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Narrativa do PT de 4º mandato tenta frear candidaturas de aliados

Depois de voltar ao poder em uma disputa presidencial marcada pelo "duelo de rejeições", o PT completou 43 anos nesta sexta-feira, 10, já defendendo abertamente uma candidatura à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2026. Durante a campanha eleitoral, Lula disse que pretendia exercer apenas um mandato, numa estratégia para atrair novas alianças no segundo turno contra Jair Bolsonaro (PL). Porém, com um mês de governo, o discurso mudou.

A narrativa do "Lula 4"?, segundo petistas próximos ao Palácio do Planalto, passou a ser difundida com dois objetivos: debelar uma disputa fratricida precoce na legenda e frear a projeção de três aliados da "frente ampla" como presidenciáveis. São eles o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), e as ministras do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede), e do Planejamento, Simone Tebet (MDB).

Ao admitir a hipótese da reeleição em entrevista à RedeTV!, e logo em seguida escalar com mais intensidade os ataques à política de juros do Banco Central, Lula escancarou ao mesmo tempo a dependência total do PT em relação ao seu nome e da polarização – atualmente focada no antibolsonarismo – como sua principal sustentação política.

<b>Ruas</b>

"(A candidatura) Lula 4 é uma questão pacificada e natural no partido", disse ao <i>Estadão</i> o advogado Marco Aurélio Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas e interlocutor próximo do presidente. "Seria hipocrisia dizer o contrário."

Integrante da executiva nacional do PT e ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira (SP) segue na mesma linha. Para ele, "Lula é quem unifica todo o partido".

Carvalho admitiu, no entanto, que o PT "envelheceu e precisa projetar lideranças jovens". Para o senador Humberto Costa (PT-PE), a legenda também necessita "se reconectar com as ruas e os movimentos sociais".

Analistas ouvidos pelo <i>Estadão</i> apontam um desafio do partido do atual presidente: fidelizar o setor da classe média que votou em Lula em 2022. A conquista do quinto mandato petista no Palácio do Planalto só foi possível porque a campanha de Lula atraiu eleitores que rejeitavam Bolsonaro. Ciente de que precisa desse eleitorado, o PT adotou como bandeiras o "combate ao fascismo" e a "defesa da democracia", mas a insistência na manutenção da estratégia do "nós contra eles" projeta-se como um obstáculo para manter esses votos.

Outro ponto é que a sigla ajustou o discurso à esquerda. Reforçou a agenda identitária e busca se reaproximar de suas bases históricas nos movimentos sociais. Mesmo assim, há vários integrantes da legenda que se preocupam com os destinos do partido.

Para o historiador Lincoln Secco, professor da USP e autor de História do PT – 1978- 2010 (2011), a volta da legenda ao poder central do País após diversos escândalos de corrupção tem conexão com a própria história do País. Desde o fim do Estado Novo, afirmou, se configurou o que chama de "campo popular", em torno de reivindicações sociais.

"Durante a ditadura, isso (o campo popular) foi abalado", disse. "Mas, com a redemocratização, se reconfigurou em torno do PT. Então, esse campo não desaparece de uma hora para outra. É um campo popular que continua firme, porque há interesses materiais."

<b>Desafios</b>

O PT, lembrou Secco, nasceu como um partido do proletariado industrial, mas hoje governa um país que foi em grande medida desindustrializado. Há desafios como os evangélicos e os trabalhadores de aplicativos. Para Secco, no "quinto mandato presidencial do PT, a situação é completamente diferente em vários aspectos".

"(2022) Foi a eleição mais apertada da história do Brasil. O PT fez uma frente ampla e trouxe de volta parte da classe média. O problema para o PT são as próximas eleições: como vai governar. A classe média no Brasil é muito forte. O que o PT tem a oferecer para a classe média?", questionou Secco, que acompanha a trajetória do partido.

Um dos fundadores do PT, o cientista político José Álvaro Moisés foi um dos redatores do primeiro manifesto da legenda. Saiu do partido em 1995 ao discordar da iniciativa da bancada na Constituinte de votar contra o texto final da Constituição. Também considerou que a legenda, quando ocorreu a queda do Muro de Berlim, em 1989, "perdeu a oportunidade de se apresentar como um crítico do socialismo real, e como uma nova esquerda democrática".

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"O PT é um dos únicos partidos de massas do Brasil", afirmou. "O partido sofreu algumas derrotas importantes, teve os seus principais líderes presos por causa da questão da corrupção, mas soube se recuperar mantendo a imagem de que é o único grande ator que tem compromisso com a questão social."

Outro ex-petista, o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ) avaliou que o PT, "como muitos partidos de esquerda do mundo", passou por "um processo de adaptação à realidade e de perda de princípios ético-políticos".

Para ele, o petismo não escapou à formação de um "círculo de ferro de oligarquias operárias", comum na esquerda e descrita pelo sociólogo alemão Robert Michels. Esses processos, disse o parlamentar, cria cúpulas muito poderosas que se contrapõem ao movimento das massas trabalhadoras.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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