Variedades

Nova geração de músicos brasileiros aponta para um cenário musical mais dinâmico

Fazer música de câmara; repensar o papel de uma orquestra sinfônica na vida de uma cidade; criar grupos próprios; dedicar-se à música brasileira; promover intercâmbios de repertórios. Ideias como essas se repetem na conversa com representantes da nova geração de músicos brasileiros – e apontam para um cenário musical mais dinâmico, aberto e inclusivo.

É essa ao menos a expectativa de músicos, gestores e especialistas, que têm se dedicado a projetos de educação musical e inclusão social. Não se trata de um fenômeno paulista. Em Salvador, por exemplo, há o Neojiba (Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia), cuja orquestra acaba de realizar uma turnê pela Europa, com a pianista Martha Argerich como solista. É um de muitos símbolos de uma crescente descentralização, que está espalhando orquestras por todo o País.

Projetos como o Neojiba, o Baccarelli, a Emesp ou o Guri tratam de uma questão importante hoje. Vivemos em um mundo em transformação e a vida musical é parte disso. Professores e alunos querem ter as ferramentas para lidar com essa realidade. A percepção é de que só ficar na sala de aula estudando ou no palco tocando não basta. É preciso sair para a rua, conhecer o público e expandir o mercado, tornando-se também empreendedor. Além disso, muitos músicos formados nesses projetos carregam o desejo de passar o conhecimento adiante, de ensinar”, afirma Paulo Zuben, da Escola de Música do Estado de São Paulo.

O desafio passa a ser, então, criar um ambiente pedagógico em que essas questões sejam discutidas naturalmente. Um aspecto fundamental é o ensino coletivo. “Fazer a música coletivamente traz outra dimensão, outra perspectiva social e artística”, explica Zuben. Edmilson Venturelli, do Instituto Baccarelli, segue na mesma linha. “Para essa nova geração, a música tem outro significado. Em primeiro lugar, há a paixão, o prazer de tocar. E, além disso, para eles fazer música é descobrir novas possibilidades. É por isso que eles são mais abertos, mais dispostos a experimentar”, diz, citando como exemplo o envolvimento dos alunos do instituto com novos projetos, como os concertos em escolas e hospitais de Heliópolis ou o Baccarelli na Rua, com concertos no Armazém da Cidade, na Vila Madalena.

Para Zuben, há uma onda, um movimento claro em ação. “A atividade musical tradicional vive sob duas pressões. De um lado, você tem os governos, os financiadores públicos, que exigem dos projetos um caráter público, que abrace ideais como gratuidade, diversidade, a busca por novas plateias. Do outro lado, há essa nova geração de músicos, que já enxerga o fazer musical dessa forma, que quer quebrar a barreira entre a música clássica e o público. Dessas pressões, nasce uma nova onda. Quanto mais tempo demorar para os projetos se darem conta disso, pior será.”

Esse movimento tem se espalhado pelo mundo. E a experiência brasileira tornou-se uma referência importante. A Emesp, por exemplo, tem parcerias com instituições como a Juilliard School, de Nova York, ou o Conservatório de Amsterdã. O Baccarelli, por sua vez, recebe frequentemente músicos estrangeiros para master classes. Este ano, artistas de orquestras como a Filarmônica de Viena estiveram no instituto, que está fechando contratos com universidades americanas para aulas a distância, via Skype. “Sempre que recebemos artistas ouvimos eles falarem sobre o quanto foi bom o contato com nossos alunos, com esse espírito de envolvimento e paixão pela música”, ressalta Venturelli.

Um exemplo claro disso tem sido o trabalho da violista americana Jennifer Stumm. Há dois anos, ela criou no interior de São Paulo o Festival Ilumina, que realiza sua terceira edição em janeiro. A ideia é reunir jovens músicos para tocarem juntos e trocarem experiências. “A fagulha inicial se deu em uma visita que fiz à Emesp, em 2014. Fiquei impressionada”, contou ela em entrevista recente ao jornal “O Estado de S. Paulo”. “O talento, a humanidade, o desejo de se sair bem mesmo em face de desafios socioeconômicos: eu nunca havia experimentado isso na minha vida. E a experiência deu forma à minha crença de que a música clássica deve ser dinâmica, viva, transformadora.”

Segundo ela, a maior parte dos músicos que participam do Ilumina vem de comunidades carentes. “Para eles, a música é mais do que uma forma de arte, é uma forma de sobrevivência. Isso é algo raro no Hemisfério Norte e é por esse motivo que as vozes deles precisam ser ouvidas em todos os lugares. Há um potencial enorme surgindo nas periferias. Em apenas dois anos de Ilumina, 50% dos nossos jovens já foram aceitos em instituições internacionais. O Brasil deve ter muito orgulho e dar todo o apoio possível a esses artistas.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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