Dois dias depois que o ex-primeiro-ministro do Japão Shinzo Abe foi morto a tiros em um comício político na sexta-feira, seu Partido Liberal Democrata (PLD) e seus aliados venceram uma eleição parlamentar que deu a eles a chance de perseguir a ambição do líder de reformar a Constituição pacifista do país.
Foi o sinal mais claro de que Abe, o primeiro-ministro mais longevo do Japão, permaneceu uma força política definidora. Mesmo antes de sua morte, apesar de ele não ser mais chefe de governo ou do partido no poder, seu legado havia moldado as escolhas dos eleitores nas urnas e a visão de seus aliados para o futuro.
"Tenho a responsabilidade de assumir as ideias do ex-primeiro-ministro Abe", disse o atual primeiro-ministro, Fumio Kishida, a uma multidão a oeste de Tóquio, no sábado, um dia após o assassinato de Abe. O ex-premiê foi morto enquanto fazia campanha pelos candidatos de seu partido para a Câmara Alta do Parlamento.
O PLD, que governa o país e ao qual Abe pertencia, e seu aliado, o partido Komeito, ganharam cadeiras suficientes na eleição de ontem para formar uma supermaioria crucial de dois terços.
Eles agora podem aprovar emendas à Constituição, imposta pelos ocupantes americanos após a derrota do Japão na 2.ª Guerra. O antigo desejo de reformar a Carta abriria as portas para que o Japão se tornasse uma potência militar, ampliando sua liderança global.
Mas com a inflação aumentando, o enfraquecimento do iene e as infecções por coronavírus novamente em alta, discutir a mudança da Constituição pode ser algo difícil no momento.
Nas primeiras horas desta segunda-feira, 11 (domingo, 10, no Brasil), os liberais democratas, juntamente com o Komeito e outros partidos aliados, conquistaram 87 assentos, dando a eles mais de 70% da Câmara Alta, superando sua última supermaioria em 2016, quando a coalizão conquistou mais de dois terços da Câmara Baixa.
A morte de Abe parece ter ajudado a aumentar um pouco a participação dos eleitores, para 52%, acima dos cerca de 49% na última eleição da Câmara Alta em 2019.
O assassinato do ex-premiê na sexta-feira, 8, na cidade de Nara ofuscou a votação, mas Kishida insistiu que o choque provocado pelo ataque a tiros não interromperia o processo democrático.
<b>Grande choque</b>
O corpo de Abe chegou a Tóquio no sábado, 9, procedente da região oeste do país, onde ele foi baleado.
O assassinato provocou um grande choque no país e na comunidade internacional, que expressou condolências e condenações ao crime, incluindo países com os quais Abe teve relações tensas, como China e Coreia do Sul.
O homem acusado pelo assassinato, Tetsuya Yamagami, de 41 anos, foi detido e afirmou aos investigadores que atacou Abe porque acreditava que o político era vinculado a um grupo religioso, que não foi identificado, da qual ele tinha ressentimento. Segundo a imprensa japonesa, ele disse aos investigadores que sua família faliu em consequências das doações de sua mãe para o grupo.
Abe pronunciava um discurso de campanha para um candidato do PLD quando Yamagami fez dois disparos com uma arma caseira. Abe foi atingido no pescoço e no peito e declarado morto poucas horas depois.
O Japão é um país com poucos crimes violentos e tem leis rígidas sobre o porte de armas e, por consequência, a segurança nos atos de campanha não é tão severa. Após o assassinato de Abe a segurança foi reforçada para os eventos com o primeiro-ministro Kishida.
Mas a segurança nos locais de votação foi a habitual. Takao Sueki, de 79 anos, disse que compareceu às urnas com a instabilidade internacional em mente, incluindo a invasão russa contra a Ucrânia. "Ao observar a situação do mundo agora, penso como o Japão vai administrar o cenário", disse.
No sábado, a polícia admitiu falhas no dispositivo de segurança de Abe e prometeu uma investigação exaustiva. O comandante afirmou ainda, sem conter as lágrimas, que desde que se tornou policial em 1995 nunca teve "um remorso tão amargo e um arrependimento tão grande como este".
O velório de Abe acontecerá hoje à noite. Amanhã, apenas a família e amigos próximos comparecerão a um funeral simples. A imprensa informou que os dois eventos devem ocorrer no Templo Zojoji, em Tóquio. (Com agências internacionais).
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>