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Meirelles: Empresas que ficaram fora das exceções terão de pagar mais impostos

O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles classifica como uma distorção a quantidade de exceções concedidas pelo Senado a alguns setores da economia durante as negociações que antecederam a aprovação da reforma tributária na Casa.

Para compensar estas exceções, de acordo com o ex-ministro, é que a alíquota-padrão do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) ficará, inicialmente, em 27,5%, acima da internacional. O efeito colateral desta taxa, que poderá ser maior, é aumento da carga tributária aos consumidores que não conseguiram vantagens do Congresso Nacional. "Não só o consumidor, mas todas as empresas que ficaram fora das exceções terão de pagar mais impostos", afirma.

"De modo geral a reforma é positiva porque mantém uma alíquota única, diminui a guerra fiscal e simplifica o processo", pondera Meirelles.

O ex-ministro diz também enxergar espaço para o Banco Central continuar cortando juro, mas adverte que o fiscal vai influenciar nesta trajetória e sugere ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que não desista de buscar a meta de déficit primário zero em 2024.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista.

<b>O senhor assinou o manifesto em apoio à aprovação da reforma. É a melhor reforma?</b>

É positiva porque mantém uma alíquota única, diminui a guerra fiscal, simplifica o processo e o IVA é o caminho que se usa internacionalmente há décadas.

<b>O ex-ministro Maílson da Nóbrega avalia que economicamente há muito que se comemorar, mas que do ponto de vista social muito a lamentar.</b>

Concordo com o Maílson. Realmente, o volume de exceções cria uma distorção na alíquota-padrão do IVA. Para compensar estas exceções, o IVA será de 27,5% segundo cálculos do Ministério da Fazenda, bem acima da média internacional. E alguém vai pagar por isso.

<b>No caso, o consumidor final, os mais pobres, correto?</b>

Não só o consumidor, mas todas as empresas que ficaram fora das exceções terão de pagar mais impostos.

<b>Por que uma reforma que mantém privilégios pode ser considerada positiva?</b>

É uma reforma que contou com a participação de todos os Estados, que inclusive apresentaram substitutivos, e que vai contribuir para o ganho de produtividade. Cria distorções, é verdade, mas corre na direção correta. Um estudo do Banco Mundial mostra que muito da nossa perda de competitividade se deu por causa da nossa complexidade tributária.

<b>Falando um pouco sobre política monetária, há espaço para o BC continuar cortando juro?</b>

Não há dúvida de que temos espaço para continuarmos reduzindo a taxa de juro. Os juros nos Estados Unidos estão subindo, a economia europeia está difícil, mas a economia brasileira está bem e temos um diferencial de juro favorável.

<b>Qual o risco para essa trajetória de cortes da Selic?</b>

Muito disso será influenciado pelo fiscal. O déficit zero beneficiaria muito o Banco Central porque controlaria as expectativas. Vamos aguardar.

<b>Tem condições ainda de atingir o déficit zero nas contas públicas?</b>

Nada é definitivo. Achar que tem ou não condições é uma questão política, de saber o que vai passar ou não no Congresso. Eu acho que o ministro Haddad deve continuar atrás do déficit zero.

<b>E se o déficit zero não for alcançado, deve-se mudar a meta?</b>

Não se deve mudar meta fiscal. Ela é importante até para a formação de expectativas. Tenho conversado com investidores estrangeiros e eles esperam que a meta seja mantida, que o Brasil mantenha as sinalizações de compromisso com o equilíbrio fiscal.

<b>O efeito da manutenção da meta fiscal seria o mesmo decorrente da meta inflacionária?</b>

Sim, porque a manutenção da meta de inflação foi fundamental para a ancoragem das expectativas. Nunca concordei que o aumento meta facilitaria a entrega da inflação do novo objetivo porque os preços iriam convergir para a nova meta.

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