Mundo das Palavras

O poder de Al Di La

“Quando ouvir esta música, lembre-se de mim” – pede a moça, sentada no banco de carona. Enquanto seu namorado dirige o carro, com rádio ligado. Se for atendida, aquele momento agradável, de harmonia e intensidade amorosa, será lembrado pelo parceiro, durante anos.  Quando ouvir novamente a música, ela própria vai se recordar de como ambos se sentiam bem, perto um do outro. Lembrará do lugar onde estavam no instante do pedido, e, ainda, de como haviam chegado àquela fase do relacionamento que tinham. 
 
Pedidos como estes devem ter surgido no convívio dos casais desde as primeiras difusões de músicas gravadas pelos meios de comunicação de massa. Há 55 anos, apareceu nas telas dos cinemas, a cena do filme Candelabro Italiano, em que dois jovens, namorados, Don Porter (Troy Donahue) e Lyda Kent (Angie Dickinson) ouvem Al Di La, cantada por Emilio Pericoli, como se vê na imagem postada junto com este texto. Desde então, a composição é tida como um marco referencial perfeito para qualquer experiência amorosa.  
 
Agora, as ciências começam a explicar as razões pelas quais uma simples música popular pode trazer de volta à nossa memória um rol de lembranças. Isto pode acontecer mesmo com pessoas, na velhice, vítimas de demência, como o Mal de Alzheimer – mostra o documentário “Alive inside: a story  of music & memory”. Num asilo de idosos, o assistente social Dan Cohen instala fones de ouvido em pessoas mentalmente desligadas da realidade que as cercam. Ele está munido de aparelho eletrônico barato, dotado de arquivos de áudio, onde gravou músicas que aquelas pessoas amaram no passado. Graças a Cohen elas voltam a ouvi-las. E já não são mais mortos-vivos. Despertam. Começam a cantar, conversam e até a dançam, senhores das suas próprias histórias e identidades. Permanecem exuberantes, como eram antes, enquanto dura o reencontro com aqueles sons.
 
No filme, há uma explicação neurológica. O médico Oliver Sacks diz que as partes do cérebro humano menos afetadas pelas demências são as que nos fazem reagir às músicas. Deve estar correto. Mas esquece que as músicas do agrado dos namorados não são só músicas. Carregam textos em suas melodias. Cujas palavras, também dotadas de sonoridade, às vezes, têm cargas emocionais tão intensas quanto às das melodias às quais se fundem. 
 
Como ocorre em Al Di La. Para acompanhar sua melodia os compositores Carlo Donida e Giulio Rapetti escreveram: “Muito além do bem mais precioso.  Muito além do sonho mais ambicioso. Das coisas mais belas. Muito além das estrelas. Está você”.
Há muito a explicar, ainda, portanto. 
 

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