Estadão

Mendonça adia julgamento que pode responsabilizar Estado do Rio por bala perdida

Um pedido de vista (mais tempo para análise) feito pelo ministro André Mendonça nesta segunda-feira, 2, adiou o julgamento que pode responsabilizar o Estado do Rio de Janeiro por balas perdidas durante operações policiais. Antes da suspensão do julgamento, o placar era de dois votos a zero – os ministros Edson Fachin e Rosa Weber defenderam que o governo fluminense é responsável por vítimas de disparos durante operações quando não há conclusão sobre de onde partiu a bala.

O tema era discutido no plenário virtual do STF, em sessão iniciada na sexta-feira, 29. Os ministros discutem um caso específico, o do assassinato de Vanderlei Conceição de Albuquerque em meio a troca de tiros entre traficantes e a Força de Pacificação do Exército. No bojo de tal processo reconhecida repercussão geral, ou seja, será fixada uma tese de julgamento que valerá para processos semelhantes em todo o País.

O assunto chegou à Corte máxima após um recurso dos familiares de Vanderlei contra decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio) que afastou a responsabilidade do Estado pela morte sob o argumento de que não teria restado comprovado que o disparo que alvejou a vítima tenha sido efetivamente realizado por militares.

Para a Sétima Turma Especializada do TRF-2, a perícia foi inconclusiva em relação à origem do disparo do projétil que atingiu Vanderlei e assim não seria viável reconhecer o nexo de causalidade entre a conduta do Estado e a morte – ponto chave para a responsabilização do Estado e o consequente dever de indenizar.

Já o relator do tema no Supremo Tribunal Federal, o ministro Edson Fachin, discordou da Corte regional ressaltando que Vanderlei foi atingido durante uma operação da Força de Pacificação do Exército no Complexo da Maré, sendo que, segundo relatório da Poícia Civil, é evidente que a operação desencadeou a troca de tiros.

"Se a incursão da Força de Pacificação do Exército não tivesse ocorrido, não haveria troca de tiros e, por conseguinte, Vanderlei Conceição de Albuquerque não teria sido assassinado. Assim sendo, independe saber se o projétil proveio da arma dos militares do Exército ou dos confrontados, haja vista que os integrantes da Força de Pacificação do Exército assumiram o risco (dano colateral) ao proceder uma operação em local habitado", explicou.

Para o relator, não é necessário saber que o projétil que atingiu Vanderlei foi disparado da arma dos militares ou dos traficantes, mas sim se houve operação da Força de Pacificação do Exército no momento e no local em que a vítima foi atingida. Segundo o ministro, ao realizar a operação em zona habitada e desencadear intensa troca de tiros , os militares descumprem com o seu dever de diligência, a ensejar a responsabilidade objetiva do Estado .

Fachin seguiu explicando que é possível que a responsabilidade não recaia sobre o Estado, mas este tem de comprovar força maior , caso fortuito , fato exclusivo da vítima ou de terceiro – o que não ocorreu no caso. Além disso, o ministro apontou nítida falha estatal em cumprir o dever de investigar a morte de Vanderlei.

Nessa linha, o relator votou por condenar a União e o Estado do Rio de Janeiro ao pagamento de indenização de R$ 200 mil para cada um dos pais de Vanderlei, além de R$ 100 mil para o irmão da vítima. Além disso, propôs que o poder público ressarça a família pelas despesas com o funeral e ainda pague pensão vitalícia.

Quanto à tese a ser fixada pela Corte máxima, Fachin propôs a seguinte redação: "Sem perícia conclusiva que afaste o nexo, há responsabilidade do Estado pelas causalidades em operações de segurança pública".

O ministro André Mendonça terá 90 dias para analisar o caso. O ministro tem três meses para liberar o processo para novo julgamento, ou então a ação é automaticamente destravada. Depois, caberá ao presidente do STF Luís Roberto Barroso designar uma nova data para que o assunto volte à pauta dos ministros da Corte máxima.

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