A manobra do novo presidente da Fifa, Gianni Infantino, para enterrar as reformas na entidade abriu uma nova crise e levou um dos homens mais poderosos da organização, Domenico Scala, a renunciar em protesto. Por quase um ano e sempre nos bastidores, Scala foi o “presidente de fato” da Fifa e quem garantiu que cartolas fossem punidos, entre eles Michel Platini e seu ex-chefe, Joseph Blatter.
Na sexta-feira, no congresso anual da Fifa no México, Infantino acabou com a independência das investigações e, por 186 votos a favor e apenas um contra, a entidade aprovou mudanças no estatuto, dando à cúpula poderes que Blatter jamais imaginou ter.
Como forma de dar um sinal positivo ao mundo, porém, a Fifa anunciou a escolha de uma mulher como sua primeira secretária-geral, rompendo um tabu de mais de cem anos. Mas o ato foi considerado internamente por parte dos dirigentes apenas uma cortina de fumaça para tentar esconder a manobra.
Pelas novas regras, Scala, chefe da auditoria independente da Fifa, assim como o juiz independente Hans-Joachim Eckert e o investigador independente Cornel Borbely, poderão ser simplesmente demitidos pela direção da entidade, sem qualquer justificativa. Foram eles quem conseguiram limpar de uma certa forma a Fifa de personalidades suspeitas, com decisões que desagradaram muitos.
Mark Pieth, ex-consultor da Fifa e um dos principais especialistas em combate à corrupção, criticou a manobra de Infantino e o acusou de ter operado uma “revanche” diante da recusa de Scala de permitir que o presidente da Fifa recebesse mais de US$ 2 milhões por ano.
Chefe da auditoria da Fifa e o homem que desenhou a reforma da nova Fifa, Scala já abandonou a reunião no México diante da manobra de Infantino. Um dia depois, renunciou por considerar que as investigações e os comitês tiveram sua “independência terminada”. Em resposta, a Fifa acusou Scala de estar fazendo declarações “sem base”.
Para Scala, um investigador poderia ser ameaçado de ser demitido se optasse por abrir um inquérito contra um cartola. “Isso impede investigação”, disse. “Isso mina o pilar central da boa governança da Fifa e destrói o centro das reformas”, declarou.
“O que está ocorrendo é um alerta a todos aqueles que defenderam as reformas de forma genuína “, disse. Foi Scala quem de fato presidiu a Fifa por quase um ano, entre a queda de Joseph Blatter e a eleição de Infantino. Foi ele também quem desenhou as reformas e colocou limites aos dirigentes, inclusive estabelecendo regras para o uso do avião oficial da entidade.
Em nota, a Fifa explicou que a mudança nas regras foi “mau interpretada” e que a possibilidade de demissão se refere à possibilidade de poder afastar alguém, sem ter de esperar um ano até o próximo congresso da Fifa. “A medida permite a remoção daqueles que violaram as leis”, argumentou a entidade.
Num esforço para agradar a opinião pública, porém, Infantino anunciou a escolha de uma mulher negra e africana para o cargo de CEO da Fifa, substituindo o francês Jèrôme Valcke. A senegalesa Fatma Samoura será quem comandará um dos postos mais cobiçados do mundo do futebol e responsável pela Copa do Mundo.
Mas seus críticos alertam que ele sequer seguiu os critérios apontados pela auditoria de Scala para anunciar o nome, num sinal de que poderia ter escolhido alguém com um perfil baixo para diminuir seus poderes.