Em um novo julgamento do habeas corpus do narcotraficante internacional André do Rap, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello votou novamente pela soltura do líder da facção criminosa PCC e voltou a criticar o presidente do Supremo, Luiz Fux, que havia revogado a decisão inicial do colega. Marco Aurélio disse que o presidente do STF demonstrou visão totalitária quando suspendeu a liminar que determinava a soltura do traficante.
O novo julgamento se diferencia daquele em que o tribunal decidiu, por 9 votos a 1, confirmar a decisão de Luiz Fux, no mês passado. Daquela vez, o julgamento era sobre uma ação específica da Procuradoria-Geral da República (PGR), enviada à presidência do tribunal, pedindo que Fux suspendesse a liminar de Marco Aurélio Mello. Agora, o que se discute é um outro pedido da PGR, encaminhado diretamente ao ministro Marco Aurélio, em que a Procuradoria recorreu da decisão do magistrado que havia mandado soltar o traficante. Essa nova votação começou nesta sexta-feira, 13, no plenário virtual do tribunal, em que os demais ministros têm sete dias para enviar o voto. O resultado será conhecido daqui a uma semana.
Autor do único voto até aqui, o ministro Marco Aurélio Mello fez uma defesa enfática dos fundamentos que o levaram a soltar André do Rap no início de outubro. Para ele, todos eles continuam a existir, mesmo diante do fato de que o traficante está foragido após ter fugido tão logo foi solto, contrariando a informação dos advogados de que permaneceria em endereço conhecido.
Marco Aurélio voltou a afirmar que, se não houver novo pedido fundamentado para a manutenção de prisões preventivas após 90 dias, elas devem ser anuladas, porque se tornam ilegais, de acordo com o artigo 316 do Código de Processo Penal. O plenário do STF, no entanto, teve compreensão diferente, no sentido de que, após o prazo de 90 dias, não deve haver soltura automática, e sim o juiz original do caso deve ser obrigado a conceder uma nova decisão avaliando se é o caso de manter ou não o réu preso.
O ministro, que ficou inconformado com o fato de que Luiz Fux cassou a liminar sozinho, voltou a criticar a decisão do presidente do tribunal. A suspensão de decisões de colegas é algo mal visto dentro da corte, mas foi admitida neste caso excepcional, em que os ministros concordaram que o traficante não poderia permanecer solto.
"O quadro agravou-se, sobremaneira, quando o Presidente do Supremo, à margem dos ditames legais e regimentais, arvorando-se em visão totalitária, censor do ato embora ombreando com o prolator da decisão, veio a afastá-la do cenário jurídico. Fê-lo, totalmente sem base legal, na suspensão de liminar nº 1.395", disse Marco Aurélio em seu novo voto.
O magistrado frisou que foi derrotado, por escore acachapante de 9 votos a 1. "Manifestei-me em sentido diametralmente oposto. Primeiro, escancarando a visão totalitária do Presidente. Depois, observando não a pura literalidade do parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal, mas o objetivo da norma", disse.
A maioria dos ministros considerou de extrema gravidade o fato de que o traficante estava foragido, ao votarem para confirmar a decisão de Fux. Marco Aurélio Mello, porém, em seu novo voto, disse que cidadãos têm o "direito natural" de ficar em "lugar incerto e não sabido" se está diante de uma ilegalidade.
"Sob o ângulo da autodefesa, há de reconhecer-se, como direito natural, o cidadão estar em lugar incerto e não sabido, não se submetendo a ato ilegal", disse. André do Rap ainda continua em liberdade.