Quando conversou com o repórter, Arlete Salles Lopes estava triste. Arlete quem? Salles. Havia morrido sua cachorrinha. “Era um animalzinho de abrigo, que minha veterinária pediu que eu tomasse conta por um período. Ela se recuperou e eu disse – Daqui (da minha casa) não sai mais. Eu tenho minhas carências, ela tinha as dela. Nos completamos. Era muito doce, aqueles olhinhos. É impressionante como um animalzinho tão pequeno enchia tanto a casa. Estou achando tudo muito vazio.”
Mas chega – a entrevista é para falar do retorno de Tieta, no canal Viva, a partir desta segunda, 1.º, às 15h30. A novela que fez história por volta de 1990, há quase 30 anos – foi ao ar entre 14 de agosto de 1989 e 31 de março do ano seguinte -, ganha reapresentação e, olhem só, no Globo Play estreia, também nesta semana, o trabalho mais recente de Arlete Salles, Brasil a Bordo, uma criação de seu amigo Miguel Fallabela. “Esse cara é gênio. O que ele propõe eu faço de olhos fechados.”
Brasil é sobre a dona de uma empresa de aviação que administra mal seu negócio e vai perdendo os aviões e fica só com um, com o qual viaja o Brasil afora. “Qualquer semelhança é mera coincidência, né?”, e Arlete solta aquele riso que você conhece.
Ela também guarda belas recordações de Carmosina, sua personagem em Tieta, que Aguinaldo Silva adaptou do romance de Jorge Amado. “No romance, a Carmosina merece só uma breve referência, mas na novela ganhou importância porque era a senhora de todos os segredos de Santana do Agreste. Desde criança eu ouvia falar que se pode abrir carta no bafo da chaleira e era o que Carmosina, funcionária dos Correios, fazia. Uma coisa incorreta, né? Hoje em dia o Sérgio Moro (o Juiz da Lava Jato) me enquadrava, meu Deus…” E ela ri, de novo.
Colega de Tieta na escola, Carmosina, embora saiba tudo, de todos, é um túmulo quando necessário, e uma faladeira compulsiva quando se faz mister. É excelente cozinheira, dona de cultura acima da média, grande caráter, por vezes sujeita a duras provações. Perdeu para Perpétua, irmã de Tieta, o páreo da solteirice. E nutre uma paixão que mantém secreta.
Todas essas informações encontram-se no Globo Memória, se você vai pesquisar sobre a personagem. Tieta, a novela, tinha aquele elenco – Betty Faria, Joana Fomm, o hoje maldito José Mayer, Cássio Gabus Mendes, Yoná Magalhães, Reginaldo Faria, Lídia Brondi, Ary Fontoura, Paulo Betti etc. “Todo mundo fazia sotaque nordestino e eu, como pernambucana, nem precisava fazer esforço. Me saía ao natural.”
Tudo em Carmosina era natural para ela.” Era terna, encantadora. Sabe quando a roupa veste bem? A Carmosina foi assim. Doce, singela. Vesti como uma luva.” Pernambucana de Paudalho, cabe a pergunta -, Arlete tem saudades de lá? “Xiii, vão me matar, mas estou há tanto tempo no Rio, aqui tem praia, tudo. Não nego minha origem, mas me aclimatei muito bem.” Não, ela não viu o filme de Cacá Diegues com Sonia Braga. “A novela tinha quase 200 capítulos e o filme condensa aquele livro imenso (em 2h20). Confesso que fiquei desmotivada.” O assunto cinema é motivo de lamentação. “Fiz muita novelas, muito teatro, mas pouquíssimo cinema. E não foi por vontade minha. O cinema nunca gostou muito de mim.”
Mesmo assim, cita Polaróides Urbanas, que o amigo Fallabela adaptou de seu espetáculo teatral Como Encher um Biquíni Selvagem, em que fazia Lise Delamare. “É como no Brasil a Bordo. O Miguel veio de um universo que as pessoas chamam de besteirol, mas o besteirol dele é só um disfarce para tratar de coisas mais sérias e graves. E tudo o que Miguel faz tem uma marca de elegância. Gosto muito.”
E como é essa coisa de criar uma personagem que fica no ar tanto tempo – seis meses ou mais? “A personagem da novela evolui segundo a trama ou o gosto do público. Carregá-la durante tanto tempo não é problema. No teatro, a gente já faz isso, mas a energia é diferente, não é mera repetição. Toda noite tem aquela troca com o público, e a energia muda porque o público também muda. O espetáculo nunca se repete.”
Brasil a Bordo já deveria ter estreado há um ano, mas a Globo segurou, por causa da tragédia da Chapecoense. “Aquilo foi uma tristeza e ia pegar mal, seria um desrespeito um programa que faz humor em cima de uma companhia aérea bagunçada. A dor permanece, mas agora que o futebol deles voltou acho que o Brasil a Bordo pode reivindicar seu espaço.
Tem sido uma política da Globo. Libera primeiro no Globo Play, na internet, os capítulos ou episódios que depois vai mostrar no aberto.” A vida segue e a partir desta semana o público do Brasil a Bordo vai descobrir a Piorá Linhas Aéreas, cujo slogan é Prefere ir de ônibus? Com Arlete Salles, estão no elenco Marcos Caruso, Luís Gustavo, Maria Eduarda de Carvalho, Magno Bandarz, Maria Vieira e Rafael Canedo – além do próprio Fallabela, claro.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.