Uma nova leva de estudos e análises realizados pela agência The Associated Press (AP), divulgados nesta quarta-feira, indicaram que a Baía de Guanabara e a Lagoa Rodrigo de Freitas têm níveis de vírus patógenos equivalentes ao de um esgoto bruto. E esses níveis estão presentes mesmo nas raias longe da costa da baía, segundo apontou a pesquisa que mais uma vez coloca em xeque a organização da Olimpíada do Rio e a prefeitura local, que veem a má qualidade da água nos locais de disputas de vela, canoagem de velocidade e remo como um calcanhar de Aquiles dos Jogos de 2016.
A nova pesquisa encomendada pela AP reforça a tese de que os competidores estarão perigosamente expostos ao risco de se contaminarem com vírus que podem provocar doenças. “Esses níveis de vírus estão disseminados. Não se limitam à costa, estão em toda a extensão da água, o que aumenta a exposição das pessoas que entram em contato com ela. Estamos falando de um ambiente extremo, com uma contaminação tão alta que a exposição é iminente e a probabilidade de infecção é muito grande”, afirmou Kristina Mena, especialista em vírus aquáticos e professora de saúde pública do Centro de Ciência da Saúde da Universidade do Texas.
Uma primeira leva de estudos e análises, que a AP encomendou em julho passado, detectou a presença de vírus que causam doenças diretamente relacionadas ao contato com o esgoto em níveis até 1,7 milhões de vezes aos que seriam considerados muito alarmantes nos Estados Unidos ou na Europa. Especialistas afirmam que os atletas competirão em águas com vírus patógenos equivalentes ao de um esgoto bruto, o que representa estar exposto ao alto risco de contrair doenças ligadas à poluição.
Os resultados da pesquisa estremeceram a comunidade esportiva do mundo e as autoridades do esporte se comprometeram a fazer suas próprias análises para garantir que as águas não representarão um perigo para a saúde dos competidores. E essas promessas foram cobradas com maior urgência em agosto passado, quando eventos-teste de remo e vela ocorreram no Rio e foi constatado um número de ocorrência de doenças com atletas equivalentes ao dobro da média que seria aceitável para nadadores em águas recreativas nos Estados Unidos.
O caso mais relevante de velejador que ficou doente após o evento-teste realizado no Rio foi o do alemão Erik Heil, que contraiu uma bactéria super resistente e teve de se submeter a uma cirurgia na pele para a retirada de um agente patógeno. Ele, porém, admitiu que não pode afirmar que contraiu a doença durante a competição realizada na capital fluminense.
Dirigentes da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Comitê Olímpico Internacional (COI), por sua vez, não cumpriram promessas de que seriam realizadas análises para constatar a presença de vírus, que seria um reflexo da investigação iniciada pela AP em julho.
Agora, as análises mais recentes da água revelaram que não somente a qualidade da água não melhorou, como também a contaminação abrange uma extensão maior do que se pensava. A quantidade de vírus encontrados a um quilômetro da costa na Baía de Guanabara são similares aos existentes na própria costa, onde há despejo de esgoto. “Os níveis de vírus são tão altos nestas águas que, se fossem registrados em praias dos Estados Unidos, as autoridades fechariam oficialmente essas praias”, ressaltou a especialista em saúde Kristina Mena.
RIO GARANTE PRIORIZAR SAÚDE – Ciente de que a nova pesquisa apontou índices preocupantes de poluição, o Comitê Rio-2016 ressaltou, por meio de um comunicado enviado à AP na terça-feira, que “a saúde e a segurança dos atletas é sempre uma prioridade máxima e não há dúvida de que a água nos locais de competição atende aos padrões relevantes”.
“O Rio-2016 segue as orientações de especialistas da Organização Mundial da Saúde, cujas diretrizes para a segurança de águas recreacionais recomendam a classificação da água por meio de um programa regular de testes da qualidade microbiana da água”, completou o comunicado.
Palco das disputas do remo e da canoagem de velocidade da Olimpíada de 2016, a Lagoa Rodrigo de Freitas é reconhecidamente, porém, um local preocupante para a organização da Olimpíada, depois de ter apresentado um pico de coliformes fecais bacterianos mais de 16 vezes maior do que o nível permitido pela lei brasileira.
Promessa de campanha da candidatura do Rio aos Jogos de 2016, a despoluição da Baía de Guanabara não aconteceu como as autoridades gostariam que ocorresse. E o própri Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Organizador da Olimpíada do Rio, admite que a meta de despoluição de 80% das águas, projetada pelo governo do Rio, foi subestimada no início.