O Ministério da Saúde passou a exigir dados adicionais para o preenchimento de óbitos pelo coronavírus no Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe). A informação foi anunciada na tarde desta quarta-feira, 24, pelo governo de São Paulo, segundo o qual a alteração foi feita sem aviso prévio e pode causar nos próximos dias um "represamento de dados" sobre a pandemia.
De acordo com o secretário estadual de Saúde Jean Gorinchteyn, o SIVEP-Gripe passou a exigir dados como número de CPF, cartão de vacinação do SUS, declaração de estrangeiro e a confirmação ou não se o paciente já havia se imunizado contra o coronavírus. "Burocratizar sem avisar fez com que não tivéssemos aportado por grande parte dos municípios do País o número de óbitos", afirmou.
O reflexo já pode ser sentido nos dados de São Paulo, que registrou apenas 281 óbitos nas últimas 24 horas, uma queda de 24,3% em relação ao dia anterior. Na véspera, o Estado já havia batido o seu recorde com 1.021 mortes pelo coronavírus, o que representou quase um terço do total do País, que ultrapassou pela primeira vez a marca das 3 mil vidas perdidas para a doença.
"Os municípios não foram devidamente informados, não se deixou prazo para que eles possam se habilitar nessa mudança e os municípios não conseguiram completar o preenchimento desses campos", alertou Gorinchteyn durante a coletiva desta terça. "Os campos que foram inseridos retardam o aporte dessa informação e muitos deles não têm importância nesse momento. Isso passa a ter um impacto."
O Conselho Nacional das Secretarias Municipais (Conasems) afirma que a nova forma de registrar estes óbitos já estava em discussão, por causa da "necessidade de aprimoramento nas informações coletadas", mas que houve falha na comunicação sobre a mudança. Como a medida pegou gestores de surpresa, o conselho pediu a retirada dos novos campos "por enquanto".
"O que ocorreu foi uma falta de comunicação adequada no momento em que foi colocada a funcionalidade em produção no referido sistema e por este motivo solicitamos a retirada desses campos como obrigatórios por enquanto", afirma a nota. Segundo o conselho de secretários, o campo do CPF já existia na plataforma utilizada pelos gestores, mas não era obrigatório.
Para Marcelo Gomes, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e coordenador da plataforma InfoGripe, a inclusão dos campos é boa, mas foi adotada em um momento errado. "São coisas que facilitam as análises dos dados, mas nesse momento é uma mudança de roda com o carro em alta velocidade", disse ao Estadão.
"Ter CPF ou CNS facilita limpeza de duplicidades, identificação de suspeita de reinfecção, e cruzamento com outros bancos de dados", afirmou Gomes. Segundo o pesquisador, o problema é que o preenchimento destes campos exige que o paciente tenha o número do CPF em mãos. "Caso contrário, o agente de saúde tem que pesquisar o CNS da pessoa ou fazer um novo cadastro", completou.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Saúde ainda não informou o que motivou a mudança nos protocolos de preenchimento para mortes pela covid-19 e nem a totalidade dos novos campos exigidos.