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Joël Dicker volta à cena do crime em novo romance

O suíço Joël Dicker conhece bem a sensação do escritor best-seller que retrata em seus livros. Em 2010, com apenas 25 anos, sua prosa já se mostrava promissora, consequência de um trabalho de devoção à criação literária – filho de professor e bibliotecária, o amor pelos livros era algo natural, cresceu rodeado deles.

No mesmo ano, quando ganhou o Prêmio dos Escritores de Genebra, Dicker iniciou uma sequência de feitos e prêmios literários. Seu primeiro romance, <i>Os Últimos Dias de Nossos Pais</i>, ambientado na 2ª Guerra Mundial, foi lançado em 2012 e o projetou na Suíça. O elemento principal de sua literatura já estava presente naquela primeira trama com pé na história recente da França (país que conheceu bem como estudante): as entranhas de uma investigação. Ao contar o caso de um esquadrão britânico que treinava a Resistência francesa, caiu nas graças do público pela prosa chiclete que envolveu seus personagens, espiões.

Mas foi com <i>A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert</i>, lançado apenas oito meses após o primeiro romance, que Dicker conheceu a fama. A trama policial conta a história do escritor Marcus Goldman, que vive um bloqueio criativo, e Harry Quebert, seu professor da faculdade, acusado de assassinato.

Goldman, no auge da carreira, está com a faca no pescoço para escrever o próximo livro. Com a pressão da editora para a entrega do manuscrito, ele viaja até a pequena cidade de Aurora, no Estado americano de New Hampshire, para se aconselhar com o mestre – e acaba esbarrando no cadáver de Nola, jovem que viveu um romance secreto com Quebert na década de 1970. Junto ao corpo, um original do que viria a ser o romance aclamado de Quebert. A dúvida, então, é lançada na cabeça do homem que busca inspiração e, evidentemente, a encontra de um jeito escabroso.

Já no início do novo romance <i>O Caso Alaska Sanders</i> (Intrínseca), Dicker/Goldman volta à história que o consagrou, seu segundo livro, para falar sobre os desdobramentos de sua primeira investigação: "O caso me afetou profundamente. Harry tinha sido meu professor na faculdade e, mais do que isso, era meu amigo mais próximo na época. Eu não acreditava que ele pudesse ser o culpado. Sozinho contra tudo e todos, percorri New Hampshire de cabo a rabo para conduzir uma investigação por conta própria. E, se ao fim consegui provar a inocência de Harry, os segredos que descobri a respeito dele destruíram nossa amizade. A partir dessa investigação, escrevi um livro".

A obsessão por um feito incrível na literatura e os esforços para alcançá-lo guiam os protagonistas dos dois livros. No romance sobre a jovem Alaska Sanders, Dicker envolve o leitor em um crime, com uma estrutura parecida com o romance que o projetou. Para abrir a história, ele evoca uma cena cinematográfica, com o impacto semelhante ao da jovem Laura Palmer embrulhada em saco plástico à beira de um rio, na cidade fictícia criada pelo cineasta David Lynch, Twin Peaks. Contudo, se Lynch ousou ao flertar com o onírico e o místico, Dicker percorre o terreno movediço da boa e velha (e, por vezes, desgastada) ficção policial. Pode cansar quem devorou o caso de Harry Quebert, mas segura o leitor até o fim.

E por falar em cinema e imagem, um parêntese: <i>A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert</i> se tornou série em 2018, com os atores Patrick Dempsey e Ben Schnetzer. Evidentemente, por causa do sucesso do livro, que já nas negociações preliminares, em sua estreia na Feira de Frankfurt de 2012, o autor conseguiu contratos com vários países. Hoje, a história de Marcus Goldman já foi traduzida para 32 idiomas. Confira a entrevista que o autor concedeu ao <b>Estadão</b> sobre a continuação dos trabalhos de Goldman.

<b>No primeiro livro (<i>A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert</i>), a história apresenta o escritor Marcus Goldman em um bloqueio criativo. Como um escritor enfrenta uma situação dessas? O que você costuma fazer? </b>

É uma boa pergunta, porque nunca enfrentei um bloqueio como esse que Marcus enfrenta: uma seca em seu cérebro, sendo ele incapaz de ter uma única ideia. Não tenho esse problema, pois sempre tenho muitas ideias. Minha questão é mais sobre como tratar essas ideias, e é nessa parte que posso encontrar dificuldades. Mas estou bem com isso porque é um "bom problema" para se ter como autor. Quando isso acontece, apenas tento respirar e me distanciar um pouco da ideia inicial, penso em outras coisas para além da minha história. Depois disso, geralmente tudo acontece.

<b>O que você traz de novo a seus personagens consagrados que estão de volta?</b>

Primeiro, é bom dizer que é muito desafiador recomeçar com personagens que já existem, pois você precisa ir até as raízes do livro anterior e se certificar de que ainda está conectado com um personagem que criou anos atrás. Só assim é possível trabalhar com esses personagens. Quando isso acontece, você percebe imediatamente se a história vai funcionar ou não. Porque você vai sentir rapidamente se não funcionar. Se não acontecer, você tem de esquecer o projeto. Do contrário, você só precisa confiar no processo de escrita.

<b>Você escreveu O Livro dos Baltimore sobre a vida de Marcus Goldman, para tentar desvencilhar-se do título de escritor de um só gênero? Como não se acomodar na literatura? Por que a volta ao romance policial? </b>

Porque eu amo o dueto entre Marcus e Perry Gahalowood, o policial. E por 10 anos, depois do primeiro livro, sobre Harry Quebert, eu realmente queria que os dois personagens se reunissem novamente. Então é por isso. É mais sobre essa reunião do que voltar a um romance policial.

<b>O primeiro livro virou série. O cinema aproveita-se de sucessos literários. Como você enxerga o diálogo de suas histórias com as produções audiovisuais?</b>

A principal diferença é o leitor ou o espectador. Como leitor, você ocupa um lugar importante na existência da história. Porque você é um criador, é você quem faz a história acontecer e existir. Já a série de TV, ou mesmo um filme, está em total oposição a isso: o espectador está em um estado de total passividade. O filme existe sem o espectador. É por isso que sempre considero que um livro é uma experiência muito mais forte do que uma série de TV ou um filme.

<b>Por que histórias envolvendo crimes (tanto na ficção, quanto na realidade) atraem tanto as pessoas? Há um componente de sadismo no ser humano? </b>

Não, não acho que é sobre sadismo. A maioria de nós não gosta de violência e sadismo, embora estejamos sempre ansiosos por uma boa história de detetive. Essa predileção diz sobre a nossa própria curiosidade. Queremos entender. Queremos saber o que aconteceu (em uma história policial). Portanto, uma história de detetive não é sobre o crime, é sobre a causa do crime, as motivações, a mente. Uma história de crime é, na verdade, uma história sobre as pessoas envolvidas.

<b>Você pretende expandir o universo de Goldman depois de O Caso Alaska Sanders? </b>

Sinceramente, não sei. Meu plano inicial era fazer três livros, então sinto que terminei. Por outro lado, como posso prometer agora que nunca mais usarei o personagem de Marcus Goldman?

<b>A crítica pode se distanciar do grande público que consome best-sellers, romances policiais, biografias, etc. Você acha que, ainda hoje, os críticos se pautam muito por obras de vanguarda?</b>

Essa é difícil de responder. No meu caso, recebi um prêmio da academia literária e boas críticas. Acho que qualquer livro que vende muito atrai críticos. Você tem de aceitar e viver com isso. Mas nunca esqueça que o melhor prêmio é ter tantos leitores entusiasmados em toda parte. Pessoalmente, não dou atenção a todas as críticas, porque não é bom estar sempre a par de tudo. Isso pode ser ruim, porque pode tirar você do foco que se precisa para escrever e criar.

O Caso Alaska Sanders
Autor: Joël Dicker
Tr.: Debora Fleck e Maria de Fátima O. do Couto
Editora: Intrínseca
512 págs., R$ 89,90
R$ 62,90 (E-book)

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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