As chancelarias de Brasil, Argentina e Paraguai informaram nesta terça-feira, 13, que os integrantes do Mercosul chegaram finalmente a um consenso com o Uruguai sobre o futuro da Venezuela no bloco. A conclusão é que Caracas não cumpriu as normas exigidas pelo protocolo de adesão e terá até 1.º de dezembro fazê-lo. Segundo a nota divulgada pelo Itamaraty, assinada pelo chanceler José Serra, se Caracas não se adaptar será então suspensa do bloco. Até lá, a presidência semestral que corresponderia aos venezuelanos será colegiada.
“A presidência do Mercosul no corrente semestre não passa à Venezuela, mas será exercida por meio da coordenação entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai”, diz o comunicado brasileiro. O texto afirma ainda que os países poderão definir cursos de ação e adotar as decisões em matéria econômico-comercial e em outros temas essenciais para o funcionamento do Mercosul. “O mesmo ocorrerá nas negociações comerciais com terceiros países ou blocos de países.”
O prazo anterior para Caracas adequar-se venceu em 12 de agosto, sem que o país tenha incorporado a sua legislação cerca de 500 pontos relacionados principalmente a temas alfandegários e de respeito aos direitos humanos. Esse descumprimento foi um dos argumentos de Paraguai e Brasil para vetar a chegada da Venezuela presidência semestral do bloco, que correspondia ao governo de Nicolás Maduro pelo critério de ordem alfabética. Outra alegação era que a instabilidade política e econômica poderia prejudicar a negociação de tratados de livre comércio com outros blocos, como o discutido com a União Europeia.
O Uruguai, único a não se manifestar ontem, teria segundo Brasil, Argentina e Paraguai concordado com o novo prazo. Os uruguaios vinham defendendo o direito da Venezuela de assumir o comando do bloco.
A decisão termina com um impasse acentuado pela passagem unilateral da presidência pelos uruguaios aos venezuelanos, em julho. Um trecho comum dos comunicados de Paraguai e Argentina ressalta que a medida foi tomada para avançar em negociações comerciais e que Caracas não cumpriu suas obrigações para a adesão plena ao bloco.
“Essa declaração reflete o consenso alcançado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai para facilitar o funcionamento do Mercosul e coordenar as negociações com outros países e grupos de países, assim como os passos para assegurar o equilíbrio de direitos e obrigações no processo de adesão da Venezuela, sabendo que este país não incorporou normativa essencial do Mercosul em sua legislação nacional”, diz o texto. “Por este motivo, decidiu-se outorgar um prazo complementar a fim de que a Venezuela cumpra as obrigações assumidas no protocolo de adesão ao Mercosul”, conclui.
A nota brasileira é mais extensa e detalha alguns pontos do descumprimento: “Entre os importantes acordos e normas que não foram incorporados ao ordenamento jurídico venezuelano estão o Acordo de Complementação Econômica nº 18 (1991), o Protocolo de Assunção sobre Compromisso com a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos do Mercosul (2005) e o Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul (2002)”, diz o texto.
Segundo um funcionário ligado à presidência paraguaia ouvida pelo Estado, os venezuelanos até poderiam assumir a presidência do bloco se comprovarem antes do novo prazo que seguem as normas que faltam. Mas se não adequarem até dezembro, “a suspensão é o caminho”.
A Venezuela argumenta que há normas incompatíveis com sua Constituição e entre os países fundadores há alguns que desobedecem mais normas. O chanceler paraguaio, Eladio Loizaga, sustenta que Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai estão sujeitos a outro ritmo de cobrança. “É verdade que em relação aos Estados fundadores do Mercosul há normas que ainda não foram incorporadas, mas não há um prazo. Nós não temos prazo. Já para os Estados que entram, quando assinam o convênio de adesão, como é o caso da Venezuela, conforme a Resolução 28 de 2005, se estabelece um prazo de 4 anos, desde a vigência de seu Protocolo de Adesão”, alegou o paraguaio no mês passado.
Assunção congelou suas relações diplomáticas com Caracas ao retirar no início de agosto seu embaixador no país e não estabelecer prazo para volta. O mesmo ocorreu entre Venezuela e Brasil, depois de Maduro remover sua representação diplomática em solidariedade à ex-presidente Dilma Rousseff, por não concordar com o processo de impeachment brasileiro. Analistas consideram que a definição do quadro político brasileiro era essencial para que o Itamaraty pudesse colocar com mais força sua posição diante dos outros integrantes do bloco. (Rodrigo Cavalheiro)