Variedades

No Rio, Lang Lang toca no Cristo Redentor e compara músicos a atletas

“É preciso começar cedo, quando se é muito jovem. São horas de treino, há um time por trás de você, sua família. Muitas vezes, há ainda todo um país nas suas costas. E quando chega a hora da apresentação, você precisa dar todo o seu coração, usar todas as suas forças.” O pianista chinês Lang Lang está falando da trajetória de um atleta ou de um pianista? “Serve para os dois, é tudo muito parecido. E é por isso que estou tão contente de estar no Rio, nesse momento, enquanto ocorre a Olimpíada. Na quinta-feira assisti a um jogo de badminton, que achei fascinante. E tenho visto o que posso pela televisão”, diz o músico.

O esporte tem marcado as visitas do pianista ao Brasil nos últimos anos. Sua última viagem ao País foi para um concerto ao lado do tenor Plácido Domingo, em julho de 2014, dois dias antes da final da Copa do Mundo de Futebol. E, na quinta-feira, 18, pouco depois de falar com a reportagem, fez uma apresentação fechada para convidados no Cristo Redentor. “Tocar no Cristo, nesse momento, é como ter mais um sonho realizado. É incrível sentir a energia da cidade”, ele afirma – e fala sobre o repertório. “Tem Chopin, mas também músicas chinesas. Há dois anos, toquei muita música brasileira e, desta vez, quis voltar a isso, em especial com Garota de Ipanema”, conta.

Aos 34 anos, Lang Lang, que nasceu na China e ainda na adolescência se mudou para os Estados Unidos, é um fenômeno raro: um pianista cuja fama vai além do universo da música clássica. Já lançou mais de duas dezenas de discos, foi embaixador da Unicef, criou projetos de educação musical na Europa e na Ásia; é garoto-propaganda de grifes e marcas famosas, tocou em eventos esportivos em todo o mundo. Mais do que isso: tornou-se símbolo da presença cultural chinesa no Ocidente – ainda que se recuse a falar de geopolítica.

Seu trabalho ao piano não é uma unanimidade. A facilidade técnica, espantosa, muitas vezes é associada à falta de profundidade musical. Não são, obviamente, características excludentes. E Lang Lang não parece preocupado com esse tipo de crítica. Assim como não se incomoda com comentários a respeito do número de atividades que desempenha. O mundo contemporâneo, diz, possui enorme rapidez. “Posso fazer muito mais coisa em menos tempo, tocar, criar uma fundação, me dedicar a projetos de educação musical, de formação de plateias. Hoje, você tem uma ideia e consegue transmiti-la, fazê-la repercutir, multiplicar significados”, explica ainda.

Uma dessas ideias é aquela que entende a música como uma espécie de ponte entre culturas. “Ontem mesmo, encontrei aqui no Rio atletas da China e da Alemanha e falávamos sobre isso, sobre mais esse elemento comum entre os esportes e a música. Quando não há a barreira da língua, você fala com as pessoas de uma outra maneira mais profunda e essencial. Você toca no sentimento, nas sensações, e isso leva a uma sinergia impressionante. Este é um poder enorme.”

Seu novo disco, aliás, previsto para setembro, é testemunho dessa aproximação entre culturas. Trata-se de uma homenagem a Nova York, na qual ele toca ao lado de artistas como Herbie Hancock, Alicia Keys e Madeleine Peyroux. “A princípio, pode parecer que se trata de um disco feito rapidamente, em alguns meses, mas foi na verdade algo muito pensado e estudado. Para você ter uma ideia, a primeira faixa foi gravada há quatro anos, a Rhapsdoy in Blue, de Gershwin, com Herbie Hancock. O repertório foi construído com cuidado, com o objetivo de mostrar facetas diferentes da cultura que emerge dessa cidade tão complexa”, explica o pianista.

Lang Lang também tem se dedicado ao trabalho com crianças. Sua fundação criou nos últimos anos escolas em diversas cidades chinesas, como Shenzen e Chongqing. “Na verdade, esse trabalho já chegou a escolas públicas da Europa também. Minha ideia foi introduzir um novo método, que apresenta a música às crianças de uma maneira diferente, com foco nas jornadas que a música permite e no modo como pode ser um exercício coletivo, sem que a criança precise cortar relações com o mundo exterior na hora de tocar.”

A passagem pelo Brasil incluiu ainda, na noite de quarta, 17, um rápido encontro com o pianista brasileiro Nelson Freire, após apresentação feita pelo chinês na casa do cônsul alemão. “Que surpresa encontrar o maestro Freire! Eu estava lá tocando e, no fim, vi que ele havia me assistido. Digo a você o que disse a ele: ainda bem que não sabia da presença dele na plateia, ou teria ficado particularmente nervoso para tocar!”, conclui.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Posso ajudar?