“O que é o Paraíso, realmente, padre?” Nos anos 60, em Belém, um dos responsáveis pelo Seminário Metropolitano percebeu a inquietação do seu aluno naquele tom de voz, ao formular-lhe a questão. Era quase um pedido de apaziguamento. O padre, então, solidário e cúmplice, segredou-lhe: “O Paraíso é um orgasmo eterno”.
Ele já não estava no Pará quando decidiu pacificar outro conflito que o incomodava. Em São Paulo, dirigiu-se ao Convento dos Dominicanos, movido por uma necessidade aflitiva de entender o que, de fato, era o Inferno. Ali, o frade que o atendeu também se comoveu com sua agonia. E, num timbre de voz de confidência, disse-lhe: “O Inferno é uma dor eterna sentida pela ausência de Deus”.
Aquelas explicações eram melhores dos que as recebidas em sua infância. Segundo as quais, no Céu era terra de anjinhos, tocando harpas. E o Inferno,fogaréu para queimar os pecadores. Mas, não bastavam. O jovem queria, agora, aventurar-se indo além da área de conforto dado a ele pelos ensinamentos religiosos recebidos desde sua infância. Queria entender como viviam, sentiam, pensavam os ateus. Com este propósito, passou a conviver com eles. E, aos poucos, foi se convencendo de que a vida bastava como tempo necessário para esgotar todas as experiências que poderiam compor sua existência.
Décadas se passaram. Ele se tornava um ateu sereno, havia anos, quando, com emoção, descobriu em antigas esculturas de um italiano, a presença daquela explicação do Paraíso, fornecida em sua juventude pelo padre de Belém. A do prazer orgástico permanente obtido como prêmio por doação heroica e radical a Deus.
Ali estavam, em fotos, diante de seus olhos, talhados em mármore por Gian Lorenzo Bernini, nos anos de 1600, São Lourenço, a Beata Ludovica Albertone e Santa Teresa.
O santo sob formas de um homem vigoroso, que, deitado, seminu, é martirizado em nome de Deus, enquanto desfruta, concentrado, do seu prazer físico, com feição relaxada e olhar mortiço.
A beata, a nobre de vida inteira dedicada aos pobres. Está deitada num colchão confortável, em comunhão mística com Deus. Olhos semicerrados, boca entreaberta, ela toca sensualmente um dos seios com a mão direita. E, enterra a cabeça num travesseiro, por prazer.
Por fim, Santa Teresa, em êxtase, diante do anjo adolescente, que, crava várias vezes nela seu arpão de ponta grande e flamante, como ela contou no “Livro da Vida”, no qual Bernini encontrou orientação para aquela escultura. Nele, prossegue a santa, sempre que anjo tira o arpão de suas estranhas, a violência do fogo, na sua ponta, a fazia gritar. E seus gritos – ela acrescentou – eram “misturados de tão extremo gozo que não podia desejar-me livre de tão agradável dor”.
(Ilustração: A escultura “O Êxtase de Santa Teresa”, de Bernini.)