Estadão

O desafio de apagar um incêndio sem usar água

Cinco homens. Contra eles, a mata fechada e seca, o vento e o fogo – fora de controle. No meio do Pantanal, em meio a uma das piores estiagens que atingem a região em décadas, eles disputam cada palmo de uma área que se estende do Maciço do Urucum em direção à fronteira com a Bolívia. Falta a eles, no entanto, o fundamental: água.

Ali, às margens da BR-262, na região de Corumbá, os brigadistas do Ibama correm de um lado para o outro para evitar que o fogo destrua ainda mais o bioma e para que fique longe da estrada. Nem sempre conseguem. Nesta semana, um carro da Polícia Rodoviária Federal foi destruído pelas chamas que atingiam a BR-060, em Sidrolândia.

Sem água, lutar contra o fogo é como jogar xadrez com a natureza. "Aqui não vai chegar, é muito fechado para entrar com carro-pipa", diz o chefe de esquadrão dos brigadistas. É José Roberto Brandão, de 38 anos, quatro temporadas de incêndios no Pantanal. Dois salários mínimos e meio por um trabalho que não costuma durar o ano inteiro.

A enxadadas, ele retira o que pode da vegetação seca do caminho das chamas. Cria uma barreira natural com o solo nu. Não basta. O vento muda de direção. Atinge os galhos de uma árvore pequena e torta, desce pelo tronco e pula a barreira criada pelo homem. O que parecia controlado se acende, o calor aumenta em segundos. Zé Roberto recua.

Galão de gasolina na mão, trata de deixar longe das chamas. O combustível é para o soprador. A máquina presa às costas de um dos brigadistas é a mesma com que se juntam folhas em jardins com a força do vento. No combate aos incêndios, serve para tentar mudar a direção do fogo.

Da estrada, a um quilômetro, o que se ouve é o barulho forte dela e das chamas estourando o capim seco. Ora um, ora outro mais forte. Golpe e contragolpe.

"Entra por aqui, passa aquela cerca e vai até aquelas árvores. De lá, segue uns 700 metros, vai olhando de onde vem a fumaça e ouvindo o fogo", ensina Ciney Cunha o caminho à reportagem. Ele acabara de sair da mata para comer, se hidratar e ficar de olho na caminhonete do Ibama. Nem sempre os agentes do Ibama são bem-vindos.

Quando a reportagem encontra os brigadistas no meio da mata, eles já estão por ali há ao menos cinco horas. "Vamos passar a noite aqui. A ideia é controlar até ali na frente (aponta para área mais aberta a cerca de 500 metros) e deixar longe da BR", diz Zé Roberto.

O problema para ele, e os outros brigadistas, é que essa não é a única área que está queimando naquela mesma região. Do lado de lá da BR, a fumaça nas encostas do morro do Urucum denuncia o fogo que atingiu a área da mineradora Vale. Há dois dias, brigadistas e bombeiros trabalhavam nesse foco.

De lá viram o fogo começar em outro ponto e ameaçar o fluxo da rodovia que liga Corumbá a Campo Grande. Fosse só essa a ameaça e já seria um problema. O fogo caminha pelo Pantanal e deixa um rastro de destruição e animais mortos. "Cateto, cobra, mas o que você imaginar morre aí nesse fogo", diz Zé Roberto.

"Esse fogo" ninguém sabe como começou. Tampouco o chefe dos brigadistas se atreve a adivinhar. Certo é que no Pantanal incêndio começa sem causas definidas – ou definidas mas sem responsabilidade atribuída. O dono da área, particular, não foi localizado.

Ontem, o Corpo de Bombeiros de Corumbá se dividia em operações na estrada do Carandazal, Abobral, Nabileque, Urucum e Nhecolandia. As dez brigadas de incêndio mantidas por iniciativas privadas, como a Pantanal SOS, também atuavam em pontos distantes da mata. Corumbá é o município de maior extensão em todo o Mato Grosso do Sul. A brigada do Ibama também fazia o rescaldo de mais de uma semana de incêndio na terra do povo kadiwéu, a cerca de 200 km de Corumbá, Pantanal adentro.

<b>Chuva
</b>
No começo da noite, alguns pingos prometiam chuva. Naquela hora, quando Zé Roberto e os outros quatro brigadistas continuavam a disputar terreno com o fogo, uma equipe de bombeiros deslocada de outra operação estacionou às margens da BR-260. Desceram quatro homens. Em minutos se embrenharam na mata fechada e seca. Com eles, dois reservatórios de água portátil preso às costas. Até que acabe o recurso, a disputa vai ficar um pouco mais equilibrada. A chuva não veio. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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