Em uma nota preliminar, o escritor norte-americano David Ebershoff diz que A Garota Dinamarquesa “é uma obra de ficção inspirada na história de Lili Elbe e sua esposa, Gerda”. Ou seja, assume ter romanceado um caso real, aquele que é considerado um dos primeiros de uma cirurgia de afirmação de gênero, como hoje se diz, em que Einar Wegener se converte em Lili Elbe.
Ebershoff baseou-se nos diários e correspondência de Lili, editados em 1933 por Niels Hoyer após a morte da autora, sob o título de Man Into Woman. Mas Ebershoff admite que mesmo esse material de primeira mão foi retrabalhado por Hoyer até se converter numa “biografia híbrida, semificcional”. Difícil, portanto, escavar a “verdade” absoluta dos fatos, ainda mais em terreno tão movediço, íntimo e cercado de silêncios, julgamentos morais e preconceitos. Dessa forma, sentiu-se livre para, com o material disponível, fabular e ficcionalizar, fazendo de A Garota Dinamarquesa um romance apenas inspirado em vidas reais. Quer dizer, uma peça de invenção, destinada a interpretar essas vidas longínquas no tempo e torná-las contemporâneas do público atual.
Dessa forma, Ebershoff se vale de alguns expedientes que são omitidos no filme. Por exemplo, evocar a infância dos personagens, a de Gerda, na Califórnia, a de Einar/Lili na própria Dinamarca, filho de família pobre, cujo pai era pescador. Mas, de qualquer forma, o livro abre de forma direta com a cena, digamos assim, primordial, na qual Gerda pede ao marido Einar para que vista as peças femininas e pose para ela. O romance tem bom texto e linguagem envolvente. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.