Devastado nos últimos anos por escândalos de corrupção e crises econômicas, o Rio pode ver antigos adversários políticos compondo a mesma aliança na eleição estadual do ano que vem. Berço do bolsonarismo e comandado hoje pelo interino Cláudio Castro (PSC), aliado do presidente Jair Bolsonaro, o Estado é visto como peça-chave pela oposição. Até um "palanque duplo" para os projetos presidenciais de Lula (PT) e Ciro Gomes (PDT), por exemplo, é considerado.
A ideia é agrupar a esquerda e o centro em torno de um nome. O mais cotado, hoje, é o de Marcelo Freixo (PSOL). Em gesto impensável até pouco tempo atrás, o deputado federal tem construído pontes à sua direita. Mira aproximação com o deputado federal Rodrigo Maia (DEM), que deve migrar para o MDB, e o prefeito carioca Eduardo Paes (DEM), cuja situação partidária ainda tem um futuro incerto.
A movimentação de seu principal quadro gera reação interna no PSOL, historicamente avesso a alianças com o centro. A saída de Freixo do partido é considerada inevitável por alguns políticos, caso o projeto de candidatura a governador nessa composição se concretize. Nomes importantes da legenda, por outro lado, buscam esfriar o conflito e pedem mais diálogo interno.
Participam das conversas outras figuras importantes da política local. Pelo PSB, fala o deputado federal Alessandro Molon. Representa o PT seu vice-presidente nacional do partido e ex-prefeito de Maricá, Washington Quaquá. O PDT tem voz pelo presidente da legenda, Carlos Lupi, e pelo ex-prefeito de Niterói Rodrigo Neves, que deixou o cargo com cerca de 80% de aprovação no ano passado.
Quem também está sempre presente nas discussões é o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, que encerra o mandato à frente da Ordem no início do ano que vem. Cortejado pelo PSDB, o advogado já foi filiado ao PT quando era mais jovem. Também é amigo de longa data de Eduardo Paes, cujo destino político-partidário deve ser decisivo para o do aliado.
Vários nomes, incluindo o de Santa Cruz e o de Rodrigo Neves, são cotados como possíveis candidatos ao governo estadual. Hoje, porém, o projeto Freixo é o que mais empolga, dado o histórico recente de bons sufrágios do psolista. Para consolidá-lo, no entanto, uma série de fatores será considerada.
O deputado já avisou – inclusive em entrevista ao <b>Estadão</b> – que só sairá candidato se compor uma aliança robusta, que vá além da esquerda. É aqui que entra a importância de nomes como Paes e Maia, avaliam Freixo e outros que abraçam a causa.
A iniciativa desses quadros da política para 2022 busca elaborar um discurso de reconstrução do Rio. Ao mesmo tempo, tenta construir um palanque para dois dos principais nomes da centro-esquerda na eleição presidencial: Lula e Ciro. O caso do governador do Ceará, Camilo Santana (PT), em 2018, é tido como referência para essa possibilidade. O mandatário cearense é aliado do clã Gomes no âmbito local.
"Penso que temos que partir de trás para frente. Primeiro, pensar num segundo turno, garantir que quem chegar lá receberá o apoio para derrotar Bolsonaro", avalia o petista Quaquá. Por orientação de Lula, o PT deve seguir o caminho de abrir mão de protagonismo nos Estados em troca de apoios ao ex-presidente na sua tentativa de voltar ao Planalto.
Um dos gestos recentes dos petistas em aceno aos demais partidos de esquerda se deu na Câmara – e beneficiou dois cariocas. Freixo foi nomeado líder da minoria na Casa; Molon, da oposição. Por ter a maior bancada, o PT poderia reivindicar para si os cargos, mas preferiu afagar PSOL e PSB, duas legendas na mira para a aliança que Lula planeja construir.
No PDT, que vê a possibilidade de lançar nomes considerados fortes em pelo menos oito Estados, a avaliação é de que o palanque nacional puxará os estaduais. "Não abriremos mão do nosso palanque (para Ciro Gomes). Pode ser palanque duplo? Pode", aponta Carlos Lupi.
<b>Vaga no Senado</b>
Dentro dessa configuração para o governo do Estado, a vaga que será aberta no Senado também é discutida. Santa Cruz já foi citado como uma possibilidade, assim como Molon.
Até hoje ameaçado por ter presidido a CPI das Milícias na Assembleia Legislativa do Rio, Freixo sempre pensa com cuidado antes de disputar uma eleição em que uma derrota o deixaria sem direito à escolta que o protege desde então. Ou seja, só trocará a garantida reeleição para a Câmara dos Deputados, onde se sente confortável atualmente, se tiver grandes chances de vitória no Rio.
Quadros importantes do PSOL pedem calma ao deputado em relação ao debate sobre 2022, já que o cenário no Rio ainda é muito indefinido. Eles avaliam que talvez não seja necessário ir além da centro-esquerda para derrotar o bolsonarismo no Estado. Temas como a Segurança Pública e a manutenção da Cedae, empresa pública de saneamento, como estatal, são centrais para o discurso psolista.
"Não estou convencido de que seja o melhor caminho (se aliar a antigos adversários, como Paes e Maia). Não encontra eco na maioria do partido. Mas o Marcelo tem o direito de disputar o partido com essa ideia, tentar ganhá-lo com essa concepção. O que peço é um pouco mais de calma", diz o vereador mais votado do Rio, Tarcísio Motta, que ficou em terceiro na eleição para governador em 2018. Ele defende que o correligionário e a sigla busquem o diálogo e evitem criar um cenário de rompimento.
Caso precise sair do PSOL, Freixo terá que escolher uma nova casa. PT, PDT e PSB evitam falar em "convite". Discretamente, mantêm portas abertas.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>