Muti Randolph não sabe ao certo quando começou a criar sua arte. Sabe apenas que, desde a infância, algumas imagens faziam com que ele viajasse em pensamentos. “Eu tinha um (videogame) Atari com um joguinho de encurralar um adversário”, lembra Muti em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo no recém-inaugurado restaurante Bossa, projeto assinado por ele em São Paulo. “Nesse jogo, tinha um módulo sem competição, no qual eu podia desenhar livremente na tela da televisão com aqueles pixels gordos, numa resolução tosca”, enfatiza
Foi esse um dos primeiros incentivos para que Randolph se tornasse um designer e arquiteto autodidata, autor de obras inovadoras e dinâmicas. Seu currículo está reunido no livro Timespaces, que tem lançamento marcado para o dia 9 de março, segunda-feira, na Livraria da Travessa em Ipanema, no Rio.
O carioca assina projetos diversos desde a década de 1990, mas foi em 2003 que seu nome se destacou no ramo da arquitetura. Na ocasião, Randolph foi convidado a assinar o visual da casa noturna D-Edge, em São Paulo. Ele intensificou o ambiente por meio de um software que detecta o som e, imediatamente, faz sua tradução em forma de luz. Assim, a iluminação no piso, no teto e nas paredes se modifica de acordo com o som executado no local.
“Foi um divisor de águas na minha carreira”, afirma. “Além de ter sido uma evolução no meu trabalho, também mudou a história das pistas de dança. O projeto foi muito copiado e virei referência na área.” Randolph diz que sua arquitetura de luz é dinâmica no que mostra ao público e também na essência, já que está sempre em mutação. O próprio trabalho na D-Edge começou em 2D, com mais influências gráficas, e hoje tem característica tridimensional.
Com atuação constante no mundo da moda, Randolph tem um apreço especial por Colcci Ondas, desfile que criou para a marca de roupas em 2007, no Rio.
Influenciado pelo surfe, ele criou ondas com até 8 metros de altura em 33 metros de comprimento. As modelos passavam por dentro da estrutura, como se estivesse “pegando tubos”. Luzes coloridas remetiam ao pôr do sol carioca. “É um dos trabalhos que eu mais gosto, mas, ao mesmo tempo, foram usadas toneladas de isopor, madeira, coisas que duram 15 minutos e depois vão para o lixo”, pondera. Apaixonado por biologia – carreira que quase seguiu antes de se inscrever em um curso de Comunicação Visual -, Randolph passou a se preocupar com a questão ecológica. Desde o desfile, ele dá preferência a estruturas modulares e equipamentos de vídeo alugados. “Tudo volta depois e é reaproveitado, sem desperdício.”
Em família
Filho da musicista Clara Sverner, Randolph tem a influência da música em sua obra desde sempre. A ideia do projeto realizado na D-Edge deu origem ao espetáculo Sinestesia, que une os trabalhos de ambos. No palco, Clara toca piano enquanto imagens tridimensionais se formam em um grande telão acima da artista. Nas primeiras versões do concerto, Randolph utilizava um sistema que captava o som do instrumento. Depois, resolveu mudar o mecanismo. “No piano, dependendo da música, são muitas notas tocadas ao mesmo tempo, o que não criava um resultado bom para o público”, lembra, explicando que, em outras apresentações, o software passou a calcular o movimento de cada tecla, sem passar pela música.
Sinestesia ganha, na sexta-feira, 6, uma apresentação na Sala Cecília Meireles, no Rio: pela primeira vez, o espetáculo utilizará videomapping, com projeção de imagens especialmente adaptadas à arquitetura do local.