Jovem bailarino revelado na periferia de SP adia, mas não desiste de sonho

Em fevereiro, Wendel Vieira Teles, ainda com 12 anos, ficou conhecido como o jovem bailarino que sonhava em dançar nos Estados Unidos. Morador do conjunto habitacional Fazenda do Carmo, no extremo da zona leste de São Paulo, ele havia acabado de conquistar o direito de participar do Youth America Grand Prix (YAGP), em Nova York, e se apresentar para "olheiros" das principais companhias de dança do mundo, como Bolshoi, Royal Ballet, American Ballet Theatre, Ballet da Ópera de Paris e outras.

O problema era que todos os custos desta viagem teriam de ser pagos por ele. A família, então, começou a vender camisetas com a foto do menino e abriu uma vaquinha virtual – que no primeiro mês não ultrapassou os mil reais arrecadados.

A sorte mudou quando a reportagem do <b>Estadão</b> contou sua história, em 6 de fevereiro. Em dois dias, a vaquinha virtual superou os R$ 30 mil (guardados em poupança). Além disso, Wendel recebeu apoio de figuras como Thiago Soares, brasileiro que se tornou o primeiro bailarino do Royal Ballet de Londres, e do influenciador digital Felipe Neto, eleito pela revista Time como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo.

Dinheiro já não seria mais problema. O evento e a viagem estavam marcados para o início de abril. Infelizmente, o que aconteceu depois já é história. A pandemia da covid-19 atingiu em cheio os sonhos do jovem bailarino. O mundo parou. E o Youth America Grand Prix (YAGP) foi adiado por tempo indeterminado.

Agora, 8 meses depois da publicação da reportagem, voltamos a conversar com Wendel. O que aconteceu com ele durante todo esse tempo?

Depois do baque dos planos adiados e do medo da própria pandemia, Wendel e familiares iniciaram uma nova rotina. Todos os dias de manhã, depois do café preparado pela mãe, Marleide de Jesus Vieira, Wendel tem duas sessões de aulas de balé online ministradas pela escola Bolshoi de Joinville. "Improvisamos uma barra no quartinho, arrastamos móveis e faço as aulas em casa mesmo", contou.

Durante muito tempo, todas as aulas e treinos de Wendel foram feitos na própria casa. Com o início da flexibilização, o garoto começou a sair. "Mas só coloquei o nariz para fora de casa para ensaiar e dançar", disse.

Sob a supervisão dos professores e bailarinos Priscilla Yokoi e Alexandre Fernandes, ele voltou às aulas presenciais. Além disso, ele tem participado de cursos e audições para musicais no Estúdio Broadway, em São Paulo. "Os sonhos de Wendel não recuaram em nada. No balé, você não pode parar. É muito difícil recuperar o tempo perdido. Felizmente, não é o caso dele, que continua ensaiando e ensaiando", disse Priscilla.

Como se não bastasse, o bailarino foi convidado a participar como ator da minissérie Floresta Week – Área Restrita. Na série, que estreou neste fim de semana pela VTV/SBT de Campinas, Wendel interpreta João, um menino rico. "Não podia ser mais diferente de mim. Tem sido uma experiência muito importante. Não tenho formação de ator, mas estou aprendendo. E atuar me ajuda na dança também", afirmou.

Enquanto NY não chega, Wendel continua se preparando. "Meu filho é muito dedicado. A família inteira está dando apoio e envolvida", disse Edson Creuso Teles dos Santos, pai de Wendel. Por enquanto, o Youth America Grand Prix (YAGP) está previsto no calendário de eventos em Manhattan – mas ainda não foi confirmado.

Todo o dinheiro arrecadado na vaquinha virtual, mais de R$ 45 mil, continua no mesmo lugar. A família não mexeu em um tostão. "Mesmo com as dificuldades, o dinheiro da vaquinha é para realizar o sonho de dançar em Nova York. E ele será usado para isso", afirmou Wendel, que tem esperanças em poder viajar no ano que vem.

<b>Trajetória</b>

A história do menino bailarino começou quando ele ainda tinha 8 anos – e já causava espanto ao abrir espacate no meio da rua, em frente à casa da família. A habilidade era fruto do empenho nas aulas de street dance. Mas foi o pai, Edson Creuso, que, percebendo a aptidão do filho, fez a seguinte sugestão: "E se você fizesse balé para melhorar ainda mais sua flexibilidade?". No início, o garoto estranhou e respondeu com um "balé é coisa de menina". A mãe, Marleide de Jesus Vieira, de 43 anos, acompanhou a reação do filho e também ponderou ser o balé "uma coisa não muito adequada".

Não à toa, Wendel chora ao falar do pai. Foi ele quem insistiu e explicou para a família que o balé é para todo mundo, independentemente de gênero. "Devo muito ao meu pai, foi ele quem primeiro me levou às aulas e sempre me apoiou. Graças a ele eu estou aqui hoje."

O "aqui" de Wendel é o início de uma carreira profissional no balé, com apresentações no Theatro Municipal, prêmios em festivais como o de Joinville e o convite para dançar no YAGP, em Nova York.

<b>Superação</b>

Wendel já sofreu bullying na escola, com colegas que, no início, o isolavam por ser um "menino dançarino". Ele já venceu também a competitividade e a inveja de outros bailarinos – em uma ocasião teve seu figurino cortado por um colega.

Antes da pandemia, todos os dias, enfrentava uma rotina que começava às 6 horas, horário que acordava para ir à escola. Ao voltar, almoçava rápido e ia para os ensaios no bairro da Mooca. Na maioria dos dias, ia de transporte público (dois ônibus e um metrô). No caminho, ouvia rap nos fones de ouvido e muito Racionais e Emicida.

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