Mas, a mesma perda de empatia já havia aparecido em manifestações políticas dela agressivas. E, no modo como ela vinha tratando a lembrança de seus pais. Em 1969, ao assinar contrato com a TV Globo, Regina agradeceu a eles, em entrevistas, pelo ambiente de arte e cultura que lhe haviam dado. Em junho de 1974, ela contou à Revista Sétimo Céu que, em casa, seu pai, Jesus Nunes Duarte – cearense de Santana de Cariri, instrutor de tiro no Exército –, escrevia poemas, inclusive o que ela declamou, em sua escola. Além de peças de teatro e livros, como “Insensatez”. A mãe, Dulce Blois, professora de piano – Regina revelou -, foi quem lhe deu nome, em homenagem à cantora lírica Regina Mendonça. Segundo a atriz, os pais adoravam ouvir músicas clássicas. A eles devia – acrescentou – privilégios que facilitaram seu ingresso na Faculdade de Comunicação, da USP. Os de cursar: Declamação, com a mestra Maria Sylvia Ferraz Silva; Dança, com Mozart Xavier, bailarino do Ballet Vitória Régia; Teatro, com o mitológico diretor russo Eugênio Kusnet, introdutor, no Brasil, do método de interpretação Stanislavski. Tudo – ela informava – pago com os salários de militar de Jesus, acrescidos de lucros que a família obtinha como proprietária de armazém, e, depois, da Granja Duarte, equipada de cinco galpões para frangos.
Regina, se quisesse, ainda poderia ter mencionado outros privilégios herdados. Jesus nasceu num município com beleza ecológica da Chapada do Araripe. E, com importante Museu de Paleontologia. Dulce, por seu lado, veio da linhagem dos Blois, enraizada na Idade Média, com um rei, Étienne de Blois, da Inglaterra, e, inúmeros condes.
Contudo, este apego à memória dos pais desapareceu, depois que Regina atravessou 40 programas da TV Globo, firmando sua imagem de celebridade. Ela, por exemplo, não reagiu à absurda redução da sua história familiar a uma única frase, sobre Jesus, existente no Google: “Foi primeiro-tenente do Exército e morreu, em 1981, em acidente de carro”. Nem ao quase insulto com o qual o site de memória da Globo inicia o perfil dela. Onde se lê que Jesus: “completava o soldo, vendendo sapatos e galinhas, na feira”. Pior ainda, a própria Regina, quando Bolsonaro a escolheu para sua equipe, disse à Revista Época, de 29 de janeiro último que o presidente é “um homem dos anos 1950”. “Como meu pai”. “Alguém que faz brincadeiras homofóbicas. Mas da boca pra fora. Com um jeito masculino que vem, desde Monteiro Lobato. Que chamava brasileiro de preguiçoso. E dizia que lugar de negro é na cozinha”.
Pobre Jesus!
(Ilustração, Regina Duarte, com Jesus e Dulce, no início de carreira)