As declarações consideradas "dove" do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, continuaram alimentando a queda dos juros curtos e intermediários da curva a termo ao longo da tarde e também os ajustes nas apostas para a Selic no Copom da semana que vem. No fim da sessão regular, as taxas curtas tombavam mais de 30 pontos-base e a expectativa de aperto de 1 ponto porcentual da Selic era majoritária ante a opção de 1,25 ponto, com a curva tendo limpado expectativas de avanço mais agressivo de 1,5 ponto que apareceram nos últimos dias. Campos Neto disse que o BC não vai alterar o plano de voo em função de dados de inflação de alta frequência, o que foi lido como um recado claro de que a indicação da última ata do colegiado continua válida.
A mudança sobre a percepção de Selic no curto prazo também engordou o volume de contratos negociados. Com cerca de 1,9 milhão de contratos movimentados hoje, o do Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2022 fechou com taxa em 7,01%, de 7,324% ontem no ajuste. Na média diária dos últimos 30 dias, este DI girou em torno de 733 mil contratos. O DI para janeiro de 2023 passou de 9,162% para 8,86% e o DI para janeiro de 2027 encerrou a 10,47%, de 10,49%.
A fala de Campos Neto, em evento promovido pelo BTG Pactual, teve efeito avassalador na curva. "Pegou muita gente de surpresa nesta última manifestação permitida antes do período de silêncio do Copom. A curva chegou a colocar na semana passada chance de alta de 1,5 ponto na Selic, o que é uma pedrada", afirmou o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez.
Na curva a termo, a aposta de alta de 1 ponto aparecia com 80% de probabilidade precificada, ante 20% de chance de 1,25 ponto, segundo o economista-chefe da Greenbay Investimentos, Flávio Serrano. Para o Copom de outubro, o mercado está dividido entre as duas alternativas, com 50% de chance para cada lado. Para o fim do ano, a curva projeta Selic em 8,50%.
Embora a nova sinalização do BC possa não deixar dúvidas sobre o que o Copom vai fazer, ou seja, elevar a taxa básica em 1 ponto, não é essa a opção defendida por boa parte dos economistas. Em meio à crise hídrica e com as pressões inflacionárias de 2021 cada vez mais transbordando para 2022, a percepção é de que a autoridade monetária teria de ser mais firme. O economista João Leal, da Rio Bravo Investimentos, disse que a fala de Campos Neto não altera a necessidade de um aumento de 1,25 pp na próxima reunião. "Não é simplesmente um dado de inflação acima da expectativa, mas uma pressão inflacionária bastante ampla em toda a economia. Uma alta de 1 ponto pode ser um risco bem grande de perder ainda mais controle nas expectativas para o IPCA de 2022", disse.
Sanchez, da Ativa, manteve sua previsão de alta em 1,25 ponto mesmo depois da fala de Campos Neto. Na sua visão, se a autoridade monetária cumprir sua promessa de fazer o que for necessário para trazer as expectativas de inflação para a meta, terá de ser mais incisiva e "começar a acelerar já", lembrando que as expectativas de IPCA em 2021 estão perto de 9% e as de 2022, ao redor de 4%. A de 2021 está muito acima do teto da meta de 5,25% e a de 2022, além do centro da meta de 3,5%.
Os contratos de longo prazo oscilaram perto da estabilidade, mas com viés de baixa trazido pelo índice de inflação ao consumidor norte-americano levemente abaixo do esperado, mas que também não alterou a visão do mercado de que o tapering nos Estados Unidos começa este ano.