Os benefícios da prática da leitura são tão evidentes que não surpreende a insistência com que os educadores tentam implantá-la nas escolas, por meio de seus projetos pedagógicos, como uma atividade prazerosa. As complicações surgem, porém, ao se perceber que, muitas vezes, um educando, mesmo completamente convencido destes benefícios, nem por isto começa a ler. Esta situação lembra um pouco aquela, oposta a ela, relacionada aos malefícios trazidos pelos cigarros. Quantos fumantes já não estão convencidíssimos da gravidade da agressão que praticam contra seus corpos, e, ainda assim não conseguem abdicar dos enganosos prazeres oferecidos pelos cigarros? Tanto num caso, como no outro, é evidente, a questão central, portanto, não é a do convencimento (de benefícios ou de malefícios).
Por detrás da ausência da prática de leitura, se escondem situações muito complexas que a área de Educação (e, dentro dela, o campo de Expressão Verbal) não terão condições de enfrentar se ficarem limitados às repetições dos chavões sobre a importância do ato de ler.
Estas situações começam a vir à tona quando nos perguntarmos por que gostamos de ler. Não há dúvida: gostamos de ler porque através da leitura entramos em contato com nossos interesses profundos. Se somos apaixonados por Literatura, saberemos, é claro, extrair grandes satisfações do contato com livros de contos, de poesia etc. Mas também desfrutaremos de prazer semelhante, se gostamos muito de aviação, de futebol ou de cinema, através de publicações que tratem destes temas.
Por conseguinte, uma pessoa só consegue deixar de sentir prazer diante de algum tipo de texto impresso quando não tem interesse profundo pelo assunto nele abordado. E se nenhum tipo de texto impresso oferece prazer a ela, isto significa, simplesmente, que ela não tem interesse profundo por nada. Deste modo, a questão mais relevante colocada pela formação educacional-familiar desta pessoa não é a da ausência da prática de leitura, mas a da falta de interesses profundos – uma questão que desafia quem milita no campo da Expressão Verbal, pelas consequências óbvias que tem no processo de produção textual.
Afinal, basta o impulso de um único interesse profundo para que alguém penetre no universo da palavra impressa, e, uma vez inserido nele, amplie seus interesses, refine-os, refinando a sim mesma e a seus textos.
Uma pessoa desprovida de interesses profundos, provavelmente, viveu a sua infância num ambiente indiferente às suas primeiras manifestações de curiosidade. Talvez, não tenha encontrado estímulo para fixar e aumentar seus interesses, no momento em que começavam a se manifestar como mera curiosidade. O desafio que ela – e os seus educadores – terão de enfrentar é o de como fazer nascer novamente aqueles interesses ou outros semelhantes, quando a fase da infância já foi vivida.