Variedades

Nova fase de Melhem

Há 15 anos na Globo, Marcius Melhem despontou como o personagem cômico Pedrão, ao lado do amigo Leandro Hassum, no papel de Jorginho, no antigo humorístico Zorra Total. Espécie de “Gordo e Magro” brasileiro, a química da dupla de humoristas funcionou tão bem que, anos depois, eles ganharam o próprio programa, Os Caras de Pau. A trajetória ascendente de Melhem na televisão se consolidou ao assinar como um dos criadores do Tá no Ar: A TV na TV e do Zorra, dois produtos de sucesso da casa. No final do ano passado, o humorista, hoje com 46 anos, deu um novo passo na carreira: foi promovido a responsável pelos projetos de humor da Globo. Ao jornal O Estado de S. Paulo, ele fala sobre o novo posto, a 6ª e última temporada do Tá no Ar, que estreia nesta terça, 15, e sobre fazer humor nos dias de hoje.

Como surgiu o convite para você chefiar os projetos de humor da Globo?

Nesse processo constante da Globo de avaliação e planejamento do seu futuro, chegou-se à conclusão de que o humor poderia ocupar um tamanho maior e mais estratégico do que já ocupa. A partir daí, começamos uma discussão sobre isso. Sobre os talentos, os projetos, espaço na grade. E não dá para fazer isso sem a estrutura estar desenhada para tal. Fico feliz, claro, por ter sido convidado. Porém, o mais importante é a valorização do humor que isso representa.

O novo cargo é um dos pilares de apoio da área de Dramaturgia, comandada por Silvio de Abreu? Se sim, como é o “diálogo” entre essas áreas?

Isso. O Silvio de Abreu é diretor de gênero de Dramaturgia. E como apoio no dia a dia tem a Gloria Perez, com séries, e eu, com humor. Discutimos tudo juntos. E Silvio é muito generoso e me dá muita autonomia.

Conte sobre suas atribuições como responsável pela área de humor na casa.

É um cargo que eu enxergo como a possibilidade de fomentar o debate sobre humor aqui dentro. Ainda estou estruturando a área. Mas a gente vai abrir uma discussão sobre projetos e ter uma conversa sobre isso com autores da casa. Eu não decido o que vai ao ar, mas dou a minha opinião, minha avaliação e acompanho os projetos. No mais, procuro ser o mais sincero possível com os projetos que chegam. É fundamental olhar nos olhos das pessoas e conversar sobre o que você acredita. Tenho um profundo respeito pelo trabalho coletivo. Tudo sempre será muito discutido. Fundamental é que a vida dos projetos não dependa do meu gosto pessoal, mas do poder de comunicação das ideias nas diferentes chaves de humor.

Agora, como chefe, você não terá mais tempo de atuar e trabalhar como roteirista – trabalhos que, imagino, sejam prazerosos para você?

Uma das condições para que eu assumisse esse lugar era não deixar de ser um criador, um autor. O que mais me motiva é não perder a emoção de estar criando. Gosto muito do que faço, de encontrar pessoas todo dia e de estar trabalhando na criação de ideias, em texto. Dizem que essa fase, perto dos 50 anos, é muito rica, e não quero perder isso. É a fase em que a gente ainda tem a chama da criação muito forte, ainda está construindo uma carreira e, ao mesmo tempo, já tem uma certa experiência. Mas, para além disso, estou cercado de gente muito boa. E amo estar com eles nas salas de criação.

Você continuará no roteiro do Zorra na próxima temporada?

Não exatamente no roteiro. O Zorra está muito bem estruturado com a redação final da Gabriela Amaral e do Celso Taddei. E eles têm uma equipe muito qualificada, rara de se reunir. Eu participo com o olhar artístico, na interlocução. Acompanho e estou ao lado deles ajudando no que precisarem.

O Tá no Ar é um programa bem-sucedido e com uma liberdade dentro da Globo talvez só vista depois com o Zorra. Por que encerrar o Tá no Ar agora?

Tenho muito orgulho do que fizemos no Tá no Ar e de tudo isso que nasceu com ele. Às vezes o sucesso também vira uma prisão. É muito cômodo ficar ali e, quando você vê, já foi. Sempre acredito que a gente pode ter uma nova ideia, uma nova parceria. A gente poderia fazer o programa do jeito que ele é, por mais uns 10 anos. Mas somos inquietos e queremos fazer outras coisas. E o principal: já temos outra ideia. Agora temos que concentrar esforços em torno dessa nova ideia.

Como será essa última temporada do Tá no Ar?

A grande novidade é o último episódio. Ainda não posso falar muito, mas imagina pra nós o que é a responsabilidade de encerrar o Tá no Ar depois de tudo o que já fizemos e tendo a tradição de fechar todas as temporadas com uma surpresa. Já tivemos, por exemplo, homenagem ao humor, à década de 1970… Encerrar um programa é difícil. Mas posso dizer que, com muita alegria, vamos fazer esse “funeral”.

Quem de fora da Globo participará dessa última temporada, como aconteceu nas anteriores?

Temos (Fábio) Porchat, Amauri Jr. e Carlos Alberto de Nóbrega participando das chamadas. Nos episódios, posso adiantar nomes como Thiago Lacerda, Pedro Bial, Gabriel Leone, Dan Stulbach, Lilia Cabral, a banda Sepultura, entre muitos outros.

Existe um novo projeto envolvendo a equipe do Tá no Ar?

Sim, ainda estamos definindo formato e vamos apresentar para a empresa. Mas está sendo criado pela redação do Tá no Ar e ainda traz mais gente. A diretora Lilian Amarante chegou agora em dezembro pra somar com seu olhar tão talentoso no humor. A ideia é que tenha um diálogo com o que fizemos no Tá no Ar, mas apresentando outras soluções de conteúdo e formato. Terá inclusive outra minutagem. O projeto é uma grande loucura e a gente quer muito fazer.

Quais outros projetos da área de humor já estão previstos para estrear?

Eu não falo sobre o que está em andamento, ainda não aprovado. Mas tem muita coisa na mesa de criação e estamos definindo prioridades dentro das possibilidades de realização e de espaço na grade.

Numa entrevista recente, você disse que o politicamente correto é um avanço. Há quem diga que o politicamente correto é um limitador no humor. Que avanços que ele trouxe para o humor? E há algum lado ruim nele?

Acho que o que chamam de “politicamente correto” é um avanço da sociedade. Na minha visão, é não oprimir o oprimido, é não ajudar a perpetuar machismo, racismo, misoginia, homofobia. Estamos num país e num momento muito difícil de viver para muitas categorias e acho que a função do humor é melhorar a vida dessas pessoas, e não piorar. A gente é muito vigilante mesmo. Acho que temos que fazer com que pessoas que são esquecidas todos os dias, pelo menos por nós aqui, não sejam.

Nesse cenário atual mais conservador no Brasil (e no mundo), a forma de se fazer humor muda?

Humor é oposição sempre. Provoca, aponta distorções, incoerências e promove o debate de ideias. O que acontece num cenário conservador é que você fica mais vigilante, concentrado, atento, pra gritar rápido e alto quando liberdades são ameaçadas. Porque se você não grita logo, pode perder sua voz, sua identidade. O humor, a imprensa, as instituições são vigias dos direitos das sociedades.

O Tutorial dos Candidatos que Marcelo Adnet fez para o jornal O Globo fez sucesso. A que você atribui esse sucesso? O olhar para a política justamente pelo viés do humor seria um dos motivos?

Ali tem aquela mágica do talento de um humorista genial com um achado cômico na abordagem que pegou na veia. Adnet estudou muito cada candidato e chegou lá em todos. Ele é genial mesmo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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