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As pintoras Jandyra Waters e Niobe Xandó eram amigas. Ambas foram incentivadas pelo psicanalista, poeta e crítico de arte Theon Spanudis (1915-1986), nome que ajudou a sedimentar a carreira de outro grande pintor, Alfredo Volpi (1896-1988). Niobe Xandó morreu em 2010, aos 95 anos. Jandyra Waters, aos 97 anos, acaba de inaugurar uma exposição na Galeria Mapa, registrando um recorde: todas as obras foram compradas no dia da inauguração (27 de maio) por um único colecionador, segundo o marchand Marcelo Pallotta, proprietário da galeria. Por coincidência, Niobe Xandó também está sendo homenageada com uma retrospectiva com obras raras na Galeria Simões de Assis. Raras mesmo: nela estão obras da série Black Power, que quase ilustraram a capa de um disco dos Rolling Stones.

Há muito em comum entre Jandyra e Niobe, a despeito das diferentes linguagens e caminhos que as duas seguiram. Jandyra morou na Inglaterra, entre 1945 e 1950. Niobe, em suas andanças pelo mundo, passou por Londres, onde expôs há 50 anos na Walton Gallery – uma das obras que decorava a vitrine está agora em exposição na Simões de Assis. As duas foram pioneiras do abstracionismo no Brasil e eram invariavelmente citadas por Spanudis, ao lado do baiano Rubem Valentim (1922-1991), como artistas dotadas de uma capacidade visionária de evocar o numinoso, o transcendental. Não são pintoras que distorcem a realidade. Antes, a exemplo de Paul Klee, buscaram uma espécie de regressão a um estado em que essa realidade ainda não parecia objetivamente definida, como disse a respeito de Klee seu biógrafo Jean-Louis Ferrier.

A exposição de Jandyra Waters, Abstracionismo Orgânico, reúne pinturas dos anos 1960 que se distanciam da rigidez geométrica que caracteriza boa parte de sua produção. São obras que se aproximam da linguagem abstrata do italiano Alberto Magnelli (1881-1971), composições construídas a partir de blocos cromáticos, num diálogo íntimo com o “color field americano da época – em 1960, os artistas estavam se distanciando do expressionismo abstrato para abraçar a pintura de superfície, mais apaziguados com o drama expressionista abstrato e sintonizados com o zeitgeist dos feéricos 1960.

Esse aspecto “solar” da pintura de Jandyra é destacado por Theon Spanudis num texto em que fala do desenvolvimento do abstracionismo formal de Jandyra, “de signos misteriosos e enigmáticos e formas estranhas em perpétuo movimento”. Esses signos posteriormente desaparecem de sua pintura e a artista, nos anos 1970, abraça o construtivismo geométrico, após passar pela nona Bienal de São Paulo, em 1967, a mesma que trouxe a São Paulo a nata do movimento pop americano (Andy Warhol, Jasper Johns, Lichtenstein e Rauschenberg) – ela foi definida, na época, como antípoda do pop e representante do “neomondrianismo”, segundo o crítico José Geraldo Vieira.

Outro ponto que aproxima a pintura de Jandyra Waters e Niobe Xandó é o biomorfismo. Na mostra da primeira, segundo o curador Antonio Carlos Suster Abdalla, “estão presentes representações semelhantes àquelas que se encontram na natureza, utilizando formas curvas e volumes abundantes”, colocando-a em companhia dos representantes do organicismo (Jean Arp, Noguchi e outros). Há na exposição pinturas que foram retomadas 30 anos depois, mas, de modo geral, são telas dos anos 1960. Jandyra não pinta há algum tempo, desde que foi atropelada. Diz que sente dificuldade para ficar numa mesma posição e não sabe pintar sentada.

A redescoberta de Jandyra Waters coincide com a revalorização de grandes pintoras contemporâneas suas, entre elas a alemã Eleonore Koch (1926-2018), única aluna de Volpi, que teve uma tela de 1974 à venda na Frieze de Nova York por US$ 120 mil, e Judith Lauand, que tem a mesma idade de Jandyra e hoje é disputada por colecionadores internacionais. Todas, diga-se, tiveram o impulso de Theon Spanudis.

JANDYRA WATERS
Galeria Mapa. Rua Costa, 31 (travessa da Rua Bela Cintra), tel. 2337-3770. 2ª a 6ª, 10h/18h30. Entrada gratuita. Até 30/7.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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