Estadão

Le Roi Léon obtém feitos na piscina de Paris que nem Michael Phelps tem na história olímpica

As comparações com Michael Phelps eram inevitáveis. Léon Marchand tem como especialidade algumas das provas que foram dominadas pelo americano, os 200 metros e 400m medley e os 200m borboleta, e treina com Bob Bowman, técnico que acompanhou Phelps na conquista de seus 23 ouros em Jogos Olímpicos.

É bastante improvável que Marchand se aproxime dos 28 pódios conquistados por Phelps em cinco participações olímpicas, mas aos 22 anos o francês já acumula feitos que o maior medalhista não só da natação, mas da história olímpica, não tem e, até mesmo, nem deve ter cogitado devido à dificuldade.

Filho de Xavier Marchand, nadador com duas participações olímpicas, e de Céline Bonnet, que foi recordista francesa, Leon conquistou o ouro nos 200m borboleta e nos 200m peito na quarta-feira. Nunca um atleta, mulher ou homem, havia conseguido chegar ao topo do pódio em provas desses dois estilos, que utilizam técnicas muito distintas, em uma mesma edição dos Jogos Olímpicos.

Vários podem ter tentado, mas quem mais se aproximou disso, e mesmo assim ficou muito distante, havia sido a americana Mary Jane Sears, que ganhou o bronze nos 100m borboleta e ficou em sétimo lugar nos 200m peito nos Jogos de Melbourne-1956.

Inicialmente, a World Aquatics, entidade que regula a natação mundial, havia planejado as disputas dos 200m borboleta e dos 200m peito em Paris próximas uma da outra, já que não havia cogitado a possibilidade de alguém disputá-las com ambições reais de conquistas.

A programação olímpica só foi alterada após um pedido da Federação Francesa de Natação para tornar menos árdua a tarefa de sua grande estrela na Arena La Défense. Com isso, Marchand teve cerca de duas horas para descansar entre a final do borboleta e a disputa no peito.

Na quarta-feira, às 15h37, o francês caiu na água na condição de azarão contra o então campeão olímpico e recordista olímpico e mundial dos 200m borboleta, o húngaro Kristof Milak, que liderou desde começo de maneira visível. Na última virada, nos 150m, Milak tinha 72 centésimos de vantagem.

A barulhenta torcida francesa parecia resignada com a prata, que não parecia tão ruim. Pouco depois, Marchand voltaria à piscina na condição de favorito nos 200m peito. Além disso, já tinha conquistado o ouro nos 400m medley, batendo o recorde olímpico que ainda pertencia a Phelps.

Mas o nadador francês ainda estava na disputa e saiu da parede com sua reconhecida técnica na parte submersa, permitida até somente os 15 metros. Marchand foi ganhando terreno e bateu 52 centésimos na frente do rival. Com 1min51s21, o francês tirou não só o título, mas também o recorde olímpico de Milak. "Vi muitas provas dele", disse Marchand. "Sabia que ele tem muita velocidade, muito mais do que eu, então eu estava apenas tentando ficar o mais perto possível e então eu o pressionei no final", completou ele, sobre sua estratégia na prova.

Menos de duas horas depois, ele voltou a cair na água. Na prova de peito, Marchand confirmou o favoritismo de forma dominante e liderou a prova de ponta a ponta. O australiano Zac Stubblety-Cook, campeão e recordista nos Jogos de Tóquio, em 2021, adotou uma estratégia progressiva. Passou os 50m em quinto lugar, os 100m em terceiro e os 150m em segundo. Nos 50m finais até conseguiu diminuir um a vantagem de Marchand, mas chegou quase um segundo atrás (0s94).

Com dois ouros individuais e dois recordes olímpicos no mesmo dia, o francês chamado pela torcida de "Le Roi Léon" conseguiu outro feito que falta a Phelps, que nunca fez uma dobradinha dourada, sem contar os revezamentos, na mesma etapa. O americano Ryan Lochte ganhou duas medalhas individuais duas vezes na mesma noite (Pequim-2008 e Londres-2012), mas nunca duas de ouro.

A última nadadora a conquistar a proeza foi Kornelia Ender, da Alemanha Oriental, que venceu os 200m livre e os 100m borboleta em 22 de julho de 1976, nos Jogos de Montreal. Mais tarde, foi revelado um sistema de doping sistemático comandado pela Alemanha Oriental. Ender afirmou não saber o que estava acontecendo, e seus tempos e resultados foram mantidos.

"Sou muito tímido", disse Marchand. "Fui o centro das atenções durante essas duas provas. Estava tentando obter a energia de toda a multidão. Eles são incríveis e me empurraram em todas as finais."

Marchand tem mais uma missão em seu período como "Le Roi Léon" em Paris: os 200m medley. O recorde olímpico da prova ainda pertence a Michael Phelps desde Pequim-2008.

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