Estadão

Juíza abre ação e torna réus dois acusados de elo com Hezbollah

A juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, da 2.ª Vara Federal Criminal de Belo Horizonte, tornou réus dois alvos da Operação Trapiche – investigação sobre brasileiros que teriam sido recrutados pelo grupo radical Hezbollah. Mohamad Khir Abdulmajid, conhecido como "Habibi", e Lucas Passos Lima agora respondem a ação penal por crimes previstos na Lei de Antiterrorismo.

A avaliação da juíza é a de que a denúncia do Ministério Público Federal contra os dois acusados preenche os requisitos listados no Código de Processo Penal, "uma vez que as imputações abrangem fatos aparentemente criminosos" e são lastreadas "em elementos informativos idôneos". Para Raquel, há justa causa para a abertura de um processo criminal contra os denunciados.

Lucas Passos Lima, autônomo, está custodiado no Centro de Detenção Provisória II de Guarulhos, na Grande São Paulo. Ele foi preso em novembro do ano passado, no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Cumbica, quando desembarcava de um voo do Líbano. A audiência de instrução do processo referente a Lima foi marcada para 28 de março. Segundo a decisão, ele "se encontrava no estágio mais avançado do recrutamento".

Mohamad Abdulmajid, sírio naturalizado brasileiro e dono de tabacarias em Belo Horizonte, é considerado foragido. O acusado teria saído do Brasil em outubro do ano passado, com destino a Beirute, sem notícia de retorno ao País. Seu nome foi incluído na Difusão Vermelha da Interpol.

<b>Crimes</b>

Na mesma decisão em que recebeu a denúncia contra Lima e Abdulmajid, a juíza autorizou o compartilhamento de informações colhidas ao longo da investigação contra os dois com uma apuração paralela sobre suspeita de contrabando, falsidade ideológica e financiamento ao terrorismo. A magistrada também deu aval, com apoio da Procuradoria, para o desmembramento do caso em novos inquéritos sobre outros suspeitos identificados na Operação Trapiche.

A juíza destacou que, com a prisão de Lima, foi necessário o encerramento da investigação sobre ele, com o oferecimento de denúncia de "maneira célere". De outro lado, Raquel ponderou que foram identificados outros brasileiros alvo de recrutamento pelo Hezbollah – Michael Messias, Francísio de Souza Batista e Gabriel Paulo Alves.

"O perfil dos recrutados levantou suspeitas pela ausência de vínculos com o País ou condições financeiras para empreender tais viagens ao exterior (alguns por mais de uma vez ou três vezes em menos de 12 meses) e por possuírem antecedentes criminais. Francísio e Gabriel viajaram apenas uma vez cada a Beirute, no Líbano, ao passo que Lucas e Michael voltaram ao mesmo destino no decorrer do ano de 2023", anotou a magistrada.

<b>Viagens</b>

O despacho ressalta que, até agora, "não foram encontrados elementos suficientes quanto ao envolvimento dos demais" citados. No entanto, a juíza ressaltou que há diligências já determinadas que ainda não foram finalizadas, como a expedição de ofícios para as companhias aéreas e agências de turismo responsáveis pela venda de passagens aos investigados. A PF quer saber quem comprou os bilhetes e qual foi a forma de pagamento.

A juíza afirmou que os dados já apurados apontam a possibilidade de novas diligências para angariar mais provas sobre o "envolvimento dos recrutados e de outras pessoas citadas na reserva das passagens e nas informações policiais". Observou, ainda, como Lucas Lima teria mantido conversas com outro investigado, "contando com seu conhecimento em informática, para confecção de site ou aplicativo, havendo a possibilidade de participação também desse em atos preparatórios ao terrorismo".

Procuradas, as defesas dos réus Lucas Lima e de Mohamad Khir Abdulmajid e dos outros citados não haviam se manifestado até a publicação deste texto. O espaço está aberto a manifestações.

<b>Operação</b>

A ofensiva da PF sobre um grupo suspeito de organizar atentados terroristas contra a comunidade israelita no Brasil foi aberta em 8 de novembro do ano passado. A operação, batizada de Trapiche, teve apoio do Mossad, o serviço secreto de Israel. Os investigados teriam ligação com o Hezbollah, financiado pelo Irã.

Na ocasião, foram cumpridos sete mandados de busca e apreensão em Minas Gerais, três no Distrito Federal e um em São Paulo, além de dois mandados de prisão temporária – Lucas Passos Lima foi um dos detidos. Conforme a PF, as ordens, expedidas pela Subseção Judiciária de Belo Horizonte, tinham como objetivo "interromper atos preparatórios de terrorismo e apurar um possível recrutamento de brasileiros para a prática de atos extremistas no País". Não foram divulgados os possíveis alvos.

De acordo com os investigadores, alguns dos suspeitos viajaram para Beirute para encontros com o Hezbollah, organização política e paramilitar criada durante a guerra civil libanesa, nos anos 1980, com atuação no Líbano e na Cisjordânia. As apurações que levaram à operação tiveram início com informações colhidas pela inteligência dos Estados Unidos e de Israel.

A pena para constituir ou integrar organização terrorista é de cinco a oito anos de prisão, além de multa. Considerando a preparação de ataques terroristas, a pena pode ser elevada para 15 anos e seis meses de reclusão. A lei considera os crimes relacionados ao terrorismo como hediondos. As infrações são consideradas inafiançáveis, insuscetíveis de graça (perdão), anistia ou indulto. O cumprimento das penas se dá inicialmente em regime fechado, independentemente de trânsito em julgado da condenação.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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