Pelo menos 40 pessoas foram mortas em Mianmar no sábado em um dos piores dias da repressão do governo aos protestos contra o golpe militar de 1.º de fevereiro. De acordo com a Associação de Assistência a Prisioneiros Políticos (AAPP), 22 pessoas foram mortas em Hlaingthaya, um subúrbio industrial da cidade de Yangon, a maior do país, e 16 em outras regiões do município onde eram registradas manifestações. Uma morte ocorreu em Hpakant e outra em Mandalay. Há dezenas de feridos e o total de óbitos pode aumentar.
A <i>TV Myawadday</i>, administrada pelo Exército, disse que as forças de segurança agiram em Hlaingthaya depois que quatro fábricas de roupas e uma de fertilizantes foram incendiadas e cerca de 2 mil pessoas impediram que os carros de bombeiros chegassem até os prédios. Um porta-voz da junta militar que governa o país não quis comentar as ações do sábado.
Segundo a AAPP, desde o início dos protestos, 126 pessoas já morreram. O governo não divulga nenhuma informação sobre mortos em manifestações.
Também houve relatos de ferimentos causados por balas de borracha e tiros em outras regiões de Yangon, incluindo o distrito de Insein. Cenas semelhantes de caos ocorreram ao longo do dia em outras partes do país – com uma pessoa morta a tiros na cidade de Hpakant ao norte e uma mulher morta após ser baleada na cabeça em Mandalay.
A forte repressão veio um dia depois que o vice-presidente em exercício do Comitê de Representação Pyidaungsu Hluttaw – um parlamento paralelo formado por políticos eleitos, mas que foram cassados – pediu que o povo continuasse protestando contra a "ditadura injusta" dos militares. "Este é o momento mais escuro da nação e a luz antes do amanhecer se aproxima", disse Mahn Win Khaing Than, em um vídeo gravado e postado na página do Facebook noite de sábado. "Jamais desistiremos. Nossa missão deve ser cumprida."
Mianmar convive com protestos diários desde que os militares tiraram do poder o líder civil Aung San Suu Kyi. A junta militar que governa o país hoje justifica o golpe alegando fraude eleitoral generalizada nas eleições de novembro, na qual o partido Liga Nacional para a Democracia, de Suu Kyi, obteve uma vitória esmagadora sobre o partido dos militares.
Suu Kyi, vencedora do Nobel da Paz em 1991, está detida desde o golpe e deve retornar ao tribunal hoje. Ela enfrenta pelo menos quatro acusações, incluindo o uso ilegal de rádios walkie-talkie e violação de protocolos de coronavírus.
<b>Comunicado da embaixada da China é alvo de protesto virtual</b>
As fábricas incendiadas no sábado eram financiadas pela China. A embaixada chinesa no país descreveu a situação como "muito grave", mas não fez comentáros sobre as mortes.
"A China insta Mianmar a tomar mais medidas eficazes para impedir todos os atos de violência, punir os perpetradores de acordo com a lei e garantir a segurança da vida e da propriedade de empresas e funcionários chineses em Mianmar", disse o comunicado da embaixada. A página do órgão no Facebook foi bombardeada com comentários negativos sobre a nota.
Christine Schraner Burgener, enviada especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para Mianmar, condenou o que chamou de "brutalidade contínua". Ela disse ter "ouvido pessoalmente de contatos em Mianmar relatos dolorosos de assassinatos, maus-tratos a manifestantes e tortura de prisioneiros neste fim de semana".
O Reino Unido, ex-governante colonial de Mianmar, disse estar chocado com o uso de força letal pelas forças de segurança contra inocentes. "Pedimos o fim imediato dessa violência e que o regime militar devolva o poder aos democraticamente eleitos pelo povo de Mianmar", disse o embaixador britânico Dan Chugg. COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS