Mundo das Palavras

O patriarca dos Caretanos

Em plena revolução comportamental dos anos 60/70, no Brasil da Ditadura Militar, Caetano Veloso, com pouco mais de 20 anos de idade, embora fosse ousado e lúcido, como artista de vanguarda, não escapou do apelido de Caretano – neologismo derivado de careta, palavra com a qual os jovens amaldiçoavam tudo que lhes parecesse conservador e repressivo.
 
Foi Rogério Sganzerla, cineasta amigo de Caetano, quem criou o apelido, usado numa capa da Revista Bondinho. Na sua autobiografia, “Verdade Tropical”, Caetano o explica: “eu não tomava drogas, mantinha certo conforto burguês para minha família…, amava o essencial da cultura do Ocidente”. O apelido o agradou. Porque, segundo Caetano, trazia “uma saudável distensão, iniciando a superação dos fanatismos revolucionários e do luto por suas derrotas. Habilitando-nos assim a poder reconhecer suas vitórias parciais”.
 
O artista, como é sabido, confrontou a intolerância do governo militar com estética anarquista, dubiedade sexual, e, declarações de ateísmo, a ponto de ser preso e exilado em Londres. Infelizmente, aquela intolerância obscurantista sobrevive, no Brasil, em parcelas polêmicas do Neopentecostalismo. Há três anos, Caetano foi acusado de fazer pacto com o Diabo, quando sua gravação de “Sozinho”, música de Peninha, alcançou grande vendagem. Seu acusador: Pastor Marcos Feliciano.
 
Recentemente, na nova edição de “Verdade Tropical”, Caetano reafirmou seu direito à total liberdade sexual. Aos 75 anos de idade. Nela, como nunca antes, ele se mostrou incisivo na defesa da rebeldia política, indignado contra a “opressão de classe e humilhação colonialista/imperialista” existente no País. Mantém-se, deste modo, há meio século como chama ardente da inteligência e do talento produtivo, algo de valor inestimável para inúmeros brasileiros.
 
Mas, sobre Caetano pesa agora uma sombra, como não aconteceu no passado, quando recebeu aquele apelido. Seus três filhos – Moreno, Zeca e Tom, respectivamente, com 44, 25 e 20 anos de idade – recusaram seu modo lúcido e intelectualmente sofisticado de se comportar e ver a vida. Para aderirem a um polêmico e suspeito tipo de religiosidade, distante da rica Filosofia Humanística do Cristianismo. Os dois últimos são adeptos do Neopentecostalismo pregado pelo bispo Edi Macedo.
 
Assim, surgiu na história de Caetano este enigma diante de quem precise entender o que os filhos dizem “para” e “sobre” seus pais, quando escolhem seus caminhos. Felizmente, nas últimas semanas, o “patriarca” e rebentos, num “nepotismo do bem”, como classificam repórteres da área de Espetáculos, estão juntos num “show familiar”. Que pareceu fresco e despretensioso à Amanda Nogueira, da Folha de São Paulo. “Agradando a plateia, que batia palmas e ouvia, com curiosidade, os ‘causos’ da família”, segundo ela.
Melhor assim.

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