O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi definido nesta segunda-feira, 21, o relator de um habeas corpus movido por um grupo de renomados advogados criminalistas que poderá levar à soltura de criminosos condenados e presos no País desde o início do ano. Nos bastidores do STF, a ação tem sido chamada de "habeas corpus da discórdia".
Moraes é um dos quatro ministros que já comunicaram à presidência do STF que vão seguir despachando durante o recesso, conforme informou o <b>Estadão</b> no último domingo. O ministro está trabalhando normalmente e pretende analisar o caso assim que o processo chegar ao seu gabinete.
O caso foi distribuído automaticamente a Moraes "por prevenção" – no jargão jurídico, significa que não foi feita uma distribuição livre entre todos os integrantes da Corte. Isso porque Moraes já é relator de uma outra ação, da Defensoria Pública do Estado do Rio, que trata do mesmo pano de fundo.
Em uma ofensiva contra o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, os advogados criminalistas querem derrubar a liminar do magistrado que suspendeu por tempo indeterminado a implementação do juiz de garantias. A revogação da decisão abriria brecha para a anulação de condenações.
Segundo o <b>Estadão</b> apurou, interlocutores de Fux esperam que Moraes não conceda a liminar, já que não caberia habeas corpus contra uma liminar proferida por um ministro do STF.
A criação do juiz de garantias prevê a divisão entre dois magistrados da análise de processos criminais. O modelo foi aprovado no ano passado pelo Congresso, junto com o pacote anticrime, e sancionado em 25 de dezembro pelo presidente Jair Bolsonaro, mas sua aplicação foi suspensa por Fux, em janeiro. O ministro entendeu que a medida tinha sido feita sob medida para depreciar o juiz da causa. Na sua avaliação, mudanças na estrutura do Judiciário somente devem ser feitas pelo próprio Poder.
Advogados dizem agora que a liminar de Fux é irregular e pedem habeas corpus em favor de todas as pessoas submetidas a investigações e processos criminais e de todos os presos em flagrante, cuja audiência de custódia não tenha sido realizada em 24 horas. Nos bastidores, a ofensiva dos advogados é atribuída a um movimento do ministro do STF Gilmar Mendes, que tenta dar o troco em Fux por ele ter votado contra a reeleição dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Gilmar era o relator da ação.
Na prática, o "habeas corpus da discórdia" – apresentado pelo Instituto de Garantias Penais (IGP), que reúne os advogados autores da medida judicial – foi visto por interlocutores de Fux como uma manobra de criminalistas para anular ações penais de políticos atingidos pela Lava Jato. Segundo o Estadão apurou, um dos temores do presidente do STF é o de que a eventual concessão de liminar tenha efeito retroativo, beneficiando condenados a partir de 23 de janeiro deste ano, quando a medida estava prevista para entrar em vigor.
O criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, um dos nomes do IGP que assinam o habeas corpus coletivo, negou que o pedido vá colocar criminosos na rua. "Isso é um desconhecimento impressionante sobre o que se trata. Apenas o Estado vai implementar uma forma de agir, que existe em quase todo o mundo. Não vai ninguém ser solto. Ninguém vai ser beneficiado", disse Kakay.
Para Davi Tangerino, professor de Direito Penal na FGV Direito São Paulo, a apresentação do habeas corpus serve como instrumento para pressionar Fux a levar para análise do plenário as ações sobre o juiz de garantias. "Em princípio, não cabe habeas corpus contra liminar de ministro do Supremo. Logo, esse processo tem mais esse obstáculo a ser superado. Independentemente da decisão, a impetração em si é uma pressão para que seja pautado no plenário o juiz de garantias. Isso está super claro", afirmou Tangerino. "Se for dada a liminar suspendendo a decisão de Fux, a soltura (de presos) poderia ser uma das consequências."