Mesmo com um maior alívio na curva dos Treasuries à tarde, os juros futuros no Brasil seguiram em alta até o fim da sessão, com o mercado ainda repercutindo negativamente a entrevista do presidente Lula à TV Record, na qual disse que precisaria ser convencido sobre a necessidade de corte de gastos. O dólar em alta, e voltando a mirar com os R$ 5,50 nas máximas do dia, também pesou sobre a curva.
No fechamento, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 tinha taxa de 10,620%, de 10,573% ontem no ajuste, e o DI para janeiro de 2026 subia de 11,09% para 11,20% (máxima). A do DI para janeiro de 2027 avançava de 11,36% para 11,44% e a do DI para janeiro de 2029, de 11,72% para 11,77%.
A entrevista de Lula, que ontem já limitava o recuo das taxas, continuou exercendo pressão, desta vez com o ambiente externo em segundo plano. Os rendimentos dos Treasuries operavam sem direção única pela manhã, mas na segunda etapa a ponta longa virou para baixo após um leilão de T-bonds de 20 anos, com demanda acima da média. No fim da tarde, a taxa da T-Note de dez anos operava em 4,15%.
"O exterior poderia estar atenuando a pressão sobre os juros aqui, mas as tensões fiscais estão apagando essa influência positiva", afirmou o sócio da WMS Capital, Marcos Moreira. "As preocupações com as contas públicas ganharam evidência com a entrevista de Lula", completou.
Na entrevista, o presidente afirmou ser aceitável não cumprir a meta fiscal se houver "coisas mais importantes para serem feitas" e que precisa "estar convencido" se "há necessidade ou não de cortar (gastos)". Em outro trecho, porém, disse que fará o "necessário para cumprir o arcabouço fiscal" – que prevê o déficit zero em 2024.
As declarações chegam num momento em que o mercado se animava com a possibilidade de o governo cortar R$ 25,9 bilhões em despesas obrigatórias no Orçamento de 2025, que segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem o aval do presidente. Haddad ontem tentou contemporizar sobre a fala de Lula, mas não conseguiu reverter o impacto na curva.
A economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, ressalta que a entrevista de Lula pega o mercado em compasso de espera pelo relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas no dia 22 de julho, no qual o foco está em qual que será o tamanho do contingenciamento anunciado pelo governo. "Nas últimas semanas a gente acompanhou um ajuste na comunicação do governo relacionado ao gerenciamento das contas públicas e haverá essa primeira prova de fogo para ver o que efetivamente o governo fará", afirma. Segundo apurou o Broadcast, os ministros da Junta de Execução Orçamentária (JEO) devem se reunir amanhã pela manhã para discutir os números.
Além da apreensão com o lado fiscal, Abdelmalack acrescenta que a desvalorização do câmbio hoje também acabou pressionando a curva, uma vez que a alta do dólar pode piorar ainda mais a desancoragem das expectativas de inflação, que, por sua vez, é um dos principais fatores a explicar a interrupção do ciclo de queda da Selic.
A moeda americana fechou em R$ 5,4838, no maior nível em duas semanas.