Os cuidados com a linguagem mantidos e cultivados por jornalistas mais velhos passaram a serem vistos com ironia e desprezo pelos, então, jovens repórteres, nos anos de 1960. Nas Redações começaram a proliferar os manuais de confecção de textos, nas décadas seguintes, aperfeiçoados, detalhados e ampliados. Alguns destes manuais chegavam a proibir expressões e procedimentos na criação de textos ainda usados, naquele momento. Impunham, por exemplo, que o prefeito não fosse chamado mais de alcaide. Como alcaide – e também nosocômio, ainda usado no lugar de hospital –, uma das denominações expurgada dos novos textos, hoje, seria vista com especial estranheza. Era destinada às “mulheres de vida fácil”, como as classificava outro clichê antigo, igualmente carregado de preconceito. Afinal, por que seria fácil a vida de uma mulher designada como “decaída”?
Esta antiga e, às vezes, ambígua delicadeza de linguagem também aparecia quando um jornalista noticiava algum fato considerado chocante. Por exemplo, um assassinato. Naquela situação, o bom gosto vigente determinava que a notícia fosse antecipada por uma ou duas frases, vagamente filosóficas, cuja única finalidade era a de amenizar o previsto impacto provocado no espírito do leitor pelas informações fornecidas
Seu texto, vamos supor, prosseguiria assim: “Ontem, por exemplo, na Vila dos Remédios, o ciumento guarda-noturno Felisberto da Silva, de 35 anos, assassinou impiedosamente, com 15 facadas sua infeliz mulher, a pobre costureira Rosivalda Flores, de 30 anos, ao surpreendê-la conversando, com inocência, no portão de sua modesta casa, com o jovem padeiro Antônio da Silva, de 18 anos”. Aquela introdução – chamada de “nariz de cera”, no jargão dos jornalistas – foi sumariamente extinta. Assim como a adjetivação. Desde os anos de 1960, os novatos nas redações são instruídos a iniciarem seus textos informativos respondendo logo, e, tão somente, a seis perguntas: que?, quem? quando?, como?, onde?, por que?
A perda daqueles cuidados deu, sem dúvida, concisão aos textos dos jornais. Poupou os valiosos espaços de suas páginas, assim como o tempo, presumivelmente curto, de que dispõem os leitores da frenética sociedade contemporânea. Mas, não terá também sacrificado um pouco a civilidade de que desfrutavam no seu convívio as pessoas antigas? A mesma civilidade que revelavam em reuniões sociais, nas mesas de refeição, e, no trabalho, através de comportamentos bem educados aprendidos em livros e cursos de etiqueta?
Como aquelas pessoas, do tempo das delicadezas de linguagem, nos julgariam se soubessem que a atual indústria fonográfica lança no mercado músicas com letras como a do “Bonde do Tigrão”?
Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP