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Morre Ellsworth Kelly, o último individualista da arte americana

A morte do pintor Ellsworth Kelly, aos 92 anos, no domingo, 27, em sua casa em Spencertown, Nova York, representa para o mundo da cultura o desaparecimento do último grande individualista da arte norte-americana. Conhecido por suas telas de formato irregular e cores brilhantes, Kelly já foi classificado entre minimalistas e associado à pintura hard edge, mas sempre rejeitou tal filiação.

A poética de Kelly, marcadamente pessoal, tem certa proximidade com os citados movimentos, além de incorporar elementos do color field, que, entre os anos 1940 e 1950, buscou uma síntese entre o modernismo europeu e o expressionismo abstrato americano, vigente nos anos 1950 – Kelly retornou aos EUA justamente em 1954, incentivado pela leitura de uma crítica positiva a uma exposição de Ad Reinhardt, com o qual dividia certa afinidade, sentindo que sua pintura se relacionava com a dele.

No entanto, a afinidade com a obra de Reinhardt ou Kenneth Noland não permite a classificação de Kelly nem como um expressionista abstrato nem como pintor minimalista. Vale lembrar que a relação de Ellsworth Kelly com as cores passa por uma experiência pessoal que associa variações cromáticas a manifestações da natureza. Solitário, o artista passou a infância e a adolescência observando pássaros por influência da avó paterna, que o introduziu no mundo da ornitologia quando o garoto tinha apenas 8 anos.

A crítica norte-americana já apontou, por exemplo, a relação entre pinturas como Three Panels: Red, Yellow, Blue, de 1963, e os passarinhos com penas de três cores que ele via quando criança. Em outros casos, de pinturas marcadas por uma escala tonal ambígua, há quem lembre da experiência militar de Kelly na última guerra mundial, quando serviu numa unidade especializada em camuflagem (chamada Exército Fantasma, que atuou na Europa entre 1943 e o fim do conflito).

Devem ter sido, com certeza, experiências marcantes, mas o diálogo com artistas como Agnes Martin, Jasper Johns e Barnett Newman, seus vizinhos de ateliê em Nova York, foram certamente decisivos pelo modo espartano com que esses amigos encaravam a arte. Atuante em plena ebulição do expressionismo abstrato americano, nos anos 1950, Kelly logo concluiu que esse não seria o seu caminho. Não queria produzir uma arte tão subjetiva e tinha aversão ao culto à personalidade.

Depressivo, Kelly viveu em Paris e, inicialmente, foi marcado pela arte romanesca e bizantina, sendo atraído também pelo surrealismo e o neoplasticismo de Mondrian. Em certo sentido, o sentido de organização formal de suas telas é mondrianesco e a ordem cromática incorpora as cores vivas de Matisse, a quem adorava – ele foi curador de uma exposição de desenhos do pintor francês em Massachusetts, no ano passado. Os anos de peregrinação de Kelly por territórios europeus são também os da formação de seu olhar como pintor, ao visitar os ateliês de Brancusi, Giacometti e Vantongerloo.

Nos anos 1960 apareceram suas primeiras telas de formato irregular, rompendo com o suporte retangular. Ao explorar a percepção de um outro olhar para a paisagem urbana, foi levado a criar novos padrões, deixando de lado a representação para fazer da tela o próprio objeto da pintura. Casado com o fotógrafo Jack Shear, que dirige a fundação com o nome de Ellsworth Kelly, o pintor, nascido em 31 de maio de 1923, em Newburgh, viveu 31 anos com o companheiro em Spencertown. Suas telas alcançaram US$ 5 milhões em leilões recentes. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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