Uma palavra é, todos sabem, signo dentro de um código. E código é uma linguagem convencionada, isto é, resulta da criação de determinado número de pessoas, as quais acordam, entre elas, aceitar que algo represente outra coisa diferente dela. Bastam duas pessoas para criar uma linguagem. Por exemplo, se elas combinarem, entre si, que, quando uma tossir duas vezes seguidas, a outra deve redobrar sua atenção em relação ao ambiente onde elas se encontram. O som das tosses de uma, deste modo, não significará para a outra que surgiu na garganta de sua parceira algum tipo de irritação. Mas corresponderá a uma mensagem de alerta do tipo: “Cuidado!”.
É simples, assim, o modo como se cria um código. No caso da linguagem verbal, enquanto um entre os muitos códigos com os quais aprendemos a lidar, no entanto, há um enraizamento dela tão profundo em nossa existência que mal conseguimos admitir não ter ela brotado, naturalmente, em nós, ao longo do nosso desenvolvimento psico-motor. Poucas pessoas devem se lembrar do sentimento de estranheza que, certamente, tiveram quando descobriram que uma sequência de sons, como os que elas estavam acostumadas não só a usar, como a ouvir as pessoas à sua volta também usarem, para designar algo tão familiar como a palavra “casa”, não serve para designar “o local onde se vive”, em outro país, onde a sequência de sons empregado, para o mesmo fim, talvez seja “house” ou “maison”.
Ficamos ainda mais desconcertados quando estudamos um pouco a linguagem verbal e percebemos que uma palavra não é um som que designa uma coisa. É uma “imagem acústica” associada convencionalmente a um “conceito”. Tanto isto é verdade que o aluno da pré-escola não precisa pronunciar em voz alta todos os sons que compõem a palavra “professora” para que ela saiba que ele a está chamando. Se ele disser, simplesmente, “fessora”, ou menos ainda, “sora”, isto já é suficiente para chamar a atenção dela. E com estes pedaços de palavras – que de qualquer forma preservam a “imagem acústica” da palavra “professora” – o aluno chama não só a professora Maria de Lourdes Seabra, como chama também a professora Gisele da Silva, a professora Antonieta Nunes e todas as demais.
Isto porque a imagem acústica não está associada arbitrariamente, a uma professora específica, mas ao conceito de “professora”.
Mais tarde, percebemos que há um acúmulo de imagens quando alguém opera a linguagem verbal. Em primeiro lugar há a imagem acústica embutida na palavra, uma bela e rica criação humana. E, em segundo lugar, há um fato primordial: a linguagem verbal é composta de sons – conjuntos de fonemas que compõem palavras – associados a conceitos que também são imagens. De pessoas, lugares, coisas, sentimentos. Quando alguém diz “menina” imediatamente nos vem à mente a imagem de uma mulher jovem. E quando diz “velha”, a imagem de uma mulher entrada nos anos.
Esta associação permanente entre som e imagem exigida pela linguagem verbal nos torna poetas sem que saibamos, se poeta for a pessoa capaz de se exprimir por meio de imagens.
Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP