A proposta de liberar a caça no Brasil, ideia que está com projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional, é rejeitada por 90% da população brasileira. O dado faz parte de um levantamento feito pelo Instituto Datafolha, a pedido da organização WWF-Brasil.
Para a pesquisa, foram entrevistadas em todas as cinco regiões do País 2.088 pessoas, a partir dos 16 anos, que responderam a duas perguntas: "Você concorda com a ideia de autorizar a caça de animais no Brasil?" e "Votaria em quem apoia a caça no Brasil?".
Do total de pessoas entrevistadas, 90% discordam da ideia de autorizar a caça, 9% concordam e 1% não soube responder. A rejeição é maior entre as mulheres (92%) e residentes nas regiões metropolitanas, com 93%.
A opinião feminina é também majoritária quando o tema é a possibilidade de votar em candidatos que apoiam a caça: 91% afirmaram que não votariam em quem defende a pauta, frente a 88% da população geral. Apenas 10% dos entrevistados em geral disseram que votariam em candidatos que apoiam a autorização da caça.
Apesar de a caça ser liberada apenas para espécies como o javali, que é considerado um invasor, a quantidade de CACs (colecionadores, atiradores e caçadores) aumentou consideravelmente na gestão de Jair Bolsonaro. Desde 2018, o número de armas para essa categoria saltou de 350,6 mil para 1.006.725 neste ano. Os dados são do Exército e foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação, pelos institutos Igarapé e Sou da Paz.
Entre as espécies ameaçadas que costumam ser alvo de caçadores estão a arara-azul, o tatu-bola, o mico-leão-dourado e o boto-cor-de-rosa.
"Todos sofremos com a grande circulação de armas. Mães perdem seus filhos em brigas de trânsito, vizinhos se matam entre si por bobagens, apenas porque um teve acesso facilitado a uma arma de fogo", diz Raul do Valle, coordenador de Incidência política do WWF-Brasil. "Estamos vendo, chocados, um aumento nos casos em que pais de família matam esposa, filhos, parentes e depois se matam. O aumento na circulação de armas em nossa sociedade é uma tragédia e só tende a piorar se as coisas não mudarem."
A região amazônica, notadamente conhecida pelos conflitos fundiários, foi uma das que registraram maior aumento na quantidade de armas em circulação, com 700% desde 2018.
Raul do Valle afirma que a liberação da caça esportiva faria aumentar ainda mais as hipóteses para aquisição de armas com amparo legal. Hoje isso só é possível legalmente em hipótese de subsistência e controle de pragas. "Estamos falando de um problema grave de segurança, não apenas ambiental: mais armas em circulação significa mais violência comum e do próprio crime organizado, que já é imensa", diz.
No Congresso, tramitam propostas como o projeto de lei 5544/2020, que dispõe sobre a autorização para a caça esportiva de animais no território nacional. O projeto aguarda a criação de uma comissão especial designada pela Mesa Diretora do Congresso Nacional.
Autor do projeto, Nilson Stainsack (Progressistas-SC), que hoje não atua mais como parlamentar, afirmou, ao defender a proposta, que "a proibição da caça no Brasil não parece oferecer ganhos práticos em relação a conservação das espécies e manutenção de habitats".
Segundo Stainsack, "a falta de regulamentação e a aversão ao tema, que é extremamente polarizado, retira a possibilidade do Estado brasileiro conhecer a realidade da fauna, suas limitações e possibilidades de manejo".