Vindo de duas leves perdas na abertura do mês, o Ibovespa ensaiou, até perto do fim da tarde desta quinta-feira, 3, um dia de recuperação moderada após o Comitê de Política Monetária (Copom) ter surpreendido, na noite de quarta, parte do mercado ao iniciar o ciclo de cortes da Selic com um ajuste de meio ponto porcentual, e não de 0,25 ponto. A correção mais visível nos ativos brasileiros nesta quinta-feira ocorreu na ponta curta da curva de juros, com a decisão de Minerva do presidente do BC, Roberto Campos Neto, em favor dos diretores que optaram por um corte inicial mais agressivo da taxa de juros de referência – e sinalizando outra redução de meio ponto logo à frente, no próximo Copom.
Em direção ao fechamento, contudo, o Ibovespa devolveu os leves ganhos vistos mais cedo e se firmou no negativo até o fim da sessão, em baixa de 0,23%, aos 120.585,77 pontos, com mínima intradia a 120.365,38 pontos, estabelecida no fim da tarde. Na abertura, marcava nesta quinta 120.859,46 pontos e, no melhor momento, chegou aos 122.619,14 pontos.
O giro financeiro subiu a R$ 27,2 bilhões nesta quinta-feira. Na semana, o Ibovespa ainda avança 0,33%, mas em agosto, com perdas acumuladas nas três primeiras sessões do mês, recua 1,11%, moderando o ganho do ano a 9,89%.
Na B3, as ações de grandes bancos, que mais cedo operavam sem sinal único, firmaram-se no campo negativo perto do fim do dia, em variações mais visíveis do que as observadas até o meio da tarde. E mesmo com a redução da Selic, as ações expostas a demanda e preços formados no exterior, como as de commodities, andaram à frente dos papéis com exposição ao ciclo doméstico, como os de consumo – por sinal, o ICON fechou o dia em baixa de 1,05%, enquanto o índice de materiais básicos (IMAT) subiu 1,01%.
Apesar da alta superior a 2% para os preços do petróleo na sessão, Petrobras (ON +1,42%, PN +1,28%) e Vale (ON +0,63%) apararam ganhos do meio para o fim da etapa vespertina, incapazes de carregar o índice da B3 em tarde bem negativa para as ações do setor financeiro, as de maior peso conjunto sobre o Ibovespa. Na ponta da carteira, Dexco (+5,27%), Prio (+4,22%), Suzano (+3,65%), Minerva (+2,93%) e Cyrela (+2,78%). No lado oposto, Via (-8,65%), Méliuz (-6,24%), Alpargatas (-5,26%), Eletrobras (ON -5,15%, PNB -4,89%) e Magazine Luiza (-5,11%).
Para os bancos, o dia chegou a se mostrar tão dividido quanto a decisão do Copom, mas o sinal que predominou no fechamento foi o negativo, com perdas que chegaram a 1,01% (Bradesco ON) – exceção, entre as maiores instituições, para Banco do Brasil (ON +0,17%). "As ações de bancos não foram bem na sessão com a ambivalência na curva de juros – os juros mais curtos caindo e os mais longos subindo", depois do Copom da noite anterior, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research.
"Parte do mercado esperava corte de meio ponto, passando de 13,75% para 13,25% ao ano já nesta reunião, mas esperávamos aqui uma queda menor, de 0,25 ponto, embora a gente reconhecesse a possibilidade, não irrelevante, de um ajuste maior. O placar chamou atenção: 5 a 4 pelo corte de meio ponto, com Campos Neto defendendo a queda maior", diz Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos.
Ao se avaliar a mudança neste Copom em relação ao balanço de riscos, com ênfase maior em fatores externos do que domésticos, o colegiado pareceu ter imprimido tom <i>"dovish"</i>, flexível, ao comunicado da noite de quarta-feira, aponta Rachel. "Mas houve também alguns recados <i> hawkish </i>: não é porque começaram com corte relevante que se deve concluir que haverá aceleração de ritmo na redução da Selic. Houve tentativa de dar também um recado mais firme em relação à inflação", acrescenta.
Após a relativa surpresa com a pequena margem na decisão de quarta-feira, em que Campos Neto deixou a companhia da ala da diretoria vista como mais ortodoxa (Fernanda Guardado e Diogo Guillen) em direção aos recém-chegados Gabriel Galípolo e Ailton Aquino, considerados mais alinhados ao governo, o ritmo de redução de juros é questão em aberto, que deve continuar a dividir as apostas do mercado.
"Antecipamos nova redução de 50 pontos-base nas próximas duas reuniões, com o Copom acelerando o ritmo de cortes para 75 pontos-base em dezembro, e a Selic encerrando 2023 em 11,5%, e 2024 em 9,0%", diz em nota Marcelo Fonseca, economista-chefe da Reag Investimentos. Ele considera que a decisão da noite de quarta foi "compatível com a magnitude total do afrouxamento na política monetária que deveremos ter nos próximos meses."
De qualquer forma, com o corte mais agressivo promovido pelo Copom, as ações brasileiras chegaram a se descolar, em boa parte da sessão, da cautela externa que ainda prevaleceu nesta quinta-feira. "Ciclos de afrouxamento monetário costumam ser muito proveitosos para ativos de risco", diz Matheus Spiess, da Empiricus Research.
No exterior, embora em grau bem menor do que o de quarta, quando os mercados reagiram mal ao rebaixamento da nota de crédito dos EUA pela Fitch, o sinal ainda foi majoritariamente negativo nesta quinta-feira para as principais bolsas. Na Europa, fecharam o dia em queda, em pregão marcado pelos dados fracos de atividade do setor de serviços e com cautela após o Banco da Inglaterra elevar o juro básico do Reino Unido em 25 pontos-base, para 5,25% ao ano.
Em Nova York, o dia foi de leves variações, sem sinal único ao longo do dia para as três referências, mas levemente negativo ao final (Dow Jones -0,19%, S&P 500 -0,25%, Nasdaq -0,10%). O CEO da Berkshire Hathaway, Warren Buffett, afirmou nesta quinta não estar preocupado com o rebaixamento do rating dos Estados Unidos pela Fitch, dizendo que sua empresa continua a comprar US$ 10 bilhões em títulos do Tesouro americano a cada semana.
Por sua vez, o Instituto de Finanças Internacionais (IIF) avalia que o choque de inflação nos Estados Unidos já acabou, o que abre espaço para que o Federal Reserve (Fed) corte juros em ritmo mais rápido do que o precificado pelo mercado. "No mínimo, achamos que é hora de o Fed encerrar seu ciclo de alta", afirma, em relatório.