Da catedral de Lausanne, iluminada por luzes cor de rosa até as estátuas violetas de Neuchâtel, as mulheres suíças lançaram nesta sexta-feira, 14, um dia de mobilização para exigir pagamento igual ao dos homens, denunciar a violência de gênero e defender o reconhecimento das tarefas domésticas.
Assobiando e batendo panelas e frigideiras, centenas de manifestantes – a maioria mulheres, mas também homens – carregavam cartazes dizendo “não significa não”, “eu não sou uma princesa, mas a mulher que escolho ser”, e “não me liberte, eu vou fazer isso sozinha”.
Quase 30 anos depois da última grande greve nacional por igualdade salarial na Suíça, as organizadoras pediram que as mulheres aderissem a essa nova greve, embora o alcance da mobilização seja desconhecido, já que as paralisações no trabalho são muito incomuns no país.
Em Berna, os deputados interromperam simbolicamente seus debates por 15 minutos. Muitos parlamentares usavam broches feministas ou roupas violetas, como a ministra da Defesa, Viola Amherd.
A mobilização começou em Lausanne na noite de quinta, onde várias mulheres tocaram os sinos da catedral, iluminada em rosa. Cerca de 500 pessoas bloquearam as principais pontes da cidade e organizaram café da manhã coletivo.
Em Zurique, a maior cidade e capital financeira do país, um grupo de mulheres passeava em um carro adornado com um clitóris gigante. Manifestantes marcharam pela cidade com placas com os dizeres “Homens, passem roupa”.
Mais tempo, dinheiro e respeito
Em algumas regiões, as creches foram fechadas e escolas operavam com serviços mínimos. Com o slogan “mais tempo, mais dinheiro e respeito”, a manifestação, considerada “ilegal” pelo sindicato dos empregadores, acontece quase três décadas depois do 14 de junho de 1991, quando meio milhão de mulheres foram às ruas denunciar as desigualdades entre os sexos.
Esses protestos resultaram na lei da igualdade no trabalho, que entrou em vigor em 1996. Além disso, nos anos 2000 a igualdade entre os sexos foi introduzida na Constituição suíça, mas as mulheres denunciaram a ausência de medidas concretas para acabar com a desigualdade salarial.
Seguindo os passos do #Metoo, a nova geração de mulheres continua a luta iniciada 28 anos atrás para alcançar a igualdade salarial, o que está longe de ser uma realidade.
“Percebemos que, mesmo após a primeira greve em 1991, as coisas não mudaram muito. A igualdade está consagrada na Constituição, mas a igualdade real, material e efetiva não existe para todas as mulheres”, disse Tamara Knezevic, de 24 anos, uma das organizadoras da greve.
“Temos tantas demandas e tantas razões para criar essa grande frente de protesto das mulheres, porque todas essas leis, tudo o que obtivemos, de fato não se tornaram vitórias concretas.”
Em média, as mulheres ainda ganham 20% menos que os homens na Suíça – em 1991, essa diferença era de aproximadamente 30%. E a diferença salarial entre homens e mulheres com a mesma qualificação é de quase 8%, de acordo com o escritório nacional de estatísticas.
“A equidade salarial não foi alcançada. Essa é uma boa razão para fazermos greve”, disse Ruth Dreyfuss, a primeira mulher a assumir a presidência suíça em 1998 na rádio suíça RTS.
Apesar de sua alta qualidade de vida, a Suíça está atrasada em relação a outras economias desenvolvidas em salários femininos e igualdade de gênero no local de trabalho.
Um estudo anual do Fórum Econômico Mundial apontou estagnação no progresso global de igualdade de gênero. Na edição de 2018 dessa avaliação, a Suíça ficou em 20ª posição no ranking geral, mas foi apenas a 34ª ao se considerar “participação econômica e oportunidade” e 44ª no quesito igualdade salarial – foram avaliados 149 países.
Greve às 15h24
As mulheres que não poderiam ficar o dia todo sem trabalhar foram convidadas pela organização da greve a encerrarem suas atividades às 15h24 desta sexta, momento a partir do qual elas trabalhariam de graça ao se considerar a diferença salarial média de 20% em relação aos homens.
Em 1991, uma em cada sete mulher se mobilizou, um número excepcional em um país onde as greves são muito raras desde o estabelecimento em 1937 da “paz do trabalho”, uma convenção assinada por empregadores e sindicatos que exclui a possibilidade de recorrer à greve em detrimento de negociações.
Nas últimas três décadas, os defensores dos direitos das mulheres conseguiram algumas vitórias na Suíça, como a legalização do aborto em 2002 e a introdução da licença-maternidade paga de 14 semanas em 2005.
Mas no país ainda não há licença-paternidade e o acesso limitado aos caros serviços de creches é considerado um importante obstáculo à plena participação das mulheres no mercado de trabalho. (Com agências internacionais)