Estadão

Juros longos sobem ao pico do ano com reação negativa a plano para combustíveis

A proposta do governo para desonerar combustíveis caiu como uma bomba no mercado de juros, levando as taxas dos principais vencimentos a partir de 2027 a fecharem no pico do ano. Nem mesmo o potencial de desaceleração da inflação trazido pela desoneração tributária foi capaz de impedir o acúmulo de prêmios, com a ponta curta reagindo em baixa apenas pontualmente no começo do dia, dada a leitura de que de que tal alívio será devolvido em 2023 e que os riscos fiscais se sobrepõem aos eventuais efeitos positivos.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2023 fechou em 13,49%, de 13,451% no ajuste anterior, e a do DI para janeiro de 2024 subiu de 13,076% para 13,205%. A do DI para janeiro de 2025 encerrou em 12,66%, de 12,475%, e a do DI para janeiro de 2027 saltou de 12,395% para 12,595%.

A ideia do governo é reduzir a carga tributária sobre os combustíveis através de um acordo com os governos estaduais. A proposta prevê, em linhas gerais, zerar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre diesel e o gás de cozinha; reduzir o ICMS e zerar os impostos federais sobre gasolina e etanol até o fim do ano; e compensar os estados e o Distrito Federal. O governo quer limitar o ressarcimento aos estados em um valor a ser fixado, entre R$ 25 bilhões e R$ 50 bilhões, que seria repassado pela União.

Na leitura do mercado, a proposta não tem clareza sobre de onde viriam os recursos para cobrir a perda de arrecadação e representa uma ameaça ao teto de gastos. As frequentes emendas aos textos e a urgência para resolver a questão no afogadilho deixam a impressão de um vale tudo em ano eleitoral. Até porque o presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta terça que a ideia do decreto de calamidade, que vinha assombrando o mercado nos últimos dias, "não está enterrada".

Alexandre Póvoa, da Meta Asset Management, questiona a viabilidade de se afirmar que parte dos recursos virá do excesso de arrecadação por conta do crescimento econômico, ressaltando que há o risco de queda da economia no segundo semestre causada pela alta de juros. Contar com recursos da privatização da Eletrobras também é visto por ele como "completo absurdo", uma vez que teriam de ser usados em investimentos e não em gastos correntes. "O que aconteceria, caso fosse feito um esforço de redução generalizada de impostos e a Petrobras aumentasse os preços em seguida, anulando tudo?", pergunta, lembrando que há uma defasagem de 20% no preço da gasolina em relação às cotações internacionais.

Na inflação, analistas calculam impacto de queda de até 1 ponto porcentual no IPCA de 2022 nos cenários mais otimistas, mas que seria ao menos parcialmente devolvida no ano que vem, que é para onde está voltada agora a política monetária do Banco Central. "Ao acabar a compensação, os Estados vão elevar novamente o ICMS. E nos impostos federais isso também pode ocorrer, porque não sei se um novo governo vai mantê-los zerados", afirma economista-chefe do Banco Alfa, Luís Otávio de Souza Leal.

O estrategista-chefe da CA Indosuez Brasil, Vladimir Caramaschi, ressalta que o efeito negativo da proposta sobre o câmbio pode também mitigar esse impacto. "Por mais que a redução da carga tributária possa aliviar a inflação, o net é negativo no curto prazo. A proposta parece ter custo fiscal grande e reabre a discussão sobre o teto de gastos numa hora em que o mercado começa a ficar nervoso com as eleições", explicou.

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