Estadão

Lula vai a posse de novo presidente do Paraguai em meio à renegociação de Itaipu

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou nesta terça-feira, dia 15, da cerimônia de posse do novo presidente do Paraguai, Santiago Peña. Em gesto de aproximação política e prioridade nas relações regionais, Lula fez questão de viajar a Assunção para a posse de Peña.

A celebração ocorreu dois dias depois de o acordo para a construção da Usina Binacional de Itaipu ter completado 50 anos. Com a data e com a prévia quitação dos valores acertados para a construção da hidrelétrica, os termos financeiros do tratado devem ser obrigatoriamente renegociados entre Brasil e Paraguai. O prazo era previsto originalmente na assinatura do acordo.

Os dois presidentes já haviam se encontrado três vezes desde a eleição do paraguaio, em 30 de abril. Peña viajou duas vezes a Brasília, em maio e em julho, e foi recebido por Lula em audiência nos palácios do Planalto e da Alvorada. Além disso, acompanhou a última cúpula do Mercosul, em Puerto Iguazú, Argentina, quando o Brasil assumiu a coordenação temporária do bloco. Na véspera da posse, Lula ofereceu um jantar a Peña na embaixada brasileira.

A posse de Peña foi a primeira prestigiada por Lula desde o início de seu terceiro mandato, em janeiro. Embora o político do Partido Colorado seja de centro-direita, ideologicamente distante do petista, ambos defendem a integração regional e dizem querer desenvolver uma relação pragmática entre os dois países. Peña tem como plataforma política geração de 500 mil empregos formais no Paraguai.

"O Paraguai é um parceiro importante para o Brasil. Queremos continuar a ter uma boa relação com o país vizinho, dando continuidade aos investimentos entre nossos países", afirmou Lula, antes de decolar ao país, que reúne uma das maiores comunidades brasileiras no exterior. Dados do Itamaraty mostram que o Paraguai reúne cerca de 245 mil brasileiros.

<b>Itaipu</b>

Na primeira visita ao exterior após eleito, Peña reafirmou a intenção de seu governo de rever o tratado de Itaipu Binacional. O tema é um dos principais na agenda da relação bilateral. Ele disse que os países não devem se limitar a rever apenas as condições financeiras de compra e venda de energia, do aproveitamento da energia excedente gerada, e que espera uma conclusão rápida das conversas com o Brasil.

O tratado foi assinado em 1973. Cada país fica com metade da energia gerada, mas o Brasil compra do Paraguai mais 30%, pelo mesmo valor. A usina gera atualmente cerca de 8,6% da energia consumida no País. Já no Paraguai, abastece o equivalente a 86,3% – e não há mais demanda. Mas Peña diz que o desafio do país é exatamente esse, gerar empregos e usar mais da energia produzida em escala maior do que a necessária no momento.

"Temos que revisar. As condições financeiras estão estabelecidas no anexo C, mas nada impede que possamos discutir todo o tratado. Temos o anexo A, o anexo B… O tratado em si, que no passado esteve sujeito a revisões. Não estamos limitados a ver somente as condições financeiras, mas temos que definir o papel que esse grande empreendimento binacional vai cumprir", afirmou Peña, ao ser questionado pelo <b>Estadão</b> em maio. "Vai ser rápido. Há uma enorme predisposição. Lula expressou muito carinho ao povo paraguaio, ele nos vê com muito carinho, assim como olhamos o Brasil e a volta de Lula à Presidência. Vamos trabalhar muito próximos e chegar a um acordo o mais rápido possível."

Os paraguaios defendem novas formas e mais liberdade de uso de sua cota na energia gerada pela usina. Em março, os custos de construção foram quitados por completo, e agora os países discutem os próximos termos. Eles se queixam de que o Brasil aproveita mais da energia da usina e que atualmente compra a preços baixos o que o país vizinho subutiliza.

Cinquenta anos depois de assinado, a validade do "anexo C", que traz as condições de compra da energia entre os países, venceu em 13 de agosto. O Brasil tinha preferência na compra da energia excedente de Itaipu, mas o governo paraguaio reclama que a recebia valores baixos. Segundo dirigentes da binacional, os países poderiam optar por manter os termos anteriores, o contrário do que Assunção indicou. Há possibilidades aventadas antes, como a venda para outros países ou um aumento do valor da tarifa cobrada do Brasil.

<b>Perfil</b>

Economista, Santiago Peña foi ministro da Fazenda, integrante do Conselho de Administração do Banco Central no Paraguai, além de dirigente do Fundo Monetário Internacional (FMI) para a África. Peña pertence a uma corrente do Partido Colorado que tem como figura central o ex-presidente Horacio Cartes – de quem foi ministro. Esse grupo é adversário interno da ala ligada ao ex-presidente Mario Abdo Benítez. Ele perdera as eleições internas em 2018 para Benítez.

Antes de assumir em Assunção, o novo presidente paraguaio alinhou o discurso com Lula nas negociações do acordo comercial entre Mercosul e a União Europeia. Ele ecoou as reclamações do governo brasileiro, que rejeitou os termos de compromissos ambientais exigidos pelos europeus.

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