O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi questionado por jornalistas na manhã desta quarta-feira, 26, sobre uma série de temas de grande repercussão nos últimos dias, como a descriminalização do porte da maconha pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a autonomia e a presidência do Banco Central, o projeto de lei sobre o aborto, o indiciamento de seu ministro das Comunicações, Juscelino Filho, entre outros assuntos.
A entrevista foi concedida do Palácio do Planalto ao portal UOL. Lula também comentou sobre os ataques de 8 de Janeiro, defendendo que os foragidos que estão na Argentina sejam presos lá mesmo no país vizinho. afirmando que defende presunção de inocência do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas acrescentando que "tentar dar golpe, ele tentou".
Sobre a descriminalização do porte da maconha, cujo julgamento no STF deve ser finalizado nesta quarta-feira, Lula afirmou que a Suprema Corte "não tem que se meter em tudo", mas classificou como "nobre" a diferenciação entre consumidores e traficantes. A seguir, leia o ponto a ponto dos temas que o presidente comentou na entrevista.
<b>Ministro indiciado</b>
Questionado sobre o caso que envolve o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, suspeito de desvio de verbas públicas enquanto era deputado federal, o presidente afirmou que o afastará do cargo caso a Procuradoria-Geral da República (PGR) aceite as investigações da Polícia Federal (PF). "Vai ser afastado. Ele sabe disso", respondeu aos jornalistas.
Juscelino foi indiciado pela PF no último dia 12, acusado dos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O próximo passo deve ser a apresentação, ou não, de uma denúncia. O <b>Estadão</b> apurou que o relatório final da investigação cita ainda supostos crimes de falsidade ideológica, frustração de caráter competitivo de licitação e violação de sigilo em licitação, previstos no Código Penal.
"O que eu disse para o Juscelino: a verdade só você sabe. Se o procurador indiciar você, você sabe que tem que mudar de posição. Enquanto não houver indiciamento, você continua como ministro. Tem que ser afastado (se for aceito o indiciamento)", disse o presidente.
<b>Projeto de lei do aborto</b>
Lula voltou a comentar o projeto de lei sobre o aborto que tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados. "O projeto apresentado não era projeto, era uma carnificina contra as mulheres", declarou. "Porque, na verdade, ele estava criminalizando a vítima."
O presidente também afirmou que os deputados que fizeram o que qualificou como "bobagem" sabem "do erro que cometeram". Entre os 56 signatários do projeto, 36 parlamentares são do partido do ex-presidente Bolsonaro e do principal autor do projeto, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-SP).
A posição já conhecida de Lula, que se diz contra o aborto, foi reafirmada por ele, que também voltou a declarar que o tema deve ser encarado como questão de saúde pública.
<b>Porte de maconha e STF</b>
Sobre a descriminalização do porte da maconha pelo STF, que deve bater o martelo também sobre a quantidade da planta que diferencia usuários de traficantes, Lula criticou o fato do tema precisar ser submetido à deliberação da Corte Suprema do Poder Judiciário.
"A Suprema Corte não tem que se meter em tudo. Ela precisa pegar as coisas mais sérias sobre tudo o que diz respeito à Constituição e virar senhora da situação, mas não pode pegar qualquer coisa e ficar discutindo, porque aí começa a criar uma rivalidade que não é boa, a rivalidade entre quem manda, o Congresso ou a Suprema Corte", disse.
Entretanto, o presidente classificou como "nobre" a diferenciação entre quem porta maconha para uso pessoal, e quem a vende, e disse ainda que a avaliação sobre o porte deveria ser "da ciência e não do advogado". "Eu acho que é nobre que haja diferenciação entre o consumidor, o usuário e o traficante. É necessário que a gente tenha uma decisão sobre isso, não na Suprema Corte, pode ser no Congresso Nacional, para que a gente possa regular", declarou.
<b>8 de Janeiro</b>
Sobre os brasileiros foragidos na Argentina, suspeitos ou condenados pelos atos golpistas que depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília, Lula afirmou que o diálogo com o governo argentino está sendo empenhado "da forma mais diplomática possível".
O petista, contudo, afirmou que ainda não conversou com Javier Milei, pois o argentino deve desculpas a ele. "Ele tem que pedir desculpas ao Brasil e a mim. Falou muita bobagem", alegou.
"Se esses caras não quiserem vir, que eles sejam presos lá. E fiquem presos na Argentina. Se não, venham para cá", afirmou o presidente. Na semana passada, o governo Milei repassou às autoridades brasileiras uma lista com os dados de envolvidos no 8 de Janeiro que ingressaram no país vizinho após descumprirem medidas cautelares. Por ser signatária, tal qual o Brasil, de tratados que a obrigam a analisar pedidos de refúgio, eventuais extradições podem passar por uma série de obstáculos.
<b>Inocência de Bolsonaro</b>
Ao ser questionado sobre o suposto envolvimento do ex-presidente Bolsonaro em uma tentativa de um golpe de Estado, Lula afirmou que defende "presunção de inocência" de seu maior rival político. "Mas que ele tentou dar o golpe, tentou. Isso é visível", emendou o presidente.
"O que eu defendo para ele, eu defendo para mim: que ele tenha direito à presunção de inocência, que ele tenha direito de se defender e que ele seja ouvido. É só isso o que eu defendo", declarou Lula. "Não quero que ele seja condenado ou que ele seja inocentado, eu quero que ele seja julgado corretamente."
Sobre o caso das joias supostamente desviadas por Bolsonaro, Lula afirmou que "presidente da República não ganha joia, presidente da República ganha presente", e disse que não deseja o mal a nenhum adversário, mas espera que o veredito "seja em função do crime do tamanho que ele cometeu".
<b>Gastos públicos</b>
Lula afirmou que o governo fará a revisão dos gastos públicos "sem considerar o nervosismo do mercado" e disse haver a necessidade de manter investimentos em Saúde e Educação.
Questionado sobre a possibilidade de cortar despesas e quais seriam as prioritárias, o presidente disse que governo ainda analisa se o corte será mesmo necessário. "O problema não é que tem de cortar. O problema é saber se precisa efetivamente cortar, ou se a gente precisa aumentar a arrecadação. Temos de fazer essa discussão", declarou.
Lula ainda afirmou que não é possível desvincular o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a pessoas idosas e de baixa renda com deficiência, e as pensões da política de valorização do salário mínimo, porque, segundo ele, não considera o benefício um "gasto".
"Se eu acho que vou resolver o problema da economia brasileira apertando o mínimo do mínimo, eu estou desgraçado, cara. Eu não vou para o céu. Eu ficaria no purgatório", afirmou.
O presidente também disse que não quer que empresários tenham prejuízos, mas criticou a "Faria Lima" e defendeu "repartir o pão de cada dia em igualdade de condições".
<b>Banco Central</b>
Ainda nos assuntos da pauta econômica, o presidente afirmou que o diretor de política monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, é "um companheiro altamente preparado", mas que ainda não está pensando em quem vai escolher para ocupar o cargo de presidente do Banco Central, no lugar de Roberto Campos Neto, que terá o mandato encerrado neste ano.
O presidente também voltou a criticar a autonomia do Banco Central, status concedido por uma lei aprovada no Congresso em 2021 e que pode ser ampliado por uma nova proposta sob análise dos parlamentares. "Não preciso de uma lei para dizer que tem autonomia, eu preciso respeitar a função do Banco Central", disse.
"A pergunta que faço é a seguinte: o Banco Central tem necessidade de manter a taxa de juros a 10,5% quando a inflação está a 4%?", indagou o presidente, que criticou Campos Neto na última semana por manter a taxa de juros no nível atual.