-Segunda Guerra Mundial", disse Mesquita. O Itaú espera crescimento de 2,9% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial em 2022, mas o economista alerta que o viés da projeção é para baixo, devido ao aperto monetário sincronizado no mundo.
Nos Estados Unidos, o economista espera que o Federal Reserve (Fed, o banco central do país) eleve os juros ao menos mais uma vez em 0,75 ponto porcentual e leve a taxa ao intervalo de 4,0%-4,25% no fim do ciclo. Diante das pressões inflacionárias no país, Mesquita pondera que a taxa deve ser mantida neste nível durante um período longo. Mesmo assim, a poupança elevada nos EUA torna mais provável que o país passe por uma desaceleração da atividade do que por uma recessão.
Para Mesquita, a queda recente na margem dos preços de commodities sugere que a desaceleração da atividade global esperada à frente está impactando negativamente os bens, o que reduz o risco de uma estagflação global. "A desaceleração da atividade reduz o risco inflacionário", pondera.
O desempenho dos indicadores de atividade econômica brasileira tem superado as expectativas no segundo trimestre, disse o economista-chefe do Itaú Unibanco. "Talvez tenha um viés de alta para este número", reconheceu Mesquita, em referência à projeção do banco para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2022, de 2,0%.
O aumento de 0,9% do volume de serviços divulgado hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) reforça a percepção de uma atividade mais forte, disse Mesquita. Para o economista, o resultado – que superou a mediana da pesquisa <i>Projeções Broadcast</i>, de 0,2% – sugere um viés de alta também para a projeção de crescimento do PIB do segundo trimestre, de 0,8%.
Apesar do comportamento mais forte, Mesquita notou que o aperto monetário conduzido pelo Banco Central (BC) deve levar a um arrefecimento da atividade na segunda metade do ano. De acordo com o analista, a taxa Selic só atingiu nível contracionista na virada do ano, o que sugere que a maior parte dos impactos do aumento de juros ainda está por se materializar.
Na mesma linha, o mercado de trabalho tem se mostrado mais forte do que o esperado, com uma forte queda do desemprego, mas a tendência é de algum aumento da taxa de desocupação à frente, ao nível de 10,5% no fim do ano. Para Mesquita, a reforma trabalhista ou a queda dos salários podem explicar parte da recuperação do emprego observada ao longo deste ano.
<b>Juros</b>
O Banco Central (BC) enfrenta agora o período mais difícil do seu ciclo de aperto monetário, considerando o tamanho do aumento de juros já entregue e a defasagem dos seus efeitos sobre a atividade e a inflação, avalia Mario Mesquita.
"Esse é o período mais difícil do ciclo para o Banco Central, aquele em que ele já fez um esforço importante, mas as defasagens significam que você ainda não vê os ganhos em termos de queda da inflação de forma muito nítida", disse Mesquita. "Tem muita coisa do aperto monetário feito aqui que ainda não bateu, tem muita coisa do aperto global que ainda não bateu."
De acordo com o economista, o cenário-base do banco continua sendo de que o BC deve elevar os juros em mais 0,5 ponto porcentual em agosto, ao nível de 13,75%, e ao menos "pausar" o ciclo para observar o cenário e os riscos de desaceleração ou recessão global. De acordo com as estimativas do Itaú, a política monetária só se tornou contracionista na virada do ano e, portanto, seus efeitos devem ser sentidos mais à frente.
Apesar da proximidade das eleições, Mesquita ponderou que esse processo não deveria ser um impeditivo à ação do BC, caso a autarquia considere que uma continuidade do ciclo é necessária. "Acho que o BC tem de fazer o trabalho dele", disse. "Se ele começa a olhar outras variáveis, a vida fica impossível."
As projeções do banco indicam um IPCA de 7,2% este ano e de 5,6% no ano que vem, acima do teto da meta (4,75%). De acordo com Mesquita, já é possível ver uma queda dos preços de commodities em reais na margem, que devem auxiliar na desinflação no País. No entanto, a tendência é que esses preços se estabilizem em um nível ainda favorável para exportadores.
<b>Déficit primário</b>
Mario Mesquita reiterou as projeções do banco para o déficit primário do Brasil em 2022 e 2023, de 0,4% e 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB), respectivamente. O cenário, conforme Mesquita, já considera que algumas medidas fiscais adotadas este ano serão "perenizadas" e vão impor custos à frente.
"Se o PLP 18 for perenizado, o PIS/Cofins volta e a PEC 01 também é perenizada, a gente projeta esse déficit de 1,5%, com 83,5% de razão dívida/PIB", disse Mesquita. Em um cenário alternativo, sem a implementação do PLP 18 e com a volta da cobrança de PIS/Cofins e o fim da PEC 01 em 2022, o resultado primário de 2023 ficaria próximo de 0% do PIB e a dívida pública, em torno de 82% do PIB.
Apesar do quadro fiscal fragilizado por essas medidas, Mesquita ponderou que a decisão de cortar impostos é tecnicamente superior a outras alterações que poderiam ter sido feitas com o objetivo de conter a inflação, como uma tentativa de congelamento de preços ou a mudança da política de preços da Petrobras.
"Esse tipo de redução de impostos, preservando a política de preços da Petrobras, eu acho que é uma forma melhor de lidar com essa emergência energética que a gente está vivendo do que mudar a política de preços da empresa. Ainda mais porque a empresa tem muitos acionistas que não estão no governo, tem acionistas privados. Do ponto de vista de gestão econômica e governança, é uma medida superior ao controle de preços", disse.