Desde que foi criado, em 2002, o mais novato dos três fundos soberanos do governo de Abu Dabi – o Mubadala – nunca teve um escritório fora do território árabe, embora esteja presente em 20 países, com US$ 48 bilhões em ativos. O príncipe herdeiro Mohammed bin Zayed Al Nahyan, filho do fundador de Abu Dabi e presidente do conselho de administração do fundo, decidiu que os negócios seriam todos tocados de lá. Até que um brasileiro cruzou seu caminho e o obrigou a mudar de planos.
Antes da derrocada, Eike Batista conseguiu convencer o Mubadala a investir em suas empresas. As conversas começaram em 2011, duraram quase um ano, exigiram muitas idas do empresário e de representantes do governo brasileiro ao país mais rico dos Emirados Árabes e culminaram com uma visita do príncipe ao carnaval do Rio. Em março de 2012, estava assinado o cheque de US$ 2 bilhões. Não era pouco dinheiro, considerando que o fundo já registrou alguns prejuízos e, no ano passado, por exemplo, lucrou US$ 282 milhões – uma queda de 28% na comparação com 2013.
“O time do Mubadala ficou impressionado com a capacidade de Eike de gerar negócios, num momento em que o Brasil estava muito bem lá fora, e se interessou muito pelos ativos”, diz uma fonte que acompanhou a aproximação dos árabes com o empresário brasileiro. “Eles chegaram a fazer uma avaliação gigantesca no grupo, que durou quase um ano.” Mas os números traíram os árabes. A começar pela petroleira OGX, os projetos de Eike Batista não deram os resultados prometidos e foram caindo um a um.
Renegociação
Com o risco cada vez mais real de perder o dinheiro investido, o Mubadala, que tem participações em empresas como a General Eletric e a gestora americana Carlyle, se apressou em mudar o acordo inicial, segundo o qual o fundo converteria o aporte em ações à medida que as empresas X começassem a entrar em operação e dar resultado.
Pelo que foi divulgado à época, os árabes teriam 5,6% das ações da holding de Eike. Como acionistas, numa situação de falência, seriam os últimos a recuperar o dinheiro – se recuperassem. Por isso, em 2013, o príncipe sentou novamente à mesa com Eike Batista e o pressionou a mudar o contrato por meio de uma operação complexa, em que o investimento foi convertido em dívida e o Mubadala virou um dos principais credores do grupo X, com direito de ficar com alguns de seus principais ativos.
Hoje, o Mubadala controla a mineradora de ouro AUX, a empresa de entretenimento IMX, dona da marca Rock in Rio, e tem participação na Prumo Logística (antiga LLX). Mas é na Ilha da Madeira, no município fluminense de Itaguaí, que está seu ativo mais valioso no Brasil: o Porto Sudeste. Ao lado da trading de origem holandesa Trafigura, o Mubadala detém 65% do terminal portuário privado, que já está pronto, à espera de licença para iniciar operação.
Para acompanhar de perto os negócios e recuperar o quanto for possível do investimento, Al Nahyan fez alguns de seus executivos trocarem o clima árido de Abu Dabi pelo calor úmido do Rio de Janeiro. Desde o fim do ano passado, cerca de 20 executivos do Mubadala ocupam uma sala no segundo andar do Centro Empresarial Mourisco, em Botafogo, na zona sul do Rio. É um escritório improvisado, alugado pelo sistema de coworking – em que o espaço é compartilhado com outras empresas.
Em nota, o fundo confirmou a informação e, sem dar detalhes, disse que “tem uma pequena equipe no Brasil gerindo ativamente o portfólio e interesses no País, tendo em vista a criação de valor a longo prazo”.
À frente da operação está o sueco Oscar Fahlgren, de 35 anos. Ex-executivo do JP Morgan em Londres, ele trabalha há cinco anos no Mubadala e é o braço direito de Hani Barhoush, responsável pela área de investimentos globais do fundo soberano. De acordo com o fundo, uma “parte substancial do investimento inicial na EBX foi recuperada”.
Uma fonte próxima aos árabes disse que, por enquanto, novos investimentos na área de infraestrutura no País estão descartados. Ainda que esse seja um bom momento para comprar ativos baratos no Brasil, o Mubadala está “fechando a torneira” em meio à queda do preço do barril de petróleo. O fundo é um dos instrumentos do governo de Abu Dabi para investir a riqueza oriunda da atividade petroleira e diversificar a economia local.
“Se o Porto Sudeste funcionar bem, quem sabe eles tenham vontade de colocar mais dinheiro no Brasil”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). “Por enquanto, eles têm de se livrar dos problemas que herdaram do Eike.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.