A tentativa do presidente da CBF, Rogério Caboclo, de melhorar o relacionamento com os jogadores e a comissão técnica da seleção brasileira antes da vitória diante do Equador, nesta sexta-feira, surtiu o efeito contrário. A visita do dirigente ao vestiário dos atletas, no Beira-Rio, deixou os jogadores constrangidos e envergonhados. O dirigente se afastou ainda mais do grupo. Os jogadores planejam divulgar um manifesto, por escrito, contra a realização da Copa América.
Antes da quinta vitória em cinco jogos da seleção, o dirigente foi ao vestiário juntamente com Cafu, Juninho Paulista, coordenador da seleção, e Clodoaldo, chefe da delegação. O dirigente fez um discurso entusiasmado e participou da corrente dos atletas, o último ato coletivo de motivação antes de uma partida.
Os jogadores ficaram incomodados com duas situações especificamente. Uma delas foi o pedido do dirigente para que os atletas não dessem entrevistas após o jogo das Eliminatórias da Copa do Mundo. Para os jogadores, o veto surgiu como uma tentativa de controlar as manifestações do grupo. Outro fato embaraçoso foi o próprio teor do discurso. Caboclo falou de união, motivação, sem pertencer, de fato, ao grupo. "Ele faz as coisas como se tudo estivesse normal", disse uma pessoa próxima aos jogadores.
E não está tudo normal nos bastidores da entidade máxima do futebol brasileiro. Uma funcionária da CBF protocolou nesta sexta-feira uma acusação de assédio moral e sexual contra o presidente da entidade, Rogério Caboclo. A denúncia foi formalizada perante a Comissão de Ética do Futebol Brasileiro, que vai investigar os fatos. A mulher, que não teve seu nome divulgado, diz ter sido vítima de várias condutas abusivas de Caboclo desde abril de 2020. Ela afirma ter provas. Procurada pelo Estadão, a CBF não havia se pronunciado até a publicação desta reportagem.
Caboclo ainda fez questão de uma demonstração pública de bom relacionamento com Tite. As câmeras mostraram uma longa conversa do dirigente, os mesmos ex-jogadores que estavam no vestiário e Tite. Na despedida, Caboclo fez questão de aproximar sua testa da do treinador, num gesto de comprometimento e proximidade.
Os atletas reclamam da disputa da Copa América juntamente com as Eliminatórias, competição que eles consideram mais importante neste momento. Os mais experientes do elenco se mostraram incomodados por terem descoberto pela imprensa e pelas redes sociais que o Brasil sediará o torneio. Reclamam que não houve diálogo com a entidade sobre a mudança da sede do torneio – inicialmente, o torneio continental seria realizado na Colômbia, que desistiu por problemas políticos internos, e na Argentina, que declinou em função do agravamento da pandemia de covid-19. Tite e sua equipe se posicionaram a favor dos atletas. Reuniões com a cúpula da CBF só acentuaram as diferenças. E a ida do presidente ao vestiário piorou ainda mais o ambiente.
Preocupados com a repercussão do protesto nas redes sociais, os atletas planejam até divulgar um manifesto sobre a Copa América. A ideia é mostrar que estão unidos, mas não querem politizar a atitude como um apoio ou protesto ao presidente Jair Bolsonaro ou a Rogério Caboclo. O documento ainda não tem data definida de divulgação.
Desde a última quinta-feira, a hashtag #ForaTite, movimento pedindo a saída do técnico da seleção brasileira, ganhou espaço nas redes sociais. Internautas chamaram o treinador de "esquerdopata" e "lacrador" por conta de um possível boicote do técnico, sua comissão e até mesmo os jogadores à Copa América 2020. Em sua maioria, os internautas que usam a hashtag #ForaTite são favoráveis à realização da Copa América em território nacional e apoiam o presidente Jair Bolsonaro.